quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Brasil tem sua pior posição em ranking mundial de competitividade — o país ficou em 81º lugar entre 138 avaliados na pesquisa do Fórum Econômico Mundial



A crise política minou a confiança na economia brasileira e levou o País ao “fundo do poço” no tema competitividade. O levantamento anual feito pelo Fórum Econômico Mundial, em parceria com a Fundação Dom Cabral (FDC), divulgado na terça-feira (27.set.2016) à noite, mostra o Brasil na 81ª posição em 2016, em um ranking de 138 nações. Em relação ao ano passado, o País perdeu seis posições. Desde sua melhor classificação na lista foram nada menos do que 33 posições perdidas — o Brasil caiu da 48ª posição no ranking global, em 2012 — entre 144 países —, para a 81ª agora — mas apenas entre 138 países. Ou seja, está abaixo da metade da tabela.
O relatório 2016/17 do Fórum Econômico Mundial sobre a competitividade global acaba sendo um retrato acabado do fracasso da gestão da então presidente Dilma Rousseff desde o fim de seu primeiro período (2011/2015).
Foi o pior resultado desde 2007, quando o Fórum mudou a metodologia do levantamento, informa o relatório.
A queda brasileira foi tão impactante que o país deixou de figurar no "top 10" de competitividade entre os países da América Latina e do Caribe. Fica atrás não só de um clássico entre os países da região, em termos de desempenho, como é o caso do Chile, mas também de um país tremendamente pobre, a Guatemala.
O retrocesso do Brasil foi contínuo nos anos Dilma: 48º lugar em 2012/2013; 56º em 13/14; 57º no período seguinte; 75º em 2015/2016, para desabar seis posições e terminar em 81º em 2016/17.

RECESSÃO — Segundo Carlos Arruda, professor da FDC e coordenador da pesquisa no Brasil, trata-se de um resultado que mostra o “fundo do poço” em relação às perspectivas sobre a economia nacional. Desde que o levantamento começou a usar a metodologia atual, há 20 anos, a posição do País não era tão ruim. Ele ressalva, no entanto, que o estudo referente a 2016 foi encerrado em maio último — no dia 12 daquele mês, o atual presidente, Michel Temer, assumiu o cargo temporariamente após o afastamento de Dilma Rousseff.
Como era previsível, foi nos itens relacionados ao desempenho macroeconômico que o país recebeu as piores avaliações: em "ambiente macroeconômico", ocupa a 126ª colocação entre os 138 países pesquisados. Pior ainda é a posição em "eficiência do mercado de bens" — 128º lugar.
O relatório lembra, a propósito, a "profunda recessão" que o Brasil está enfrentando e que a taxa de crescimento declinou firmemente, de uma média anual de 4,5% entre 2006 e 2010, ainda no período Lula, para 2,1% entre 2011 e 2014, de acordo com o Banco Mundial.
A queda brasileira, diz o relatório, "é provocada principalmente pela deterioração dos mercados de bens, de trabalho (leia-se: desemprego) e financeiro". Acrescenta: "No plano institucional, a segurança se deteriorou e também a percepção da qualidade da administração do setor público".
O documento traz para o topo dos "fatores mais problemáticos para fazer negócios" um clássico nesse tipo de consulta: impostos e a regulação deles. Para 15,9% dos pesquisados, impostos é o maior problema, ao passo que 12,5% apontam a regulação das taxas.

CORRUPÇÃO — Os resultados mostram que algumas avaliações sobre o País não mudaram tanto nos últimos anos, tanto do lado positivo (o porte do mercado) quanto do negativo (complexa estrutura tributária, infraestrutura deficiente e altos encargos trabalhistas). No entanto, a falta de confiança nos políticos e nas instituições acabou puxando os indicadores para baixo e comprometendo a posição brasileira como um todo. No quesito confiança nos políticos, diz Arruda, o Brasil está na última posição da lista entre todas as nações avaliadas (138º lugar).
Mas a corrupção ocupa lugar igualmente privilegiado entre os fatores que entravam os negócios, mencionada por 13,6% dos pesquisados. Resultado perfeitamente previsível em tempos de Lava Jato e prisões em sequência de empresários de grosso calibre.
O relatório elogia o combate à corrupção, um endosso à Lava Jato, sem mencionar nominalmente a operação.

BRICS — Na comparação com todos os Brics, o Brasil também ficou atrás. A China aparece na 28ª posição (a mesma do ano passado), enquanto a Índia aparece no 39º lugar (subindo 16 degraus em apenas um ano). Tanto Rússia quanto África do Sul ganharam duas posições em relação a 2015, e agora ocupam os lugares 43º e 45º da lista, respectivamente.

REFORMAS — Segundo Arruda, a boa notícia é que a agenda de reformas que o Brasil tem pela frente — mudanças na Previdência, controle nos gastos públicos, reforma da legislação trabalhista e nas concessões de infraestrutura — podem ajudar bastante na apuração dos resultados do próximo ano. Ele afirma que o resultado obtido pela Índia em 2016 reflete em muito as mudanças de regras concretizadas nos últimos anos. 
A disposição em corrigir gargalos de produtividade, de acordo com o professor, tem funcionado também em mercados latino-americanos como México e Colômbia. “A Colômbia tem feito reformas de longo prazo, com parcerias entre o setor público e o privado, e tem crescido de forma lenta, mas constante, na lista”, diz Arruda. 
Já o atual governo do México, explica ele, tem optado por fazer reformas de forma mais abrupta, sem medo de perder a popularidade. Em 2016, o México ficou em 51º lugar no ranking de competitividade, enquanto a Colômbia ficou na 61ª colocação.

Outro fator que deve ajudar o Brasil no ranking do ano que vem é o fato que a economia está, de certa forma, andando na direção contrária do que ocorre no resto do mundo. Enquanto o mundo fica mais protecionista — como evidenciado pela saída do Reino Unido da União Europeia –, Arruda pondera que a economia brasileira vem se abrindo ao comércio exterior. 
O estudo tem uma base liberal e desenvolvimentista, explica o professor da FDC, mas também contempla alguns avanços em indicadores sociais, especialmente nos setores de saúde e educação.

NO GLOBAL — Nas primeiras dez posições do ranking, houve algumas mudanças de posição, mas a lista de líderes em competitividade manteve-se a mesma. A Suíça ocupa o primeiro lugar em competitividade, pelo oitavo ano consecutivo. Em 2016, na ordem, destacaram-se: Suíça, Cingapura, Estados Unidos, Holanda, Alemanha, Suécia, Reino Unido, Japão, Hong Kong e Finlândia, completando o "top 10".




segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Confirmado: Eike Batista pagou “pedágio” para organização criminosa em operação na Petrobras
Em julho de 2013, o executivo Ivo Dworschak, da OSX, empresa naval de Eike Batista, alertou o ainda bilionário: operadores do petista José Dirceu estavam cobrando até impostos da propina que lhes era devida por contratos na Petrobras. As empresas de Eike, como a OSX, derretiam. Ele fizera e redobrara apostas tresloucadas em poços que não davam petróleo. A fatura finalmente chegara; com ela, a pressão dos operadores do PT. A OSX, em parceria com a Mendes Júnior, obtivera, em 2012, um contrato de US$ 922 milhões com a Petrobras, para construir as plataformas P-67 e P-70 — duas das preciosidades da exploração no pré-sal. Contratos na Petrobras, ainda mais dessa ordem, não vinham de graça. Naquele momento, vinham atreladas a “pedágios”.

Eike não poderia deixar que a OSX parasse de receber da Petrobras, o único contrato que realmente pagava as contas. Mandou, segundo o executivo Ivo, bancar a fatura dos operadores de Dirceu. “O Eike falou que isso faz parte das negociações, para eu ficar tranquilo e só dar seguimento aos pagamentos”, disse Ivo recentemente aos procuradores da força-tarefa da Lava Jato. O executivo participou de reuniões em que os operadores de Dirceu, da espanhola Isolux, estrilavam diante do calote na propina.

“Eu vi fisicamente na minha frente um bando de argentinos ou uruguaios lá, cobrando que a gente cumprisse o acordo senão eles iriam denunciar lá, fazer as ações nas origens, a ameaça seria tipo ‘Vou falar com José Dirceu que vocês não estão cumprindo e isso vai dificultar a vida de vocês’”, narrou Ivo à Lava Jato. Ele procurou Eike novamente. “Faz parte, fica tranquilo e honra o que foi feito, com impostos e tudo”, orientou Eike, segundo o depoimento de Ivo.

