Motivações extremistas desafiam estudiosos
— terroristas não se encaixam num perfil único —
— terroristas não se encaixam num perfil único —
Sede do Centro Nacional de Contraterrorismo dos Estados Unidos, na Virgínia |
Os irmãos que recentemente cometeram atentados suicidas em Bruxelas
(Bélgica) tinham longos históricos de crimes violentos e eram
internacionalmente apontados como terroristas em potencial.
Por outro lado, um dos autores de um ataque no ano passado em San
Bernardino (Califórnia, EUA) era um inspetor de saúde que vivia uma vida
aparentemente normal num subúrbio de classe média.
Dezenas de jovens foram presos em 2015 no Ocidente por tentarem ajudar a
facção terrorista Estado Islâmico (EI). Suas origens são tão diversas
que é impossível definir um perfil único.
O que leva as pessoas para a violência política — e como fazer para
afastá-las desse caminho — é uma questão que atormenta governos do mundo
todo há gerações. No entanto, esse desafio adquiriu nova urgência com a
ascensão do EI e a multiplicação dos atentados na Europa e nos Estados
Unidos. Apesar dos milhões de dólares gastos em pesquisas, não há sinal
de consenso a respeito do que leva alguém a se tornar um terrorista.
“Mesmo depois de tanta verba e de tantas publicações, não estamos mais
próximos de responder à nossa pergunta”, escreveu o psicólogo Marc
Sageman num artigo publicado em 2014 na revista “Terrorism and Political
Violence”. “Os mesmos questionamentos são feitos repetidamente, e ainda
não temos respostas convincentes.”
Quando os pesquisadores encontram possíveis soluções, o governo muitas vezes as ignora.
Foi o que aconteceu, por exemplo, pouco tempo depois dos atentados de 11
de Setembro, quando o economista Alan Krueger, da Universidade de
Princeton, testou a suposição de que a pobreza era um fator-chave.
Krueger analisou indicadores econômicos, pesquisas de opinião e dados
sobre militantes suicidas e grupos de ódio, sem encontrar nenhuma
ligação entre as dificuldades econômicas e a adesão ao terrorismo.
Mais de uma década depois, no entanto, autoridades e grupos comunitários
financiados com verbas públicas continuam encarando os problemas
financeiros das pessoas como um indicador da sua radicalização.
Quando em 2011 o presidente Barack Obama anunciou planos para coibir o
terrorismo autóctone, os detalhes eram difusos, mas a promessa era
clara. A Casa Branca definiria sinais de alerta para ajudar pais e
líderes comunitários.
“Caberá às comunidades reconhecer o comportamento anormal”, disse Denis
McDonough, então assessor de segurança nacional do governo. Como
exemplo, ele citou a evasão escolar, que seria um possível indicador de
envolvimento com gangues.
No entanto, nos anos transcorridos desde então, essa lista de possíveis
indicadores praticamente não foi aperfeiçoada. Os turvos estudos
científicos parecem concluir que praticamente qualquer um pode se tornar
um terrorista.
Alguns deles sugerem que os terroristas tendem a ter boa formação e ser
extrovertidos; outros dizem que reclusos pouco escolarizados estão sob
risco.
Os defensores das liberdades civis consideram perigosas as tentativas
governamentais de identificar pessoas em risco. Os pesquisadores também
se queixam da preocupação do governo com um “checklist”.
“Eles querem ser capazes de fazer algo imediatamente”, disse Clark
McCauley Jr., professor de psicologia. “Qualquer um que lhes oferecer
alguma coisa já, como sair por aí com um checklist, receberá atenção.”
“É algo guiado pela demanda”, prosseguiu. “O fato de essas coisas poderem na verdade fazer mal? Isso não os detém.”
A Europa também está às voltas com essas questões. Na Bélgica, foram
adotadas medidas para conter a maré de jovens insatisfeitos que viajam
para aderir ao EI. No Reino Unido, o governo estimula ou exige que as
pessoas alertem as autoridades sobre indivíduos que representem
possíveis riscos.
Pesquisar o terrorismo envolve questões difíceis sobre quem pode ser
descrito como terrorista, como rebelde ou como soldado. Nelson Mandela?
Os homens-bombas palestinos? O Taleban de hoje? Os mujahedin do
Afeganistão quando a CIA os apoiava?
Os pesquisadores raramente têm acesso aos terroristas, e os métodos científicos, tais como grupos de controle, são raros.
Em 2005, Jeff Victoroff, psicólogo que leciona na Universidade Sul da
Califórnia, concluiu que as principais pesquisas sobre o terrorismo
consistiam em teoria política e relatos pontuais.
“A falta de investigação acadêmica sistemática deixou aos formuladores
de políticas a tarefa de conceber estratégias de combate ao terrorismo
sem o benefício dos fatos”, escreveu no “The Journal of Conflict
Resolution”.
Quando os governos dão orientações sobre o que procurar, a origem dessa
informação muitas vezes é indetectável. Nos Estados Unidos, um relatório
de 2012 do Centro Nacional de Contraterrorismo declarou que a
ansiedade, as necessidades pessoais insatisfeitas, a frustração e o
trauma ajudam a impulsionar a radicalização. “Nem todos os indivíduos
que se tornam radicalizados têm necessidades pessoais não atendidas, mas
os que têm se tornam vulneráveis à radicalização”, dizia o documento,
sem citar nenhuma fonte.
Segundo McCauley, estudos que sugerem sinais de alerta obtêm mais
atenção. Pesquisas que vinculam o terrorismo a políticas, por outro
lado, são ignoradas.
No ano passado, a organização noticiosa Intercept revelou um checklist
do governo americano destinado a atribuir uma pontuação a indivíduos
envolvidos em investigações sobre terrorismo, com base em fatores como o
sentimento de ser maltratado pelo governo, a desconfiança em relação às
autoridades e relatos de discriminações sofridas.
Mas os cientistas dizem que os checklists estão matematicamente fadados ao fracasso.
No condado de Montgomery (Maryland), um subúrbio de Washington, uma
organização inter-religiosa chamada Worde, liderada por muçulmanos,
acredita ter uma solução. Ela tem distribuído listas de sinais
preocupantes a parentes e líderes religiosos: depressão, trauma,
dificuldades econômicas e insatisfações políticas. Qualquer pessoa que
observar esses sinais pode ligar para a Worde, que enviará ajuda
psicológica ou religiosa.
A polícia só é chamada se houver ameaça de perigo iminente, segundo Hedieh Mirahmadi, presidente da organização.
Não há comprovação da eficácia do programa. Apesar disso, o governo
Obama vê a Worde como um modelo e já lhe doou US$ 500 mil (R$ 1,8
milhão).
Mirahmadi disse que sua instituição já aconselhou cerca de 20 pessoas,
proporcionando uma ajuda que de outra forma não existiria. É impossível
saber, segundo ele, se alguma dessas pessoas teria se tornado violenta.
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