quarta-feira, 16 de dezembro de 2015




Reconciliação com Padre Cícero
indica mudança de rumo da Igreja Católica



Ainda não foram divulgados todos os detalhes sobre o processo de reconciliação do padre Cícero Romão Batista (1844-1934) com a Igreja Católica, mas o que veio a público até agora vale quase como um estudo de caso sobre os rumos do catolicismo sob o comando do papa Francisco.
A afirmação pode parecer estranha para quem não é religioso, mas o fato é que a Igreja moderna costuma ter uma atitude bastante cética em relação a pregadores carismáticos, imagens "milagreiras" de santos e outros elementos da religiosidade popular.
É comum que a hierarquia católica enxergue esse tipo de fenômeno como incentivo à superstição ou, na melhor das hipóteses, distrações que atrapalham a devoção à figura de Jesus Cristo, a qual deveria ocupar o primeiro lugar para os fiéis.
Apesar de sua fama de progressista e modernizador, porém, Francisco sempre foi um entusiasta das formas populares de devoção católica na América Latina.
Esse fato é ressaltado por vários de seus biógrafos, como o jornalista britânico Austen Ivereigh — era costume do então padre Jorge Bergoglio levar seminaristas para auxiliar comunidades carentes nas favelas de Buenos Aires e, ao mesmo tempo, participar de procissões, novenas e outras formas tradicionais de veneração à Virgem Maria e aos santos.


DE APARECIDA AO SERTÃO
Já como arcebispo de Buenos Aires e cardeal, em 2007, Bergoglio coordenou o encontro dos bispos latino-americanos em Aparecida, ao qual compareceu o papa Bento 16 e que produziu um documento oficial ressaltando a importância da religiosidade popular.
Aliás, trechos desse documento são citados como argumentos em favor de padre Cícero na carta que sacramentou a reconciliação do sacerdote com a hierarquia católica, enviada por Pietro Parolin, atual secretário de Estado do Vaticano, para o bispo da diocese de Crato (CE), dom Fernando Panico.
O conteúdo completo da carta só será divulgado no próximo dia 20.dez.2015, mas outras palavras-chave do pontificado de Francisco também aparecem em outros trechos da mensagem divulgados pela diocese do Crato. "No momento em que a Igreja inteira é convidada pelo papa a uma atitude de saída, ao encontro das periferias existenciais, a atitude do padre Cícero em acolher a todos, especialmente aos pobres e sofredores, constitui um sinal importante e atual", escreve Parolin.
Além disso, o papa acaba de decretar um Ano da Misericórdia, período dedicado, na tradição católica, a uma espécie de anistia das dívidas espirituais dos fiéis. Padre Cícero parece estar incluído nessa grande "moratória". Provavelmente é prematuro pensar em beatificação e canonização do sacerdote, já que a carta alude delicadamente aos "pontos mais controversos" da biografia dele.
É preciso levar em conta ainda que o Nordeste pode ser considerado um dos baluartes da fé católica num país cada vez mais evangélico.
De acordo com dados da Datafolha, só 57% dos brasileiros ainda declaram que o catolicismo é sua religião, mas esse número sobe para 72% nos Estados nordestinos. Faz sentido, portanto, que a Igreja busque ressaltar os aspectos positivos de uma das principais manifestações populares do catolicismo na região.



DOM HÉLDER CÂMARA
A Comissão da Verdade de Pernambuco apresentará na sexta-feira, 18.dez.2015, no Recife, um dossiê com documentos inéditos que, segundo o colegiado, comprovam perseguição a d. Helder Câmara durante a ditadura militar.
D. Helder Câmara foi grande defensor dos direitos humanos no regime dos generais que se prolongou de 1964 a 1985. Durante longos anos ele agiu destemidamente ao lado de militantes que foram alvo da polícia política e atirado aos porões.
O dossiê da Comissão da Verdade denuncia que a ditadura também atuou para impedir que se atribuísse o Prêmio Nobel da Paz a Dom Hélder Câmara — religioso que se insurgiu contra os porões do governo militar.
Nascido no Ceará, em 1909, d. Hélder foi um dos criadores da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), tendo como modelo de Igreja a que age primeiramente pelos pobres. Dizia que servir ao próximo era a melhor maneira de servir a Deus. Morreu em agosto de 1999, no Recife, aos 90 anos.
O dossiê de 229 páginas é intitulado Caderno Especial “Prêmio Nobel da Paz: A atuação da Ditadura Militar Brasileira contra a indicação de Dom Helder Câmara”. O trabalho é resultado de uma das relatorias temáticas da Comissão da Verdade de Pernambuco que investiga as “Violações de Direitos Humanos nos Meios Religiosos”.



1968, Dom Hélder Câmara, arcebispo emérito de Olinda e Recife





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