E assim foi feito. Ao longo de 2013, de acordo com planilhas de pagamentos e extratos bancários, empresas associadas a Dirceu, sem prestar serviço algum, receberam, ao menos, R$ 12 milhões. Dirceu já havia sido condenado pelo Supremo Tribunal Federal no mensalão — mas o julgamento do mensalão, como a Lava Jato veio a comprovar, em nada mudara a regra do jogo em Brasília e no Rio de Janeiro. O dinheiro da propina do pré-sal saiu da OSX e da Mendes Júnior. Após ser lavado, chegou às contas de operadores do petista, como Júlio César Oliveira Silva, o Julinho — um dos mais eficientes lobistas da turma de Dirceu, conhecido no submundo da venda de armas pesadas a governos e preso pela Lava Jato na semana passada. De lá, a propina era sacada em espécie ou seguia para contas de laranjas. A Lava Jato ainda rastreia o destinatário final da dinheirama. Já há provas documentais, no entanto, de que outros dois lobistas da Petrobras pagaram propina a Dirceu e ao PT por meio dos mesmos laranjas. Dirceu, que está preso em Curitiba desde agosto de 2015, já foi condenado a 23 anos de prisão.

As fraudes e propinas envolvidas no contrato bilionário de Eike e da Mendes Júnior com a Petrobras resultaram na 34ª fase da Lava Jato, deflagrada na manhã de quinta-feira, dia 22.set.2016. Foi batizada pelos investigadores de Arquivo X, uma alusão a Eike Batista.

Após dois anos e meio de investigações, não restam dúvidas de que havia uma sofisticada organização criminosa em operação na Petrobras — e não apenas nela. O montanhoso corpo de provas que emerge da maior investigação já feita no Brasil revela, em minúcias, como funcionava a corrupção promovida pelo grupo que assaltava a estatal. Havia, como nas grandes organizações criminosas, uma clara divisão de tarefas. Cabia ao cartel de grandes empresas — como Mendes Júnior e OSX — pagar propinas aos funcionários da Petrobras e aos políticos que mandavam nesses funcionários. Cabia a esses funcionários e aos chefes deles, os políticos, entregar os contratos da estatal às empresas do cartel, por mais danosos que fossem aos cofres da Petrobras. Durante ao menos uma década, a organização criminosa prosperou formidavelmente. Empreiteiros enriqueceram. Burocratas enriqueceram. Lobistas enriqueceram. Políticos enriqueceram — e foram eleitos e reeleitos com dinheiro sujo. Até que, enfim, a estatal quebrou. 

No topo dessa sofisticada organização criminosa estava, segundo a força-tarefa, Luiz Inácio Lula da Silva. De acordo com eles, o esquema, do qual Lula se beneficiou política e materialmente, não poderia acontecer sem que ele tivesse dado as ordens, direta e indiretamente. Na semana passada, o juiz Sergio Moro acolheu a denúncia dos procuradores contra o ex-presidente. Moro entendeu que há provas suficientes de autoria e materialidade no caso em que Lula é acusado de receber propina da empreiteira OAS, lavada como um tríplex em Guarujá. Assim, o ex-presidente se tornou réu por corrupção passiva e lavagem de dinheiro — e as investigações prosseguirão intensamente. Ele é investigado em outras cinco frentes; numa delas, em Brasília, também já virou réu, acusado de tentar obstruir a Lava Jato.




domingo, 25 de setembro de 2016

Área técnica do Tribunal de Contas da União diverge de
auditora que isentou Conselho de Administração
no caso de Pasadena — propõe bloquear bens de Dilma e
ex-integrantes do Conselho



Refinaria de Pasadena, no Texas (EUA)


Relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) pede que ex-integrantes do Conselho de Administração da Petrobrás, entre eles a ex-presidente Dilma Rousseff, sejam responsabilizados e tenham os bens bloqueados por perdas na compra da Refinaria de Pasadena, no Texas (EUA). É a primeira vez que o setor de auditoria da corte propõe tornar indisponível o patrimônio dos ex-conselheiros por prejuízos no negócio, investigado na Operação Lava Jato. 
A área técnica do tribunal analisa a culpa de Dilma e de outros ex-membros do colegiado também nas maiores obras da estatal.
O parecer foi concluído no dia 19.set.2016 e é subscrito pelo chefe da Secretaria de Controle Externo da Administração Indireta do TCU no Rio de Janeiro (Secex Estatais), Luiz Sérgio Madeiro da Costa. Ele divergiu de auditora que avaliou a transação e, dias antes, havia reiterado entendimento do tribunal de isentar o conselho, aplicando sanções apenas a ex-dirigentes que tinham funções executivas. Desde 2014, ex-diretores da companhia têm os bens bloqueados.
Dilma era ministra da Casa Civil do governo Lula e presidente do Conselho de Administração em 2006, quando foi aprovada a aquisição dos primeiros 50% da refinaria. O secretário pede que os ex-conselheiros sejam considerados responsáveis solidários por perdas de ao menos US$ 266 milhões (R$ 858,3 milhões). O bloqueio, inicialmente por um ano, visa a cobrir eventual ressarcimento à estatal.
Além de Dilma, estão na lista o ex-ministro Antonio Palocci (Fazenda e Casa Civil), os empresários Cláudio Haddad e Fábio Barbosa, o general Gleuber Vieira e o ex-presidente da companhia José Sergio Gabrielli — como integrava também a Diretoria Executiva, este último já está com os bens bloqueados. O grupo participou da reunião que aprovou a compra em 2006.
A estatal pagou, inicialmente, US$ 359 milhões ao grupo belga Astra Oil, que, no ano anterior, havia desembolsado US$ 42 milhões por 100% dos ativos. Em março de 2014, se  revelou que a então presidente da República votou a favor do negócio. Ela disse que só deu seu aval porque se baseou em “resumo tecnicamente falho” que omitia cláusulas das quais, se tivesse conhecimento, não aprovaria.
Após um desacordo, a Astra acionou uma dessas cláusulas, que lhe assegurava o direito de vender sua fatia em Pasadena à estatal. Em 2012, a Petrobrás pagou US$ 820 milhões pelos 50% remanescentes à empresa belga. Em 2014, ao bloquear bens de ex-diretores, o TCU concluiu que a perda total pela compra foi de US$ 792 milhões (R$ 2,5 bilhões).



Refinaria de Pasadena, no Texas (EUA)


Em relatório anexado a um desses processos, que traz a análise sobre a maior parte das perdas (US$ 580 milhões ou R$ 1,8 bilhão), a auditora da Secex Estatais Maria Lúcia Samico defendeu responsabilizar não só os ex-diretores já implicados em 2014, mas outros cinco ex-funcionários da Petrobrás que negociaram com a Astra. No entanto, reiterou que o conselho não tem culpa pelos prejuízos, pois não detinha as informações necessárias para antever que o negócio seria nocivo. O parecer não discute as delações premiadas da Lava Jato, entre elas a do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró, informando que Dilma conhecia em detalhes a compra.

‘Dever de diligência’ — O chefe da secretaria contestou as conclusões. Para ele, Dilma e os demais ex-integrantes do conselho descumpriram normativos da Petrobrás e a Lei das Sociedades por Ações ao não “acompanhar a gestão da Diretoria Executiva” por meio da “análise devida das bases do negócio” e ao não solicitar “esclarecimentos mais detalhados sobre a operação”, antes de autorizá-la. Com isso, argumenta ele, violaram o “dever de diligência” para com a companhia.
Os pareceres foram enviados ao relator dos processos, ministro Vital do Rêgo, e ao procurador-geral do MP de Contas, Paulo Bugarin, que vão apresentar suas considerações. Depois, o caso será pautado para julgamento. Não há previsão.




