A delação que compromete Dilma — dona de agência diz que assessor de Dilma operou desvios em campanha
Em depoimento, a dona da Pepper, Danielle Fonteles, afirma que recebeu
recursos "por fora" num total de R$ 58 milhões, para abastecer as
campanhas de 2010 e 2014. Quem a orientou no esquema foi o braço direito
da presidente, Giles Azevedo.
Giles Azevedo, assessor especial da presidente Dilma Rousseff |
Assessor especial de Dilma Rousseff, o discreto Giles Azevedo é
considerado no Palácio do Planalto os olhos e os ouvidos da presidente
da República. O único na Esplanada com autorização para falar em nome de
Dilma e a quem ela confia as mais delicadas tarefas. Por isso, quem
recebe instruções do fiel auxiliar da presidente não entende de outra
maneira: ele fala na condição de enviado da principal mandatária do
País. Foi com essa credencial que Giles se aproximou da publicitária
Danielle Fonteles, dona da agência Pepper Interativa. Em uma série de
encontros, muitos deles mantidos na própria residência da publicitária
no Lago Sul, em Brasília, Giles orientou Danielle a montar a engenharia
financeira responsável por abastecer as campanhas de Dilma de 2010 e
2014 com recursos ilegais. A maior parte do dinheiro oriunda de
empreiteiras do Petrolão e de agências de comunicação e publicidade que
prestam serviço para o governo federal. As revelações foram feitas pela
própria dona da Pepper em seu acordo de delação premiada. Ainda não
homologado, o depoimento tem potencial explosivo, pois sepulta o
principal argumento usado até agora por Dilma para se apresentar como
vítima de um “golpe” destinado a apeá-la do poder: o de que não haveria
envolvimento pessoal seu em malfeitos. Agora, fica complicado manter
esse discurso em pé. No governo, e fora dele, há um consenso
insofismável: Giles é Dilma. Nas conversas com Danielle, segundo a
delação, Giles tratava sobre as principais fontes de financiamento que
irrigariam as campanhas de Dilma por intermédio da Pepper. Sem registro
oficial. Segundo ela, as orientações partiam do discreto assessor da
presidente.
No depoimento aos investigadores, a publicitária confessou ter recebido
recursos “por fora”, por meio de contratos fictícios, da Andrade
Gutierrez, da Queiroz Galvão, da OAS, da Odebrecht — empreiteiras
implicadas no Petrolão —, da Propeg e de uma grande empresa de
assessoria de comunicação dona de contas no governo, tudo conforme
combinado com Giles. A Propeg, agência de publicidade baiana que, de
acordo com Danielle, teria sido responsável por vultosos repasses,
figura entre as oito que mais receberam verbas do governo Dilma nos
últimos anos. Atualmente, ela possui a conta da Caixa Econômica Federal e
do Ministério da Saúde. Na quebra de sigilo da Pepper, a pedido da CPI
do BNDES, foram identificados quatro depósitos da Propeg totalizando R$
223 mil entre 2011 e 2012. Da Andrade Gutierrez, a dona da Pepper
admitiu ter recebido de maneira ilegal R$ 6,1 milhões, ratificando
depoimento de Otávio Azevedo, ex-presidente da empreiteira. Com o
montante, a empresa pagou funcionários do comitê de Dilma na campanha de
2010, entre outras despesas. Em outro trecho da delação, Danielle
afirma que abriu uma conta na Suíça em 2012, sob o conhecimento de
Giles, para receber da Queiroz Galvão na chamada “Operação Angola”. Por
ela, a Pepper recebeu US$ 237 mil. A conta para movimentar os recursos,
identificada com a sequência CH3008679000005163446, foi aberta por
Danielle no banco Morgan Stanley.
Com tantos recursos para internalizar e uma teia de interesses em jogo, a
Pepper acabou se transformando numa espécie de lavanderia de dinheiro
do PT. Só entre 2013 e 2015, a Pepper movimentou em conta própria R$
58,3 milhões. Com parte destes recursos, a empresa bancou despesas das
campanhas de Dilma à reeleição, principalmente o pagamento a blogs
favoráveis ao PT contratados para atuar na guerrilha virtual travada nas
redes sociais. O dinheiro, segundo orientação de Giles Azevedo, veio da
OAS e da Odebrecht por meio de contratos fictícios ou superestimados.
Essa informação consta da delação de Danielle. Coube a Pepper, por
exemplo, o pagamento de um pixuleco de R$ 20 mil mensais para o criador
do perfil de humor chapa branca “Dilma Bolada”, Jefferson Monteiro. A
personagem faz troça de adversários com a mesma veemência com que exalta
iniciativas e discursos da presidente, até mesmo os mais frugais.
