sexta-feira, 8 de abril de 2016


Dois sem-terra morrem durante confronto
com a PM no Paraná



Acampamento do MST no Paraná


Dois sem-terra morreram e ao menos outras seis pessoas ficaram feridas durante confronto entre integrantes do MST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra) e policiais na tarde de quinta-feira (07.abr.2016) em um acampamento em Quedas do Iguaçu (447 km de Curitiba — Paraná).
A área é alvo de conflito há duas décadas. Os sem-terra montaram acampamento em julho de 2014 na fazenda onde funciona a empresa Araupel, de reflorestamento e beneficiamento em madeira.
Tanto o MST quanto a Polícia Militar do Paraná usam o termo "emboscada" para explicar o que ocorreu — cada um dizendo-se vítima do outro.
O tenente-coronel Washington Lee Abe, comandante do 5º Comando Regional Militar, afirmou que a polícia não vai tolerar represálias e está preparada para agir, caso seja necessário.
"Só pedimos aos inocentes que se encontram lá nesse movimento que se intitula movimento social, que se afastem. A Policia Militar do Paraná não vai se curvar, não vai tolerar nenhum tipo de represália, não vai tolerar nenhum tipo de infração às leis, nós estamos lá exatamente para manter a lei e a ordem", destacou.
Pela versão da PM, policiais em dois carros da Rotam (Rondas Ostensivas Tático Móvel) com uma brigada de incêndio formada por funcionários da Araupel foram ao local para combater chamas de um incêndio em uma área próxima, quando cerca de 20 sem-terra começaram a disparar contra as equipes, que reagiram ao ataque. Ainda segundo a PM, eram seis policiais (4 da Rotam e 2 da polícia ambiental).
Na ação, ainda segundo a versão da PM, dois sem-terra morreram e outros seis ficaram feridos. A polícia afirmou que foram recolhidos com o grupo uma pistola 9 milímetros e uma espingarda calibre 12. "O restante do grupo se embrenhou na mata", diz nota da Secretaria da Segurança Pública do Paraná.
Ainda segundo a nota, a PM enviou ao local equipes para resgatar as vítimas e um helicóptero para remover os feridos, e também foram deslocados PMs para a região a fim de reforçar a segurança. A Polícia Civil abriu inquérito para apurar os fatos.
Já segundo o MST, foram na verdade os sem-terra os alvos "de uma emboscada da PM com a ajuda de jagunços" — termo que o MST usou para chamar funcionários da Araupel. O MST diz ainda que mais de 20 pessoas ficaram feridas.
O movimento negou, ainda, que havia pessoas armadas e que os sem-terra tenham provocado a PM para então gerar o confronto.
O nome dos mortos não foi divulgado. Os corpos já foram retirados e estão em frente à delegacia da cidade. Dois feridos mais graves, baleados, foram levados para Cascavel, e outros dois para o hospital de Quedas do Iguaçu.
Sobre as críticas do MST, a Secretaria da Segurança Pública diz que a remoção dos feridos foi ágil, com ajuda de helicóptero.
Em nota, o comando nacional do MST informou que não se sabe o número exato de mortos e feridos, “pois a Polícia Militar estaria impedindo a aproximação de integrantes do Movimento no local”. Porém, integrantes do movimento na região falam em nove vítimas.
Segundo o dirigente nacional do MST, Gilmar Mauro, dirigentes do MST foram impedidos pela PM de chegar ao local do conflito. “Vamos aguardar a apuração, mas essas mortes preocupam muito, pois estão em consonância com outras ações contra o movimento. Estamos no mês do massacre de Eldorado dos Carajás (a morte, pela Polícia Militar, de 19 sem-terra na cidade do Pará, em 1996) e estão ocorrendo outras ações semelhantes, como o ataque a um acampamento nosso por pistoleiros em Rondônia e o assassinato de um sem-terra na Paraíba.” Ele disse que o MST vai se posicionar oficialmente assim que tiver mais informações sobre o caso.
Desde o massacre no Pará, em 1996, o MST se mobiliza anualmente no movimento "Abril Vermelho".

Histórico — O confronto entre policiais e integrantes do MST ocorreu próximo de uma  área pertencente a empresa Araupel, O movimento mantém no local 2.500 famílias, cerca de 7 mil pessoas. A empresa vem sofrendo uma pressão dos sem-terra desde a primeira ocupação de terra em 1996 (Pinhal Ralo). Desde então, boa parte da fazenda foi desapropriada para a reforma agrária.
Em julho de 2014, a fazenda de reflorestamento da empresa foi invadida por centenas de sem-terra. Desde então, o clima é tenso na região.
O conflito divide a cidade de Quedas do Iguaçu, município de cerca de 32 mil habitantes. A empresa Araupel emprega 1.200 funcionários.
Em outubro do ano passado, o comércio fechou as portas e houve uma manifestação com cerca de 10 mil pessoas, segundo a PM, contrários à presença do MST na área.
Segundo funcionários, havia na época equipes paradas por falta de matéria-prima, já que os trabalhadores não conseguiam chegar até o local para o corte de madeira. A associação comercial da cidade reclamava, na ocasião, de queda nas vendas nas lojas.
O conflito na área ganhou destaque nacional em março, quando, segundo a Araupel, 1,2 milhão de mudas de pinos foram destruídas por mulheres integrantes do MST, em ato do Dia Internacional da Mulher. O prejuízo estimado pela empresa foi de R$ 5 milhões. A Araupel calcula já ter prejuízos de R$ 35 milhões desde que o acampamento do MST foi montado.

A reportagem procurou a Araupel, mas a assessoria de imprensa afirmou que a empresa não se pronunciaria sobre a versão apresentada pelo MST.

A AGU (Advocacia-Geral da União) e o Incra (órgão federal que responde pelo processo de reforma agrária) haviam entrado na Justiça com pedido de nulidade dos títulos que a empresa Araupel tem sobre a área. Uma das ações foi julgada procedente pela Justiça Federal, mas a empresa recorreu e a sentença de primeira instância tornou-se sem valor até que recursos sejam julgados em esferas superiores.
Segundo o advogado da Araupel, Leandro Salomão, no mês passado o TRF 4ª região (Tribunal Regional Federal), órgão de segunda instância, suspendeu os efeitos da primeira decisão, apontando que os títulos são válidos e que a propriedade pertence à Araupel. AGU e Incra, então, recorreram e o último recurso está ainda para ser julgado pelo mesmo TRF, possivelmente até o final deste mês.




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