Defesa — A ex-presidente Dilma Rousseff informou, em nota, que o assunto Pasadena “é antigo e já foi arquivado em 2014 pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, por considerar que nem ela nem os demais ex-conselheiros de Administração da Petrobrás tiveram responsabilidade pelos eventuais prejuízos”.
“De acordo com o procurador-geral, as informações prestadas por Dilma Rousseff, ainda em 2014, 'afastam a acusação de conduta dolosa ou culposa que possa ser atribuída ao conselho de ter dado causa aos prejuízos advindos da referida operação'”, diz o comunicado.
A ex-presidente ressalta, no texto, que o próprio TCU a “excluiu” do processo em 2014, justamente por considerar que o Conselho de Administração “não havia sido devidamente informado de todas as cláusulas no processo de aquisição de Pasadena”.
“Sobre o relatório técnico a ser apresentado ao pleno do TCU — encaminhado seletivamente e de maneira inusual à reportagem —, Dilma Rousseff reafirma que estranha a posição da auditoria, contrária à do procurador-geral da República”, diz trecho do comunicado.
Dilma explicou a Janot as circunstâncias da parceria entre a Petrobrás e a Astra Oil. O negócio foi submetido ao Conselho de Administração em 3 de fevereiro de 2006 por meio de resumo executivo e de apresentação do então diretor Internacional Nestor Cerveró. Na nota, ela reitera que Cerveró não fez referência a “duas importantes cláusulas”. “Como se tornou evidente, o Conselho de Administração não teve conhecimento sobre as referidas cláusulas.”
A nota diz ainda que o Conselho de Administração não autorizou a “aquisição voluntária”  dos 50% restantes das ações de Pasadena, em 2008. “Diante desses esclarecimentos, o procurador-geral determinou o arquivamento do caso, reconhecendo que o conselho 'não foi adequadamente informado acerca do conteúdo do contrato'”, destacou.

O ex-ministro Antônio Palocci informou, por meio de sua assessoria, que ele e seus advogados não têm conhecimento da “nota técnica” e que não foi notificado “a respeito de qualquer procedimento” do tribunal. “Portanto, não irá se manifestar sobre o assunto”, justificaram os auxiliares do ex-ministro.

A reportagem entrou em contato com a secretária de Cláudio Haddad por telefone e e-mail. Ela explicou que ele só poderia se pronunciar a partir de segunda-feira (26.set.2016).

Fábio Barbosa não quis se manifestar.

Gleuber Vieira disse que desconhece o parecer do tribunal e que não poderia comentá-lo em detalhes. Ele ponderou, contudo, que o Conselho de Administração apenas aprovou a compra, sem observar maiores detalhes, levando em conta parecer jurídico e os objetivos estratégicos da Petrobrás naquele momento.

O advogado de José Sérgio Gabrielli, Antônio Perilo, disse que um dos pareceres recentemente apresentados pelos técnicos do TCU acolhe argumentos de seu cliente. Em nota, ele alegou que a auditoria admite que a carta de intenções do negócio não foi autorizada por Gabrielli e que ela “não acarretou nenhum prejuízo”.
“O tribunal reconhece que foram equivocadas certas metodologias de aferição de dano ao erário que vinham sendo utilizadas. Esse é um primeiro passo para abordar a questão como ela deveria ter sido feita desde o início: como a análise da medida em que certas estratégias comerciais e negociais eram compatíveis com os interesses da empresa”, comentou.
O defensor afirma que o TCU repete, na aquisição de Pasadena, a mesma metodologia que usa na análise do superfaturamento de contratos público. “Essa metodologia é útil para saber se um contrato praticou preços acima do mercado, na aquisição de bens e serviços que são disponíveis e poderiam ser adquiridos pelo preço médio. Contudo, é inaplicável para situações comerciais como a de Pasadena, em que o lucro ou prejuízo não podia ser calculado dessa forma”, criticou, acrescentando que a defesa trabalha numa nova manifestação para enfrentar “todos os argumentos trazidos aos autos” pela área técnica.

A ex-presidente da Petrobrás Maria das Graças Foster não comentou.




sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Fisco lista sonegadores com contas nos Estados Unidos






A Receita Federal recebeu informações do Fisco americano com a relação dos brasileiros com contas nos Estados Unidos. Depois do cruzamento de dados que considerou o grupo das 915 pessoas físicas com maior rendimento obtido em 2014, foi constatado que dois terços (638) delas sonegaram informações ao Fisco do Brasil.
A troca de informações faz parte de acordo entre os dois países que visa a impedir a movimentação de recursos ilegais no exterior. Esse é o primeiro resultado prático do programa de troca de informações previsto na Lei Fatca (Foreign Account Tax Compliance, na sigla em inglês) sobre as obrigações fiscais de conta estrangeira americana, que obriga as instituições financeiras a prestar informações sobre as contas dos seus clientes.
Faltando pouco mais de um mês para o fim do prazo de adesão ao programa de repatriação de recursos mantidos no exterior, os fiscais intensificaram também a análise de dados de contribuintes com ativos nas Ilhas Cayman, Ilhas Virgens e Bahamas, três notórios paraísos fiscais. Os brasileiros que omitiram dados na relação enviada pelos Estados Unidos integram agora uma lista de contribuintes que estão sendo monitorados de perto pela Receita até o prazo final de adesão ao programa de repatriação de recursos no exterior não declarados ao Fisco.
As autuações aos sonegadores, porém, só começarão a ser feitas depois de 31 de outubro, último dia do programa. Quem não fizer a regularização do dinheiro ficará sujeito a autuação pela fiscalização da Receita segundo o subsecretário de Fiscalização, Iágaro Jung Martins.
“A Receita vai verificar se esses contribuintes, todos pessoas físicas, optaram pela regularização. Em caso negativo, planeja-se o início dos procedimentos de fiscalização”, disse Martins, que divulgou detalhes do primeiro resultado do acordo de cooperação com os Estados Unidos.
Em setembro de 2015, o Brasil recebeu os primeiros dados. O trabalho de processamento desses dados foi agora concluído pelos fiscais brasileiros. Foram informados rendimentos que superam R$ 1 bilhão em 2014. “Como as taxas de juros nos Estados Unidos são muito baixas, para obter um rendimento nesse valor é preciso um patrimônio de mais de R$ 100 bilhões”, disse o subsecretário.

Lava Jato Outra frente de fiscalização refere-se a grandes escritórios de advocacia que trabalham para pessoas e empresas envolvidas na Lava Jato. Segundo o subsecretário, foi detectado que advogados receberam honorários enviados por seus clientes ilegalmente no exterior.

O programa de repatriação, que dá anistia penal aos contribuintes, tem sido alvo de propostas de flexibilização por parlamentares. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, confirmou que o projeto de lei da Repatriação deve sofrer alterações, segundo ele para aumentar a base de arrecadação.
Para Iágaro Martins, alterar ou anunciar mudanças nas regras do programa podem reduzir o interesse em se aderir ao programa. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o secretário da Receita, Jorge Rachid, já declararam que não há necessidade de mudanças. Uma fonte da equipe econômica informou que o governo trabalha com estimativa de arrecadação de R$ 25 bilhões com o projeto e prevê o maior índice de adesão nas duas últimas semanas do prazo. O dinheiro arrecadado será compartilhado com os Estados.

Receita O quarto relatório bimestral de avaliação de receitas e despesas do Orçamento de 2016 prevê uma receita total de aproximadamente R$ 6,2 bilhões com a arrecadação do Programa de Repatriação. Desse total cerca de R$ 5 bilhões estão previstos para a União e cerca de R$ 1,2 bilhão para Estados e municípios.
Esse valor é conservador e se trata de recursos declarados por contribuintes, mas que ainda não foram efetivamente pagos. Por já ter havido a declaração, é pouco provável que ocorram mudanças nesse valor e por isso o governo decidiu incluir essa previsão para evitar um contingenciamento de despesas no Orçamento deste ano. 
Com essa previsão de entrada da repatriação, as estimativas de receitas devem subir para cerca de R$ 1,5 bilhão. Por outro lado, as previsões de despesas devem crescer cerca de R$ 500 milhões. A diferença de aproximados R$ 1 bilhão será incorporada numa reserva, para administrar riscos.
O relatório bimestral faz parte do rol de instrumentos fiscais brasileiros de acompanhamento do cumprimento da meta de superávit primário do governo federal, prevista para este em um déficit de R$ 170,5 bilhões.
A repatriação é a aposta do governo para melhorar o desempenho das receitas até o fim do ano. A expectativa do governo é de uma arrecadação superior a essa estimada no relatório, mas a equipe econômica preferiu fazer uma estimativa conservadora.