Outros ativistas digitais pró-PT têm motivos para estarem bolados com a
delação da publicitária. Uma lista contendo o nome de dezenas de
jornalistas destinatários da verba repassada pela Pepper foi entregue
por Danielle aos investigadores. Os nomes permanecem guardados a sete
chaves e podem ensejar outra investigação. Oficialmente, a Pepper foi
responsável pela estratégia de internet da campanha da presidente Dilma
em 2010. Na reeleição, em 2014, ficou encarregada de produzir as páginas
da candidata do PT no Facebook e Twitter. Pelo trabalho, recebeu R$ 530
mil por mês.
Em outro capítulo da delação, ao discorrer sobre a campanha vitoriosa de
Renan Filho (PMDB-AL) ao governo de Alagoas, a cargo da Pepper, a
publicitária voltou a implicar o governo federal — deixando claro o elo
do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), com Dilma. Disse que
sua empresa, por meio do marido e sócio Amauri dos Santos Teixeira, só
aceitou participar da campanha de Renanzinho depois de um pedido
expresso do Planalto.
Trechos da delação premiada de Danielle Fonteles já foram encaminhados
ao Supremo Tribunal Federal (STF). A publicitária decidiu subscrever o
acordo depois de tomar conhecimento das acusações dos executivos Otávio
Azevedo e Flávio Barra, da Andrade Gutierrez, sobre parte das
movimentações financeiras das campanhas da presidente, confirmadas por
ela nos depoimentos aos investigadores. A delação foi dividida pela
Procuradoria-Geral da República em duas partes. Os depoimentos que fazem
menção a presidente Dilma foram encaminhados ao STF e estão sob análise
do ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no tribunal. Há ainda
citações ao governador Fernando Pimentel (PT-MG) em exame pelo Superior
Tribunal de Justiça, responsável pelas investigações da Operação
Acrônimo.
A Pepper possui ligações pretéritas com o PT. Em 2003, se aproximou do
partido por intermédio do publicitário Duda Mendonça. Sua estreia no
governo foi no programa Fome Zero, embrião do Bolsa Família. Em 2010, a
Pepper passou a ser investigada pela Polícia Federal após ser acusada de
patrocinar um bunker em Brasília destinado a bisbilhotar e produzir
dossiês contra adversários dos petistas. O QG foi idealizado por
Fernando Pimentel, governador de Minas, então coordenador da campanha de
Dilma.
Em junho do ano passado, a PF chegou a fazer buscas na sede da Pepper,
situada num shopping da capital federal. Segundo a PF, há indicações de
que a empresa foi usada para intermediar dinheiro do BNDES a Pimentel.
Em março, o governador de Minas foi indiciado no âmbito da Operação
Acrônimo por corrupção passiva, organização criminosa e lavagem de
dinheiro. Durante o primeiro mandato de Dilma, Pimentel, na condição de
ministro do Desenvolvimento, exercia forte influência sobre o banco de
fomento. Sua mulher, Carolina Oliveira, é considerada uma espécie de
sócia oculta da Pepper. De acordo com a PF, entre 2013 e 2014, a Pepper
recebeu R$ 520 mil do BNDES por serviços de publicidade e repassou R$
236 mil a Carolina. Foi a partir daí que os agentes encontraram indícios
de que Carolina era mais do que apenas uma colaboradora da agência.
A má notícia para Giles Azevedo e, consequentemente, para Dilma, é que
os investigadores reconhecem a consistência dos depoimentos de Danielle
Fonteles. Foi com base neles que, na sexta-feira 15.abr.2016, o
empresário Benedito Oliveira, o Bené, amigo de Pimentel, foi preso
preventivamente, também na Operação Acrônimo. Em 2010, Bené foi o
responsável por custear as despesas de uma mansão em Brasília alugada
para abrigar funcionários da campanha da presidente, sob a coordenação
de Pimentel. Para a PF, o governador de Minas recebeu “vantagens
indevidas” de Bené, como o pagamento de despesas pessoais dele e de sua
mulher, Carolina Oliveira. Na delação, a dona da Pepper confirmou que
Benedito Oliveira atuava como um dos financiadores da primeira campanha
presidencial de Dilma. As empresas de Bené, como a Gráfica e Editora
Brasil, receberam meio bilhão de reais do governo do PT. Muitos desses
pagamentos para serviços gráficos e organização de eventos, sem
comprovação de prestação de serviços. Como aqueles combinados entre
Giles Azevedo, o homem de Dilma no esquema, e Danielle Fonteles.
Nenhum comentário:
Postar um comentário