Solteiras aos 27 anos, o drama das "mulheres que sobraram" na China
Vídeo trata do estigma sofrido por chinesas solteiras, com depoimentos das jovens e de seus pais |
"Sempre achei que ela tinha uma ótima personalidade. Mas ela não é muito
bonita, fica na média. É por isso que ela é uma 'mulher que sobrou'",
diz uma mãe sobre a filha solteira.
A cena faz parte de uma propaganda que está viralizando na China por
tratar do estigma das mulheres que passaram dos 35 anos e ainda não se
casaram.
O anúncio está provocando um acalorado debate por tratar das chamadas
"sheng nu", algo como "mulheres que sobraram", um problema latente em
uma sociedade em que as mulheres devem priorizar o casamento e a
maternidade.
Com quatro minutos e feita no estilo documentário, a campanha "Marriage
Market Takeover" (algo como "invadindo o mercado de casamentos") foi
feito pela marca de produtos de beleza SK-II.
Em um comunicado, o presidente da empresa, Markus Strobel, disse que o
vídeo faz parte de uma "campanha global para inspirar e empoderar as
mulheres a moldar seu próprio destino".
"Nós mostramos um problema da vida real de mulheres chinesas talentosas e
corajosas que são pressionadas para casar antes dos 27 anos, por medo
de serem rotuladas como 'sheng nu'."
PRESSÃO — Pela definição do governo, uma "mulher que sobrou" se refere a qualquer mulher acima de 27 anos solteira.
O Partido Comunista Chinês tenta pressionar essas mulheres para casarem,
para lidar com um grave desequilíbrio de gênero causado pela política
do filho único, que foi revogada recentemente.
Mas de acordo com Leta Hong Fincher, autora do livro "Leftover Women:
The Resurgence of Gender Inequality in China" ("As mulheres que
sobraram, o ressurgimento da desigualdade de gênero na China", em
tradução livre), as chinesas não casadas estão em um "verdadeiro momento
de mudança", já que muitas estão começando a abraçar um estilo de vida
de solteira e lutando contra o estigma.
"Essas jovens estão sendo alvo de uma campanha deliberada do governo
para pressioná-las a casar", disse Leta. "Mas as mulheres chinesas hoje
estão cada vez se educando cada vez mais e resistindo ao casamento.
Essas mulheres solteiras estão tendo vidas ótimas. Mas essa tortura
psicológica vivenciada por essas mulheres para se casarem é algo
extremamente real. E reflete a realidade de muitas jovens profissionais
na China."
PAIS E FILHAS — O vídeo intercala testemunhos emocionantes das mulheres com a opinião de seus pais.
"Na cultura chinesa, respeitar os pais é o mais importante. E não se
casar é visto como o maior sinal de desrespeito", diz uma delas, sem
conseguir segurar o choro. "As pessoas acham que uma mulher solteira é
incompleta", afirma outra.
O vídeo foi intensamente compartilhado no Facebook mundo afora. E, na
China, recebeu mais de 4 mil curtidas e foi compartilhado mais de 20 mil
vezes na rede social Weibo. "Eu sou solteira e precisava ver esse vídeo
para saber que não estou sozinha e não tomei as decisões erradas. É
possível ser feliz sem um homem. Não deveríamos ser punidas por nossas
escolhas, já que não estamos prejudicando ninguém", comentou uma
usuária.
No vídeo, mulher ouve mãe dizendo que ela não se casou por não ser muito bonita |
OS HOMENS PRECISAM SE ESFORÇAR MAIS — A propaganda termina com as
mulheres e seus pais visitando o chamado mercado do casamento, que são
lugares em que pais colocam cartazes com os pontos positivos de seus
filhos, na expectativa de encontrar um parceiro para eles.
Mas, na propaganda, os cartazes das mulheres em questão são acompanhados
com frases delas a seus pais. "Eu não quero me casar só pelo fato de
estar casada. Eu não serei feliz dessa maneira", diz um dos pôsteres.
"Eu me oponho ao termo 'mulher que sobrou'", diz outro cartaz com a foto
de uma das mulheres, cuja mãe reage: "Os homens que sobraram precisam
se esforçar mais."
Será mesmo que a sociedade chinesa vai passar a aceitar a escolha dessas
mulheres? "No momento, essa expectativa é uma mera fantasia."
"Casamento na China ainda é algo extremamente patriarcal. Mas acredito
que essa tendência de mulheres optando por serem solteiras e
independentes vai crescer — o que estamos vendo é só o começo."
Nenhum comentário:
Postar um comentário