Decreto do governo determina que o benefício do Bolsa Família seja mantido por dois anos
para as pessoas que conseguirem emprego formal






O ministro do Desenvolvimento Social e Agrário, Osmar Terra, disse na sexta-feira, 23.set.2016, que o governo vai publicar até o mês que vem o decreto que modifica as regras do Bolsa Família. A principal mudança será a manutenção do benefício por dois anos para as pessoas que conseguirem emprego formal.
Segundo Terra, o beneficiário continuará recebendo a assistência do programa, junto com o salário. Após esse período, seu cartão ficará "hibernando" para que, no caso de perda do emprego, ele volte a receber o benefício.
O objetivo do Planalto é induzir um salto na formalização do emprego, já que, para não perder o benefício, parte dos beneficiados pelo Bolsa Família se recusa a ter a carteira de trabalho assinada. Com a transferência de beneficiários ao mercado de trabalho formal, o governo aposta que, no médio prazo, conseguirá reduzir o número de famílias assistidas pelo programa, embora não tenha traçado uma meta para isso. Terra, porém, pondera que essa diminuição dependerá da capacidade da economia de gerar mais empregos.
O ministro disse ainda que o governo pretende premiar, com transferência de recursos a programas sociais, as prefeituras que conseguirem emancipar mais famílias do programa. O valor do prêmio vai depender do tamanho do município e da proporção de pessoas que passarem a não depender mais do Bolsa Família.
"O Bolsa Família não vai sofrer nenhuma mudança em sua essência. O que procuramos é fazer algumas alterações que permitam o processo em direção à autonomia das famílias. É mais no sentido de ensinar a pescar e não só ficar dando o peixe", afirmou Terra, após participar de debate promovido pelo Insper na capital paulista.

Doações eleitorais de beneficiários do Bolsa Família indicam fraude
Tudo indica que as doações de cerca de 16 mil beneficiários do Bolsa Família para candidatos às eleições municipais configuram fraude e crime eleitoral. Na quinta-feira, 22.set.2016, o Tribunal de Contas da União (TCU) informou de que cadastrados no programa doaram aproximadamente R$ 16 milhões para campanhas de prefeitos e vereadores em todo o País até a segunda-feira, 19.set.2016. O montante total também leva em consideração as doações estimadas, quando são feitas em forma de prestação de serviço ou doação de materiais.
Segundo o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, o candidato só será responsabilizado se ficar comprovado que ele estimulou a doação. Também será preciso verificar se o beneficiário do Bolsa Família tinha conhecimento das doações. O TSE considera que alguns candidatos podem ter utilizado dados sem autorização para validar doações oriundas de caixa 2. "Ou essa pessoa não deveria estar recebendo o Bolsa Família ou ocorre o fenômeno que chamamos de 'caça CPF', que é a ideia de se manipular o CPF de alguém que está inocente nesta relação. Mas isso deixa uma nuvem não muito transparente sobre esse modelo de doação que estamos desenvolvendo", afirmou. Todos os dados já foram repassados para o Ministério Público Eleitoral e juízes eleitorais.
No valor total de R$ 15.970.436,40 que foram doados por beneficiários do Bolsa Família até agora, foram consideradas doações em dinheiro e também doações estimadas, que podem ser feitas por meio de prestação de serviços para a campanha ou doação de materiais. O valor mais alto de doação de um beneficiário do programa foi de R$ 67 mil.
Como as investigações ainda estão em andamento, o TSE informou apenas os cinco primeiros partidos e optou por não divulgar a lista dos doadores. A instituição considera que alguns candidatos podem ter utilizado o CPF de pessoas sem autorização para disfarçar transferências de caixa dois.
Confira a lista dos cinco partidos que mais receberam doações de beneficiários do Bolsa Família, somando as doações financeiras e as doações estimadas:
  • PTB - R$ 1.767.262,33
  • PMDB - R$ 1.517.122,36
  • PSD - R$ 1.109.949,30
  • PSDB - R$ 1.008.855,00
  • PT - R$ 914.233,14




Brasil fecha 34 mil vagas de trabalho com carteira assinada em agosto



País tinha 11,44 milhões de pessoas procurando emprego sem encontrar


Pelo 17º mês consecutivo, o mercado de trabalho brasileiro demitiu mais do que contratou. Em agosto, o país fechou 34 mil postos de trabalho com carteira assinada, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) divulgados na sexta-feira (23.set.2016) pelo Ministério do Trabalho.
Apesar de o resultado ter sido negativo, houve melhora em relação ao volume de demissões ocorridas em agosto de 2015, quando foram encerradas 86,5 mil vagas. O Ministério do Trabalho avaliou que a perda de empregos "foi significativamente menor" que no mesmo período do ano passado.
No acumulado do ano, no entanto, o resultado continua batendo recorde negativo. De janeiro a agosto, foram fechadas 651,3 mil vagas. É o pior resultado da série histórica do governo, que tem início em 2002.
No ano passado, esse saldo estava negativo em 572,8 mil nos oito primeiros meses. Nos outros anos, o resultado acumulado era positivo — ou seja, as contratações superavam as demissões.
Em 12 meses, o país acumula uma perda de 1,7 milhão de vagas de trabalho.


SETORES — O fechamento de vagas em agosto não foi maior devido às contratações na indústria de transformação. O setor gerou 6,3 mil postos de trabalho no mês passado. Esse resultado foi puxado principalmente pela área de alimentação e bebidas, que fez 8,68 mil novas contratações e pela indústria de calçados e têxtil, que abriram, cada uma, mais de 2.000 postos de emprego formal. Por outro lado, a maior redução foi na indústria de borracha, fumo e couros, que fechou 3,8 mil vagas.
Os outros setores que criaram vagas no mês passado foram a indústria extrativa mineral (366) e o comércio (888).
O setor que mais demitiu em agosto foi a construção civil (22,1 mil), seguido pela agricultura (15,4 mil) e pelo setor de serviços (3,01 mil).

REGIÕES — O Nordeste foi responsável pela maior criação de vagas de trabalho: 19,4 mil. O resultado positivo foi puxado pela contratação líquida de mais de 9.000 trabalhadores em Pernambuco. A outra região do país que contratou mais que demitiu foi o Sul, com um saldo de 1,85 mil.
Por outro lado, o Sudeste respondeu pelo maior número de vagas encerradas: 50,8 mil. A maior parte desse resultado se deve ao desempenho negativo do mercado de trabalho no Rio de Janeiro, onde as demissões superaram as contratações em 28,32 mil.
O resultado do Rio de Janeiro — a maior queda entre os Estados — é reflexo do fechamento de vagas nas áreas de comércio e administração de imóveis (8,4 mil), além de serviços de alojamento e alimentação (4,5 mil). Esses dados, segundo o Ministério do Trabalho, foram influenciados pelo fim dos Jogos Olímpicos de 2016.
A cidade do Rio perdeu 17.541 vagas, sendo a maior parte (8.104) no setor de serviços, seguido pela construção civil (5.730) e pela indústria da transformação (2.539).
O Centro-Oeste encerrou 2,6 mil postos de trabalho e o Norte, 1,8 mil.




Mantega foi o coração da economia dos governos petistas
e a pessoa que comandou o Ministério da Fazenda
por mais tempo na história



Preso pela manhã e solto no início da tarde de quinta-feira (22.set.2016) pela Operação Lava Jato, ninguém simbolizou tanto a economia da era petista no poder quanto o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega. Depois de ser um dos principais formuladores da proposta econômica de Luiz Inácio Lula da Silva na vitoriosa campanha presidencial de 2002, Mantega assumiu o Ministério do Planejamento em 2003 e comandou o BNDES. Quando o ministro da Fazenda Antonio Palocci caiu em desgraça, Mantega assumiu a pasta em março de 2006. Só saiu de lá nove anos depois, numa longevidade considerada surpreendente por especialistas.
Nesses nove anos à frente do cargo, Mantega jogou afinado com Lula. Sem ambições políticas, não se interessou por disputar mandatos eletivos durante o apogeu popular do governo petista. Seu poder constava em estar no centro da formulação da economia do País. Acabou se tornando a pessoa que ficou mais tempo no comando da Fazenda.
Sem nunca bater de frente com Lula e com crescimento econômico expressivo durante esse período, Mantega começou a ter problemas na pasta a partir da chegada de Dilma Rousseff ao poder. Economista e centralizadora, Dilma passou a interferir diretamente nas diretrizes da economia. Além disso, também aumentou o espaço dado ao então secretário do Tesouro Arno Augustin.
Nesse período, surgiram controvérsias, como a polêmica política de desonerações fiscais e também as contabilidades criativas, com as chamadas “pedaladas” se tornando alvo de denúncias contra o governo. A economia do Brasil acabou entrando em parafuso, inflação e desemprego foram aumentando e Mantega terminou sendo queimado politicamente por Dilma na campanha pela reeleição, quando sua substituição foi anunciada publicamente pela presidente para o segundo mandato, caso fosse reeleita. Magoado, Mantega deixou o governo e viu Dilma abrir espaço na Fazenda para Joaquim Levy, de perfil muito mais alinhado ao mercado, e depois para Nelson Barbosa, mais próximo das origens petistas.

