segunda-feira, 4 de abril de 2016


Motivações extremistas desafiam estudiosos
— terroristas não se encaixam num perfil único —



Sede do Centro Nacional de Contraterrorismo dos Estados Unidos, na Virgínia


Os irmãos que recentemente cometeram atentados suicidas em Bruxelas (Bélgica) tinham longos históricos de crimes violentos e eram internacionalmente apontados como terroristas em potencial.
Por outro lado, um dos autores de um ataque no ano passado em San Bernardino (Califórnia, EUA) era um inspetor de saúde que vivia uma vida aparentemente normal num subúrbio de classe média.
Dezenas de jovens foram presos em 2015 no Ocidente por tentarem ajudar a facção terrorista Estado Islâmico (EI). Suas origens são tão diversas que é impossível definir um perfil único.
O que leva as pessoas para a violência política — e como fazer para afastá-las desse caminho — é uma questão que atormenta governos do mundo todo há gerações. No entanto, esse desafio adquiriu nova urgência com a ascensão do EI e a multiplicação dos atentados na Europa e nos Estados Unidos. Apesar dos milhões de dólares gastos em pesquisas, não há sinal de consenso a respeito do que leva alguém a se tornar um terrorista.
“Mesmo depois de tanta verba e de tantas publicações, não estamos mais próximos de responder à nossa pergunta”, escreveu o psicólogo Marc Sageman num artigo publicado em 2014 na revista “Terrorism and Political Violence”. “Os mesmos questionamentos são feitos repetidamente, e ainda não temos respostas convincentes.”
Quando os pesquisadores encontram possíveis soluções, o governo muitas vezes as ignora.
Foi o que aconteceu, por exemplo, pouco tempo depois dos atentados de 11 de Setembro, quando o economista Alan Krueger, da Universidade de Princeton, testou a suposição de que a pobreza era um fator-chave. Krueger analisou indicadores econômicos, pesquisas de opinião e dados sobre militantes suicidas e grupos de ódio, sem encontrar nenhuma ligação entre as dificuldades econômicas e a adesão ao terrorismo.
Mais de uma década depois, no entanto, autoridades e grupos comunitários financiados com verbas públicas continuam encarando os problemas financeiros das pessoas como um indicador da sua radicalização.
Quando em 2011 o presidente Barack Obama anunciou planos para coibir o terrorismo autóctone, os detalhes eram difusos, mas a promessa era clara. A Casa Branca definiria sinais de alerta para ajudar pais e líderes comunitários.
“Caberá às comunidades reconhecer o comportamento anormal”, disse Denis McDonough, então assessor de segurança nacional do governo. Como exemplo, ele citou a evasão escolar, que seria um possível indicador de envolvimento com gangues.
No entanto, nos anos transcorridos desde então, essa lista de possíveis indicadores praticamente não foi aperfeiçoada. Os turvos estudos científicos parecem concluir que praticamente qualquer um pode se tornar um terrorista.
Alguns deles sugerem que os terroristas tendem a ter boa formação e ser extrovertidos; outros dizem que reclusos pouco escolarizados estão sob risco.
Os defensores das liberdades civis consideram perigosas as tentativas governamentais de identificar pessoas em risco. Os pesquisadores também se queixam da preocupação do governo com um “checklist”.
“Eles querem ser capazes de fazer algo imediatamente”, disse Clark McCauley Jr., professor de psicologia. “Qualquer um que lhes oferecer alguma coisa já, como sair por aí com um checklist, receberá atenção.”
“É algo guiado pela demanda”, prosseguiu. “O fato de essas coisas poderem na verdade fazer mal? Isso não os detém.”
A Europa também está às voltas com essas questões. Na Bélgica, foram adotadas medidas para conter a maré de jovens insatisfeitos que viajam para aderir ao EI. No Reino Unido, o governo estimula ou exige que as pessoas alertem as autoridades sobre indivíduos que representem possíveis riscos.
Pesquisar o terrorismo envolve questões difíceis sobre quem pode ser descrito como terrorista, como rebelde ou como soldado. Nelson Mandela? Os homens-bombas palestinos? O Taleban de hoje? Os mujahedin do Afeganistão quando a CIA os apoiava?
Os pesquisadores raramente têm acesso aos terroristas, e os métodos científicos, tais como grupos de controle, são raros.
Em 2005, Jeff Victoroff, psicólogo que leciona na Universidade Sul da Califórnia, concluiu que as principais pesquisas sobre o terrorismo consistiam em teoria política e relatos pontuais.
“A falta de investigação acadêmica sistemática deixou aos formuladores de políticas a tarefa de conceber estratégias de combate ao terrorismo sem o benefício dos fatos”, escreveu no “The Journal of Conflict Resolution”.
Quando os governos dão orientações sobre o que procurar, a origem dessa informação muitas vezes é indetectável. Nos Estados Unidos, um relatório de 2012 do Centro Nacional de Contraterrorismo declarou que a ansiedade, as necessidades pessoais insatisfeitas, a frustração e o trauma ajudam a impulsionar a radicalização. “Nem todos os indivíduos que se tornam radicalizados têm necessidades pessoais não atendidas, mas os que têm se tornam vulneráveis à radicalização”, dizia o documento, sem citar nenhuma fonte.
Segundo McCauley, estudos que sugerem sinais de alerta obtêm mais atenção. Pesquisas que vinculam o terrorismo a políticas, por outro lado, são ignoradas.
No ano passado, a organização noticiosa Intercept revelou um checklist do governo americano destinado a atribuir uma pontuação a indivíduos envolvidos em investigações sobre terrorismo, com base em fatores como o sentimento de ser maltratado pelo governo, a desconfiança em relação às autoridades e relatos de discriminações sofridas.
Mas os cientistas dizem que os checklists estão matematicamente fadados ao fracasso.
No condado de Montgomery (Maryland), um subúrbio de Washington, uma organização inter-religiosa chamada Worde, liderada por muçulmanos, acredita ter uma solução. Ela tem distribuído listas de sinais preocupantes a parentes e líderes religiosos: depressão, trauma, dificuldades econômicas e insatisfações políticas. Qualquer pessoa que observar esses sinais pode ligar para a Worde, que enviará ajuda psicológica ou religiosa.
A polícia só é chamada se houver ameaça de perigo iminente, segundo Hedieh Mirahmadi, presidente da organização.
Não há comprovação da eficácia do programa. Apesar disso, o governo Obama vê a Worde como um modelo e já lhe doou US$ 500 mil (R$ 1,8 milhão).
Mirahmadi disse que sua instituição já aconselhou cerca de 20 pessoas, proporcionando uma ajuda que de outra forma não existiria. É impossível saber, segundo ele, se alguma dessas pessoas teria se tornado violenta.




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