Tóxico, gás de buzina vira moda no interior de São Paulo
Vendido em qualquer loja da esquina por R$ 10, o gás de buzina virou
"febre" entre os jovens de classe média do interior de São Paulo.
Criada para fazer barulho em eventos esportivos, a buzina em questão é
um tubo de aerossol com uma corneta e contém butano e propano, gases
tóxicos derivados do petróleo. Quando inalada, a substância reduz a
circulação de oxigênio no cérebro, provocando tontura, euforia e
alucinações.
"Tem gente usando o gás em festas, baile de formatura e em reuniões em
condomínios fechados", afirma o delegado Renato Puppo, de São José do
Rio Preto (a 438 km de São Paulo). Ele diz que passou a encontrar o
produto "com frequência" desde o final do ano passado.
Puppo é o responsável pelas investigações da morte da universitária
Maria Luiza Perassolo, de 18 anos, na semana passada. Ela teve uma
parada cardiorrespiratória após inalar o gás com amigos em um condomínio
fechado.
Meses antes, um estudante de medicina também morreu após usar o gás em Fernandópolis, cidade vizinha.
Para especialistas, a buzina virou uma opção acessível para jovens que
buscam sensações semelhantes às provocadas por drogas ilícitas.
Mas os riscos de overdose são maiores, explica o psiquiatra e professor
da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) Ronaldo Laranjeira,
porque é difícil controlar a quantidade por via respiratória.
Além disso, a cocaína e o ecstasy, por exemplo, produzem efeitos mais
duradouros. No caso da buzina, as sensações duram segundos, então a
chance de o usuário inalar o gás repetidamente é maior.
"Os maiores riscos são de infarto, por causa da ação do propano no
coração, e de danos cerebrais, como redução da memória ou da capacidade
de aprendizado, causados pela falta de oxigênio", diz a professora
Danielle de Oliveira, presidente da Sociedade Brasileira de Toxicologia.
Danielle lembra que o uso do gás como droga não é novo, mas afirma que
os casos aumentaram.
SENSAÇÃO DE LOUCURA — "É um grau muito rápido o que a buzina te dá. É
tipo loló [espécie de lança-perfume], mas mais fraco. Dá aquela sensação
de 'loucura' por uns dez segundos e depois passa", afirma uma
universitária de São Carlos.
Para Laranjeira, o gás de buzina e os solventes são consideradas drogas
de iniciação. "Você não precisa ir na 'boca' para comprar, e o solvente
soa mais light do que a cocaína, como se fosse uma coisa de baixo risco.
Parece só um gás de efeito curto."
Segundo o psiquiatra, os casos noticiados recentemente, de
universitários de classe média, refletem uma mudança no perfil de
usuários de solventes. Ele lembra que a cola de sapateiro, por exemplo,
nas décadas de 80 e 90, era usada por jovens de classe mais baixa.
A visibilidade que a buzina ganhou na época da Copa também contribuiu
para o aumento. Alguns jovens contam que, apesar de não terem o hábito,
inalaram o gás "de bobeira" durante o Mundial, porque estava "chovendo
buzina". "Achei que era a melhor coisa a se fazer com a buzina depois do
7x1", diz uma arquiteta do Rio de 28 anos.
CIDADE MOBILIZADA — Em Rio Preto, a morte de Maria Luiza mobilizou a
cidade. Segundo Puppo, comerciantes estão retirando o produto das
prateleiras.
Na quinta-feira (31.mar.2016), os vereadores da Câmara Municipal
aprovaram, por unanimidade, um projeto de lei que proíbe a
comercialização e o uso da buzina.
A proposta foi feita em janeiro, depois que outra estudante de 17 anos
teve uma parada cardíaca e entrou em coma em decorrência do uso do gás.
Ela sobreviveu.
No âmbito nacional, um projeto que quer proibir o produto tramita na Câmara desde 2008.
Em Goiás, a venda da buzina é ilegal desde 2012, quando um jovem morreu após inalar o conteúdo de um frasco inteiro.
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