PRISÃO REVOGADA — O juiz federal Sergio Moro revogou, no início da tarde de quinta-feira (22.set.2016), a prisão do ex-ministro Guido Mantega, que havia sido detido temporariamente na 34ª fase da Operação Lava Jato.
A decisão saiu às 12 horas e 20 min. O motivo foi a situação de saúde da mulher de Mantega, que passava por uma cirurgia no hospital Albert Einstein quando a operação ocorreu.
O ex-ministro é acusado de solicitar ao empresário Eike Batista o repasse de R$ 5 milhões ao PT para pagar dívidas de campanha, em novembro de 2012 (os investigadores ainda não sabem a que campanhas o ex-ministro se referia).
A equipe da PF pretendia prender Mantega em sua residência, no bairro de Pinheiros, zona oeste de São Paulo. Na casa — que foi o alvo das buscas —, entretanto, só estavam seu filho, de 16 anos, e a empregada doméstica.
A Polícia Federal decidiu, então, ir até o hospital para encontrar Mantega. Em nota, a PF negou que tenha havido ação no hospital e que a coincidência com a internação da mulher do ex-ministro foi infeliz.
"Nas proximidades do hospital, policiais federais fizeram contato telefônico com o investigado, que se apresentou espontaneamente na portaria do edifício", informou a corporação, em nota. "De forma discreta e em viatura não ostensiva, o investigado acompanhou a equipe até o apartamento e, já tendo feito contato com seu advogado, foi então iniciado o procedimento de busca", completa o comunicado.
Segundo o advogado de Mantega, José Roberto Batochio, a mulher do ex-ministro estava pré-anestesiada e semiconsciente quando a operação chegou ao local. Também afirmou não ter a intenção de explorar na defesa um eventual prejuízo da prisão ao procedimento médico.
"A prisão era abusiva, arbitrária e não tinha razão de ser", disse Batochio. Questionado sobre o fato do juiz Sergio Moro apontar desconhecimento a respeito da cirurgia da mulher de Mantega em seu último despacho, o advogado afirmou: "Com cirurgia ou sem cirurgia, a prisão é arbitrária e odiosa, autoritária e inaceitável".
Depois de acompanhar as buscas no apartamento, o ex-ministro foi levado à sede da Polícia Federal. De lá, seguiria para Curitiba, onde a prisão seria cumprida.
"Considerando os fatos de que as buscas nos endereços dos investigados já se iniciaram e que o ex-ministro acompanhava o cônjuge no hospital e, se liberado, deve assim continuar, reputo no momento esvaziados os riscos de interferência da colheita das provas nesse momento", escreveu Moro na decisão.
A decisão foi de ofício, ou seja, não atendeu a pedido do Ministério Público Federal e nem da polícia, mas foi tomada pelo próprio juiz.

OUTRO LADO — O advogado de Mantega, José Roberto Batochio, disse que seu cliente "jamais conversou com Eike Batista a respeito desses fatos". O defensor do ex-ministro falou com a imprensa quando deixava a superintendência da PF em São Paulo.
Estamos sabendo desses fatos agora, esses fatos eram absolutamente secretos", declarou. "A mim me compete agora me inteirar". Batochio também criticou o fato de Mantega ter pedido de prisão expedido e Eike estar solto, já que o crime de corrupção pressupõe o corrompido e o corruptor.
Ele classifica a prisão de Mantega como desnecessária. "Quer ouvir, quer investigar, chama, íntima. Qual é a necessidade disto?" argumentou.
Depois que a prisão foi revogada pelo juiz Sergio Moro devido à cirurgia da mulher de Mantega, Batochio afirmou: "Com cirurgia ou sem cirurgia, a prisão é arbitrária e odiosa, autoritária e inaceitável".

REAÇÃO — A circunstâncias da prisão provocaram críticas. O presidente do PT, Rui Falcão, se disse "revoltado" com a operação e afirmou que o "estilo de arbitrariedade e violação de direito" da força-tarefa da Lava Jato é "insuportável".
As bancadas do PT na Câmara e no Senado também reagiram à prisão do ex-ministro. Em nota, chamaram a operação de "seletiva e abusiva".
Os parlamentares falam em violação da "dignidade e direitos fundamentais" de Mantega e sua família. Para os deputados, o "espetáculo político-administrativo" visa "interferir na disputa política" no país.
"Resta óbvia a orientação político-partidária da investigação: atacar o Partidos dos Trabalhadores e tentar inviabilizar uma candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República em 2018", destaca a nota do PT da Câmara.
Falando em indignação, os senadores destacam o "repúdio" à ação da PF, afirmando que a prisão de Mantega ocorreu em "condições desumanas, arbitrárias e, mais uma vez, espetaculosas", o que "contribui para fragilizar as crenças nas instituições democráticas e na lisura e isenção das operações efetuadas pela Lava Jato".




quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Ex-ministro Guido Mantega é preso
em nova fase da Lava Jato



O ex-ministro da Fazenda Guido Mantega


O ex-ministro da Fazenda Guido Mantega foi preso pela Polícia Federal em nova fase da Lava Jato. Mantega estava no Hospital Albert Einstein, onde sua mulher passa por tratamento médico.
A equipe da PF pretendia prender Mantega em sua residência, no bairro de Pinheiros, zona oeste de São Paulo. Na casa — que foi alvo de buscas —, entretanto, só estava seu filho. O ex-ministro acompanhava naquele momento sua mulher em cirurgia no hospital Albert Einstein do Morumbi.
A Polícia Federal decidiu então ir até o hospital para encontrar Mantega. "Nós só esperamos que não atrapalhem a cirurgia", afirma José Roberto Batochio, advogado de Mantega.
A prisão é do tipo temporária, decretada em casos específicos. Sua duração é de cinco dias, prorrogável por igual período caso comprovada sua necessidade.
A 34ª fase da Operação Lava Jato, intitulada Operação Arquivo X, cumpre 49 ordens judiciais, sendo 33 mandados de busca e apreensão, 8 mandados de prisão temporária e 8 mandados de condução coercitiva (quando a pessoa é conduzida para prestar depoimento).
Além de Mantega, são alvos da operação executivos das empresas Mendes Júnior e OSX, do empresário Eike Batista.
Eles são investigados por supostos desvios na construção das plataformas P-67 e P-70, da Petrobras, construídas para a exploração do pré-sal, em 2012.
A Polícia Federal tem indícios de que Mantega atuou diretamente junto à direção de uma das empresas para negociar o repasse de recursos ao PT, a fim de pagar dívidas de campanha.
Em depoimento ao Ministério Público Federal, o próprio empresário Eike Batista declarou que foi procurado por Mantega para fazer um pagamento de R$ 5 milhões ao PT, em novembro de 2012. Sob orientação do partido, ele teria firmado um contrato fraudulento com uma empresa de publicidade para realizar as transferências, feitas no exterior, num total de US$ 2,35 milhões.
Os repasses suspeitos chegam a cerca de R$ 22 milhões. Entre os beneficiados, estão a empresa Credencial Construtora (que, segundo o Ministério Público, já foi usada pelo ex-ministro José Dirceu para recebimento de propinas) e um operador financeiro já condenado na Lava Jato.
São apurados os crimes, dentre outros, de corrupção, fraude em licitações, associação criminosa e lavagem de dinheiro.
As determinações judiciais estão sendo cumpridas em cidades nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Bahia e Distrito Federal.
Guido Mantega foi ministro durante os governos de Lula e de Dilma Rousseff e já havia sido alvo de condução coercitiva em maio, na 7ª fase da Operação Zelotes. Na época, o objetivo da Justiça Federal era apurar suposta ligação do ex-ministro com empresa que é suspeita de comprar decisões do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), ligado ao Ministério da Fazenda.
No mesmo Albert Einstein, em fevereiro deste ano, ele já havia passado por episódio que se tornou público. Na época, Mantega foi hostilizado por clientes que estavam na cafeteria do local, que gritaram para que ele fosse "para o SUS" e "para Cuba".

