Reconciliação com Padre Cícero
indica mudança de rumo da Igreja Católica
indica mudança de rumo da Igreja Católica
Ainda não foram divulgados todos os detalhes sobre o processo de
reconciliação do padre Cícero Romão Batista (1844-1934) com a Igreja
Católica, mas o que veio a público até agora vale quase como um estudo
de caso sobre os rumos do catolicismo sob o comando do papa Francisco.
A afirmação pode parecer estranha para quem não é religioso, mas o fato é
que a Igreja moderna costuma ter uma atitude bastante cética em relação
a pregadores carismáticos, imagens "milagreiras" de santos e outros
elementos da religiosidade popular.
É comum que a hierarquia católica enxergue esse tipo de fenômeno como
incentivo à superstição ou, na melhor das hipóteses, distrações que
atrapalham a devoção à figura de Jesus Cristo, a qual deveria ocupar o
primeiro lugar para os fiéis.
Apesar de sua fama de progressista e modernizador, porém, Francisco
sempre foi um entusiasta das formas populares de devoção católica na
América Latina.
Esse fato é ressaltado por vários de seus biógrafos, como o jornalista
britânico Austen Ivereigh — era costume do então padre Jorge Bergoglio
levar seminaristas para auxiliar comunidades carentes nas favelas de
Buenos Aires e, ao mesmo tempo, participar de procissões, novenas e
outras formas tradicionais de veneração à Virgem Maria e aos santos.
DE APARECIDA AO SERTÃO
Já como arcebispo de Buenos Aires e cardeal, em 2007, Bergoglio
coordenou o encontro dos bispos latino-americanos em Aparecida, ao qual
compareceu o papa Bento 16 e que produziu um documento oficial
ressaltando a importância da religiosidade popular.
Aliás, trechos desse documento são citados como argumentos em favor de
padre Cícero na carta que sacramentou a reconciliação do sacerdote com a
hierarquia católica, enviada por Pietro Parolin, atual secretário de
Estado do Vaticano, para o bispo da diocese de Crato (CE), dom Fernando
Panico.
O conteúdo completo da carta só será divulgado no próximo dia
20.dez.2015, mas outras palavras-chave do pontificado de Francisco
também aparecem em outros trechos da mensagem divulgados pela diocese do
Crato. "No momento em que a Igreja inteira é convidada pelo papa a uma
atitude de saída, ao encontro das periferias existenciais, a atitude do
padre Cícero em acolher a todos, especialmente aos pobres e sofredores,
constitui um sinal importante e atual", escreve Parolin.
Além disso, o papa acaba de decretar um Ano da Misericórdia, período
dedicado, na tradição católica, a uma espécie de anistia das dívidas
espirituais dos fiéis. Padre Cícero parece estar incluído nessa grande
"moratória". Provavelmente é prematuro pensar em beatificação e
canonização do sacerdote, já que a carta alude delicadamente aos "pontos
mais controversos" da biografia dele.
É preciso levar em conta ainda que o Nordeste pode ser considerado um
dos baluartes da fé católica num país cada vez mais evangélico.
De acordo com dados da Datafolha, só 57% dos brasileiros ainda declaram
que o catolicismo é sua religião, mas esse número sobe para 72% nos
Estados nordestinos. Faz sentido, portanto, que a Igreja busque
ressaltar os aspectos positivos de uma das principais manifestações
populares do catolicismo na região.
DOM HÉLDER CÂMARA
A Comissão da Verdade de Pernambuco apresentará na sexta-feira,
18.dez.2015, no Recife, um dossiê com documentos inéditos que, segundo o
colegiado, comprovam perseguição a d. Helder Câmara durante a ditadura
militar.
D. Helder Câmara foi grande defensor dos direitos humanos no regime dos
generais que se prolongou de 1964 a 1985. Durante longos anos ele agiu
destemidamente ao lado de militantes que foram alvo da polícia política e
atirado aos porões.
O dossiê da Comissão da Verdade denuncia que a ditadura também atuou
para impedir que se atribuísse o Prêmio Nobel da Paz a Dom Hélder Câmara
— religioso que se insurgiu contra os porões do governo militar.
Nascido no Ceará, em 1909, d. Hélder foi um dos criadores da Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), tendo como modelo de Igreja a que
age primeiramente pelos pobres. Dizia que servir ao próximo era a
melhor maneira de servir a Deus. Morreu em agosto de 1999, no Recife,
aos 90 anos.
O dossiê de 229 páginas é intitulado Caderno Especial “Prêmio Nobel da
Paz: A atuação da Ditadura Militar Brasileira contra a indicação de Dom
Helder Câmara”. O trabalho é resultado de uma das relatorias temáticas
da Comissão da Verdade de Pernambuco que investiga as “Violações de
Direitos Humanos nos Meios Religiosos”.
1968, Dom Hélder Câmara, arcebispo emérito de Olinda e Recife |
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