Mantega já é investigado por outra operação da PF, a Zelotes, na qual é suspeito de ter indicado um conselheiro para um órgão da Receita que, por sua vez, beneficiou empresa da qual teria recebido propina.

EIKE BATISTA — A Procuradoria da República, no Paraná, informou nesta quinta-feira, 22.set.2016, que o empresário Eike Batista, ex-presidente do Conselho de Administração da OSX, prestou depoimento ao Ministério Público Federal. Segundo a força-tarefa da Operação Lava Jato, Eike Batista declarou que, em 1 de novembro de 2012, recebeu pedido de um então ministro e presidente do Conselho de Administração da Petrobrás, para que fizesse um pagamento de R$ 5 milhões, no interesse do PT.
Naquele ano, o presidente do Conselho de Administração era Guido Mantega. O ex-ministro foi preso.
De acordo com o Ministério Público Federal, para operacionalizar o repasse da quantia, o executivo da OSX foi procurado e firmou contrato ideologicamente falso com empresa ligada a publicitários já denunciados na Operação Lava Jato ‘por disponibilizarem seus serviços para a lavagem de dinheiro oriundo de crimes’. Após uma primeira tentativa frustrada de repasse em dezembro de 2012, em 19 de abril de 2013 foi realizada transferência de US$ 2.350.000,00, no exterior, entre contas de Eike Batista e dos publicitários.
A Operação Arquivo X, 34ª fase da Lava Jato, mira no ex-ministro Guido Mantega e em executivos das empresas Mendes Júnior e OSX Construção Naval S.A., assim como representantes de empresas por elas utilizadas para o repasse de vantagens indevidas.
Em 26 de julho de 2012 o Consórcio Integra Ofsshore, formado pelas empresas Mendes Júnior e OSX, firmou com a Petrobras contrato no valor de US$ 922 milhões, para a construção das plataformas P-67 e P-70 (unidades flutuantes de produção, armazenamento e transferência de petróleo voltadas à exploração dos campos de pré-sal).
As consorciadas, que não detinham tradição no mercado específico de construção e integração de plataformas, viabilizaram a contratação pela Estatal mediante o repasse de valores a pessoas ligadas a agentes públicos e políticos. O aprofundamento das investigações, por meio de oitiva de testemunhas e colaboradores, apreensão de documentos, afastamento de sigilos bancário, fiscal e telemático, assim como a análise da base de dados coletada ao longo das 33 fases anteriores da operação, revelou um estratagema criminoso que beneficiou agentes públicos em diferentes esferas.
De um lado, colheram-se indícios de que cerca de R$ 7 milhões foram transferidos, entre fevereiro e dezembro de 2013, pela Mendes Júnior para um operador financeiro ligado a um partido político e à Diretoria Internacional da Petrobras, já condenado no âmbito da Operação Lava Jato. Os repasses foram viabilizados mediante a interposição de empresa de fachada, que não possuía uma estrutura minimamente compatível com tais recebimentos.
De outro lado, foi identificado repasse de mais de R$ 6 milhões pelo Consórcio Integra Ofsshore com base em contrato ideologicamente falso firmado em 2013 com a Tecna/Isolux. Conforme prova testemunhal e documental, que instruiu a representação do Ministério Público Federal (MPF), o valor foi transferido no interesse de José Dirceu e de pessoas a ele relacionadas. Constatou-se ainda que, no período dos fatos, empresas do grupo Tecna/Isolux repassaram cerca de R$ 10 milhões à Credencial Construtora, já utilizada pelo ex-ministro-chefe da Casa Civil para o recebimento de vantagens indevidas, conforme já denunciado nos autos n.º 5030883-80.2016.404.7000.
Também foram identificados, entre março de 2013 e junho de 2014, repasses de mais de R$ 6 milhões da Mendes Júnior a empresas ligadas a um executivo do grupo Tecna/Isolux.

OUTRO LADO — Segundo o advogado da empresa Mendes Júnior Marcelo Leonardo "a empresa estava em negociação de acordo de leniência e delação premiada e foi surpreendida com a operação de hoje já que ela envolve fatos que fazem parte do escopo da colaboração".
Ele acusa os procuradores de terem usado informações fornecidas pela empresa sem o acordo estar fechado.

O empresário Eike Batista, cujas empresas são alvo da nova fase da Lava Jato deflagrada nesta quinta-feira, 22.set.2016, não teve prisão temporária decretada, como outros investigados.





Irmão de José Dirceu estuda fazer delação premiada



Luiz Eduardo de Oliveira e Silva (ao centro)


Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, irmão do ex-ministro José Dirceu, estuda fazer delação premiada na Lava Jato. Quem acompanha as conversas, relata que ele assumiria envolvimento no esquema de corrupção na Petrobrás numa tentativa de livrar o irmão famoso de parte dos crimes de que é acusado. Luiz Eduardo já admitiu à PF que recebeu pagamentos mensais de R$ 30 mil do esquema. Por sua militância política, Dirceu sempre se manteve em silêncio. Foi condenado a 23 anos e três meses de prisão. Já seu irmão não tem vinculação partidária.

A situação de José Dirceu, contudo, tende a se complicar. A Operação Marquês, tocada pelo Ministério Público português, encontrou documentos relacionados a ele num escritório de advocacia alvo de busca naquele país.
Foram localizadas anotações manuscritas com referência a Vivo, Telemar e Brasil Telecom juntamente com cópias do passaporte do próprio José Dirceu e extratos de contas bancárias.




Descriminalização do aborto para grávidas com zika
vira polêmica



Em manifestação encaminhada ao Supremo Tribunal Federal (STF), a Associação Nacional da Cidadania pela Vida (Adira) afirma que a descriminalização do aborto para grávidas com zika pode “abrir um perigoso precedente para toda e qualquer outra situação de deficiência” e compara o “aborto eugênico” à limpeza étnica promovida por Adolf Hitler. A associação pediu para entrar como interessado (amicus curiae) no processo, que é de relatoria da presidente do STF, ministra Cármen Lúcia.
A Adira também quer indicar peritos e autoridades no assunto para participar de audiências públicas sobre o tema.
A Associação Nacional de Defensores Públicos (Anadep), que moveu a ação e pede a descriminalização do aborto para grávidas com zika, também solicitou à ministra Cármen Lúcia que seja realizada audiência pública sobre a possibilidade de interrupção de gravidez no caso de infecção da gestante com o vírus da zika.
Dentro do STF, o julgamento do aborto para grávidas com zika é visto como um tema delicadíssimo. Em abril de 2012, os ministros do STF decidiram, por 8 votos a 2, que aborto de fetos anencéfalos não é crime. A ministra Cármen Lúcia na ocasião votou no sentido de considerar que o aborto desses fetos não configura crime.
Já no caso do aborto para grávidas com zika, um ministro ouvido pela reportagem acredita que o debate será mais controverso devido ao fato de bebês com microcefalia apresentarem uma condição diferente da dos anencéfalos, podendo viver e se integrar à sociedade, ainda que tenham limitações.
“O microcéfalo no ventre materno não é morto, nem subumano. É um ser humano vivo, embora deficiente . (…) O pedido autoral parece revelar forte discriminação em relação às crianças portadoras de deficiência”, afirmou a Associação Nacional da Cidadania pela Vida (Adira).
Para a Adira, a permissão de aborto nesses casos “implicará no aumento e na maior efetivação da discriminação contra pessoas de qualquer modalidade de deficiência, pois uma vez negado o direito à vida aos nascituros com enfermidades físicas e mentais, o preconceito, com todas as vênias, não só será legitimado como legalizado”.
Em manifestação encaminhada ao STF, o presidente do Senado por meio da Advocacia do Senado Federal, alegou que o aborto nessas circunstâncias “diz respeito a um dissenso moral profundo”, sobre o qual dificilmente os parlamentares vão adotar uma “uniformidade de posições”. Para o Senado, a “repulsa ao aborto está profundamente arraigada na cultura brasileira”.
Antes, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, já havia defendido o aborto para mulheres infectadas por zika, sob a alegação de que a continuidade da gestação nesses casos representa risco “à saúde psíquica da mulher”. Já a Advocacia-Geral da União (AGU) sustenta que a interrupção da gestação “seria frontalmente violadora ao direito à vida”.




terça-feira, 13 de setembro de 2016

Câmara cassa o mandato de Eduardo Cunha
peemedebista fica inelegível até 2027



Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ex-presidente da Câmara,
faz sua defesa durante votação de sua cassação, em Brasília (DF)


O plenário da Câmara dos Deputados aprovou na noite de segunda-feira (12.set.2016) a cassação do mandato de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), colocando um ponto final em um conturbado processo iniciado em novembro de 2015.
Anunciado às 23h50, o placar mostrou 450 votos pela cassação — 193 a mais do que o mínimo necessário —, contra apenas 10 pela absolvição. Houve 9 abstenções.
O caso foi marcado por protelações desde o ano passado. Cunha era formalmente acusado na Câmara de mentir aos colegas ao negar, em março de 2015, ter "qualquer tipo de conta" no exterior — frase dita meses antes de vir à tona a existência de dinheiro atribuído ao peemedebista na Suíça.
Em discurso, Cunha afirmou "pagar o preço" por ter autorizado a tramitação do processo de impeachment de Dilma Rousseff da presidência. "O PT quer um troféu para dizer que é golpe", ressaltou.
Cunha já estava afastado do mandato. Com a decisão da Câmara, fica inelegível até janeiro de 2027.
Outra consequência da cassação deve ser a mudança do foro onde ele será investigado e julgado pelas acusações de ser um dos principais integrantes do esquema de corrupção na Petrobras.
Com o foro privilegiado que o mandato lhe conferia, Cunha responde a duas ações penais no Supremo Tribunal Federal, além de outras investigações relacionadas ao esquema.
Agora, seu caso pode migrar para a Justiça Federal no Paraná, sob os cuidados do juiz Sergio Moro — a expectativa, porém, é que Cunha tente manter de alguma forma os processos no STF.
Da tribuna, o ex-presidente da Câmara afirmou que seria cassado por motivos "risíveis", abrindo precedente para que "qualquer deputado" perca o mandato por acusações, segundo ele, frágeis. Em tom de recado, disse que, na média, 160 deputados respondem a acusações: "Amanhã será com vocês também".
Coube à deputada Clarissa Garotinho (PR-RJ) um dos discursos mais duros contra Cunha. Adversária dele no Rio, ela chamou o peemedebista de "mafioso da pior espécie" e "psicopata".

DUELO — A queda final de Cunha ocorre 12 dias depois do afastamento definitivo de Dilma da Presidência. Os dois protagonizaram um dos principais embates recentes da política brasileira.
Um dos deputados mais poderosos, Cunha foi o responsável por dar curso e liderar na Câmara o processo de impeachment de Dilma, com quem rompeu em 2015.
O peemedebista havia sido eleito para a presidência da Câmara em fevereiro daquele ano derrotando o PT e o governo. Tendo como base de apoio o PMDB e os partidos do chamado centrão (PSD, PR, PP, PTB e PRB, principalmente), Cunha aplicou sucessivas derrotas ao Planalto, mas chegou a tentar um acordo com o governo que envolveria o enterro do impeachment e de seu processo de cassação. As tratativas falharam, porém.
No primeiro trimestre de 2015 haviam surgido as primeiras suspeitas consistentes de participação de Cunha no petrolão, o que levou o STF a incluí-lo na lista dos investigados.
Em abril, uma reportagem revelou que o nome do peemedebista aparecia nos registros eletrônicos da Câmara como o real autor de dois requerimentos que, segundo a Lava Jato, foram usados para achacar uma fornecedora da Petrobras.
O surgimento de delatores que o implicavam e a revelação da existência de dinheiro vinculado a ele em contas secretas na Suíça complicaram ainda mais a sua situação, levando-o a ser o primeiro congressista réu na Lava Jato.

AFASTAMENTO — Em 5 de maio de 2016, dias após a Câmara aprovar a autorização para a abertura do processo de impeachment de Dilma, começou a derrocada de Cunha.
O STF o afastou do cargo e do mandato sob a acusação de que usava suas funções para atrapalhar as investigações.

Com a cassação, reassume uma vaga na Câmara dos Deputados o suplente José Augusto Nalin (PMDB-RJ), dono de uma cadeia de shoppings populares no interior do Rio. Em 2014 ele declarou ter patrimônio de R$ 9,1 milhões, sendo R$ 1,355 milhão "em espécie". Ele afirma que esse último valor se referia a saldo bancário.




quarta-feira, 7 de setembro de 2016

O Brasil tem um dos judiciários mais dispendiosos do mundo — a estrutura emprega muita gente e tem alta carga de trabalho




O Judiciário no Brasil é caro. Ele é caro porque emprega muita gente, é caro porque os salários médios de seus colaboradores são maiores do que a média da maioria das outras categorias. E também é caro porque está sobrecarregado de trabalho. São essas as conclusões de um levantamento realizado por pesquisadores comparando os custos do Judiciário no Brasil, proporcional a grandezas como o PIB e a população, com os de outros países.
Pelos dados compilados pela pesquisa, o orçamento da Justiça em 2013 (último ano com dados disponíveis quando o levantamento foi realizado), R$ 62,3 bilhões, era maior do que o PIB individual de 12 Estados brasileiros. Em proporção ao PIB nacional, as despesas do Judiciário, equivalentes a 1,30%, também englobam uma fatia maior do que a de vários outros países, como Espanha (0,12%), Estados Unidos (0,14%), Portugal (0,28%) ou países sul-americanos como Chile (0,22%) e Argentina (0,13%).
A situação não deve ser analisada sem contexto — há uma cadeia de fatores que fazem as despesas do Judiciário brasileiro serem proporcionalmente tão altas. Um desses fatores é a carga gigantesca de processos acumulados. Fruto de uma opção do Judiciário brasileiro pela autonomia de seus integrantes em vez de um posicionamento como instituição.
A metodologia aplicada para chegar à conclusão de que temos uma Justiça cara, na prática, não calculou quase nada, apenas compilou informações de fontes secundárias. Isso significa que se pegou informações oficiais do CNJ, no Brasil, e, em outros países, de órgãos oficiais e estudos acadêmicos que analisam a eficiência do Judiciário. Simplesmente foi feito o que ninguém havia se dado ao trabalho de fazer até então, que era basicamente compilar esses dados em tabelas informativas. Isso permitiu ver o quão desproporcional é a despesa do Judiciário no Brasil em relação a outros países.




Como se chega a situação de Justiça cara — O que temos é muita gente trabalhando no Poder Judiciário. Temos cerca de 205 funcionários para cada 100 mil habitantes, incluindo aí assessores, terceirizados, estagiários. Toda essa estrutura existe para dar suporte aos magistrados para tomar decisões. Se somarmos tudo, incluindo os 17 mil magistrados, temos mais de 430 mil indivíduos no Brasil que extraem sua renda mensal diretamente do Judiciário. É muito mais do que no resto do mundo. O único país que chegou remotamente próximo da gente foi a Argentina, que, curiosamente, tem uma despesa menor do que a nossa, pelo menos da forma como conseguimos medir. A isso se soma um fator salarial. Os salários das profissões jurídicas dentro do setor público, mas não só nele, são altos comparados à renda média brasileira ou à renda de várias outras áreas profissionais. Então a gente soma os fatores: tem muita gente trabalhando no Judiciário, com salários comparativamente altos. O resultado é que temos um Judiciário caro.

E o porquê de tanta gente — A carga de trabalho do Judiciário no Brasil é uma das maiores do mundo. Temos atualmente cerca de 100 milhões de processos em tramitação, um para cada dois habitantes. Por quê? Por motivos que podem, na prática, ser resumidos a um: a grande deferência que o Brasil tem à autonomia individual dos magistrados. Não temos tradição de tratar de forma agregada conflitos semelhantes ou idênticos. Isso é algo que encontra resistência inclusive dentro da magistratura. O Poder Judiciário tem muitas ações idênticas e, por consequência, realiza muito trabalho redundante. No TRF da 4ª região, que fica em Porto Alegre, cerca de 70% da carga de trabalho envolve o INSS em um dos polos da ação. O INSS é um dos grandes demandados do Brasil, bem como bancos, operadoras de telefonia etc., isto é, grandes pessoas jurídicas que prestam serviços para grandes contingentes de pessoas físicas são os maiores réus do Brasil. Tratar de forma agregada os casos significa não decidir a demanda do João contra o INSS, depois a da Maria, depois a do Pedro, mas ver que os casos da Maria, do João, do Pedro têm todos uma questão de fundo, de direitos, que é muitas vezes idêntica.

A uniformização — Quando fala-se em tratar de modo agregado, pensa-se, geralmente, em três tipos de soluções. A primeira é o precedente, que está na base das ideias de Súmula Vinculante e Repercussão Geral. O STF, quando diz "vamos analisar esse caso e o resultado vai ser aplicado a todos os casos idênticos", essa decisão pode abranger mais 50 mil casos. Imagine o esforço coletivo que é decidir 50 mil casos um a um. Entretanto, a prática institucional no Brasil por décadas vem sendo essa, em parte por respeito à autonomia individual dos magistrados. Essa autonomia permite que às vezes dentro de um mesmo foro ou tribunal haja entendimentos diferentes sobre questões idênticas. Se o processo for sorteado para tal Vara ou Câmara, tem um entendimento, se o computador sortear para outra Vara ou Câmara, tem outro. Então, na prática, muitas vezes quem acaba tomando a decisão é a sorte, tal qual contida no algoritmo do computador que sorteia os processos. E essa uniformização não precisa ser feita só pelo STF. Poderia ser feita pelos demais tribunais superiores e pelos tribunais de segunda instância (TJs, TRFs, TRTs etc.).
Outra ideia seriam ações coletivas, algo que se usa de forma ainda relativamente tímida no Brasil. Digamos que um juiz ou alguém do Judiciário identifique que há uma série de demandas repetitivas. Em vez de ficar julgando uma a uma, recebe todas e diz: "Agora eu vou decidir uma vez em nome desse tipo de conflito típico". Digamos, o primeiro juiz que recebe um determinado tipo de caso fica prevento para receber os demais casos iguais, tornando-se responsável por decidir para todo mundo em nome do Poder Judiciário como instituição naquela jurisdição. Claro, os casos não vão ser todos idênticos, vai ter uma peculiaridade aqui e outra ali, mas aí se decide também quando há essa peculiaridade.
O terceiro mecanismo é a indenização punitiva. Essa é uma prática que existe há pouco tempo no Brasil. Ela busca aplicar altas indenizações para que a pessoa que causou o dano tenha um prejuízo tão alto que, na prática, seja obrigada a corrigir o comportamento que gerou o dano, gerando a sua prevenção. A julgar pela enorme demanda, não parece que isso esteja ocorrendo no Brasil.




Muita gente no Judiciário, mas com poucos juízes — Há uma reclamação constante na magistratura no Brasil: temos poucos juízes. O Brasil tem 8,2 magistrados por 100 mil habitantes. É um número abaixo de alguns países que orbitam em torno de 10 magistrados por 100 mil habitantes, mas acima de outros. Não é uma coisa tão destoante. Muitos magistrados citam a Alemanha como exemplo, mas é um caso excepcional, com 24 magistrados para 100 mil habitantes. E para complementar o argumento: de fato, não temos magistrados suficientes perante a demanda, mas seguramente temos força de trabalho auxiliar de sobra para ajudar os magistrados a tomarem as decisões, incluindo aí juízes conciliadores e leigos de juizados especiais. A solução que se vem adotando historicamente no Brasil é: tem muito trabalho, cria-se mais estrutura judiciária. Nos anos 1960 e 1970, cresceu muito a carga de trabalho dos Tribunais de Justiça, principalmente com causas de menor valor, conflito de menor potencial ofensivo, etc. Qual foi a solução? Criar um tribunal novo, o Tribunal de Alçada, que existia até uns anos atrás em Estados como RS ou MG. Criamos um tribunal inteiro. Deu conta? Não deu. Recentemente foi aprovada uma emenda constitucional para criar três novos tribunais regionais federais no Brasil. Não vai dar conta. E na base desse fenômeno está o fato de que não estamos pensando o Judiciário como instituição e sim, a grosso modo, como um espaço em que 17 mil pessoas concordaram em discordar umas das outras. E o nosso sistema de resolução de conflitos, e até mesmo o nosso sistema político, acabam sendo em parte reféns dessa dinâmica.

Judiciário com custo baixo — Para baixar o custo do Judiciário no Brasil não existe solução fácil ou imediata. Todas demandam transição de médio e longo prazo, e forte comprometimento institucional da magistratura. Três soluções podem ser adotadas de forma isolada ou combinada. A primeira é reduzir subsídios, o que não parece uma solução no horizonte do Brasil. A segunda é reduzir o número de pessoas trabalhando na área. Também não parece algo próximo. Desses mais de 400 mil servidores do Judiciário, quase 300 mil são servidores estáveis, fora os terceirizados, que já representam uma redução de custos. A terceira é reduzir o número de processos.

A previsibilidade da decisão judicial — Os acordos ajudariam a reduzir o custo e o volume de ações no judiciário. Entretanto, diferente do resto do mundo, no Brasil o acordo ocorre dentro do Judiciário. Em vários casos, é obrigatória uma audiência de conciliação. Lá de vez em quando um juiz consegue um acordo, pois como os caras já chegaram no Judiciário, vão até o fim.
No resto do mundo o acordo ocorre fora do Judiciário, o juiz nem fica sabendo. Os advogados das partes sentam a uma mesa e dizem: "O entendimento do Poder Judiciário sobre tal ponto é 'x'". Aí outro diz: "Sim, de fato, mas tal coisa também diz 'y'". E com base nisso chegam a uma solução negociada, assinam um acordo e fica resolvido o conflito, com o recurso ao Judiciário como algo subsidiário em caso de não cumprimento. Mas o que está na base dessa prática é a previsibilidade da decisão judicial. Porque se sabe que o Judiciário como instituição vai decidir de determinada maneira, pode-se prever que o curso da ação vai ser de uma forma, que o custo da ação vai ser tanto, etc. Em função desta previsibilidade, a gente pode sentar numa mesa e negociar.




segunda-feira, 5 de setembro de 2016

Metade dos principais grupos empresariais do país vende ativos para pagar dívida



Por empréstimo, a Gol deu boa parte de suas ações no programa Smiles para sua parceira Delta


Metade dos principais grupos do país está vendendo empresas ou participações para pagar dívidas, principalmente os títulos emitidos no exterior (bonds), segundo levantamento da Fitch junto às 150 companhias monitoradas pela agência de risco.
"Os grupos estão se desfazendo do que não faz parte do negócio principal", afirma Mauro Storino, diretor sênior da área de empresas da Fitch.
A situação já deixou em alerta os bancos privados, que nos últimos anos emprestaram cerca de R$ 1,1 trilhão só para esses grupos. Com a recessão, o primeiro passo foi renegociar as dívidas.
O Banco Central já vinha captando essa movimentação. Somente entre julho e dezembro de 2015, houve um aumento de 6,7% para 7,6% no saldo renegociado da carteira de crédito das empresas.
Para evitar o calote e o aumento de reservas para cobrir perdas, os bancos optaram por oferecer condições de pagamento que antes estavam fora de questão. Deixaram, por exemplo, que o pagamento da dívida principal — que normalmente entra no cálculo da parcela — fosse adiado por um ano. Mas muitas empresas descartaram a renegociação porque o custo financeiro das operações aumentou cerca de 30%.
Por isso, após muitas medidas de contenção, como corte de investimentos e de dividendos, várias companhias decidiram "queimar caixa" e pagar dívidas. O resultado é que a taxa de rolagem (renegociação) caiu de 56%, no primeiro semestre de 2015, para 38% no mesmo período deste ano. A situação abrange diversos setores, além das empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato.
A Eletrobras está se desfazendo das distribuidoras. Com uma dívida de R$ 11,7 bilhões, a mineira Cemig pode sair das usinas de Belo Monte e Santo Antônio. No Paraná, a Copel, que já tinha reduzido dividendos para manter investimentos, agora está se desfazendo da fatia na Sanepar (empresa de saneamento). Para conseguir um empréstimo de US$ 300 milhões, a Gol deu boa parte de suas ações no programa de fidelidade Smiles para sua parceira americana Delta.
Para Storino, o impacto do "feirão" na taxa de rolagem de dívidas medida pelo BC só deve começar a aparecer no último trimestre.
Segundo os bancos privados, o que mais pressiona as empresas atualmente são os vencimentos dos títulos emitidos no exterior. O levantamento da Fitch mostra que o estoque desses papéis com vencimentos até 2030 é de US$ 96 bilhões (cerca de R$ 312 bilhões) — mais de dois terços da dívida total das empresas no exterior é de bonds.
Até o final de 2017, as empresas têm de pagar US$ 11,2 bilhões (R$ 36,4 bilhões).