A recessão
A crise econômica vai se agravar devido ao freio nos investimentos e
no consumo.
A abertura de um processo de impeachment contra a presidente Dilma
Rousseff vai trazer mais incertezas para a economia, principalmente
se este for prolongado. Enquanto impera a dúvida, as famílias vão
sofrer mais com desemprego, queda salarial e crédito mais escasso —
em ambiente incerto, ninguém contrata, ninguém compra.
A recessão deve ajudar a conter a alta de preços em 2016, portanto a
inflação deve subir menos no ano que vem. Este ano, vai ultrapassar
10%. Mesmo com a oscilação na cotação do dólar causada pelo quadro
político turbulento, o repasse dessa alta da moeda americana já está
contido pela retração na atividade econômica.
O Banco Central (BC) já avisou que pode subir ainda mais os juros
básicos, hoje em 14,25% ao ano. Portanto, o crédito que poderia
ajudar a compor o orçamento das famílias, como tem acontecido nos
últimos anos, não é solução.
Clique para ampliar |
Ao se comparar o momento econômico do processo de impeachment do
presidente Fernando Collor, em 1992, e o da presidente Dilma
Rousseff atualmente, constata-se que a economia ganhou solidez e
instituições mais fortes, afirmam especialistas. É um outro Brasil.
A divergência surge ao se pesar o tamanho da crise. Uns avaliam que
no tempo de Collor a população brasileira sofreu mais, outros dizem
que agora a recessão é mais profunda. Diferença clara entre os dois
períodos é a inflação. Em 1992, os preços subiram 1.119,10%, dois
anos após o confisco que provocou recessão de 4,35% em 1990. Este
ano, mesmo com o tarifaço próximo de 50% na energia elétrica e dos
aumentos da gasolina e do transporte público, a inflação está em
9,93% e a recessão deve ficar entre 3,5% e 4%. Em 1992, a economia
recuou 0,5%.
Clique para ampliar |
Teresa Ter-Minassian: “O problema maior hoje em dia são as finanças públicas e a credibilidade” |
A economista italiana Teresa Ter-Minassian conta que, como fã do
Brasil, vê a retração da economia com tristeza. Atual consultora do
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e ex-diretora do
Departamento Fiscal do Fundo Monetário Internacional, ela chefiou a
missão brasileira do FMI entre 1997 e 2001 e reconhece que o Brasil
terá mais dificuldade para sair da atual crise do que em 1999.
Como a senhora viu o resultado do PIB brasileiro?
Esperava um resultado negativo, mas os números são um
pouco piores do que eu previa. O que é muito desolador é a
composição da queda: há uma redução muito forte nos
investimentos, que deveriam ser a esperança para o futuro do
país. E as exportações caíram em termos reais. É difícil, para o
próximo ano, alguma recuperação no consumo das famílias, que
ainda enfrentarão dívidas elevadas, juros altos e perspectivas
ruins para o mercado de trabalho. A única esperança seria uma
recuperação do investimento, se o quadro político melhorar. Não
sou a primeira a dizer isso, mas, com tanta incerteza sobre a
continuidade do governo e o rumo da política econômica, é muito
difícil conseguir uma recuperação do investimento.
A abertura do processo de impeachment da presidente Dilma
Rousseff pode levar o Brasil a perder o grau de investimento e
piorar o cenário econômico?
Os acontecimentos políticos não são um fator determinante
para as agências de rating. Elas olham variáveis econômicas,
como crescimento, inflação, balança de pagamentos, déficit
orçamentário, dívidas pública e externa. Mas essa decisão pode
ser influenciada pela evolução e as perspectivas políticas e
sociais. Além disso, na medida em que um processo de impeachment
seja prolongado e controverso, aumenta muito a incerteza,
afetando a economia de forma adversa e reduzindo a confiança das
famílias. Isso torna ainda mais difícil para o governo tomar as
medidas de ajuste necessárias e realizar as reformas, o que pode
contribuir para a piora da economia e, indiretamente, para um
rebaixamento do rating soberano do país.
O Brasil está em recessão ou em depressão?
Uma queda do PIB de 3%, que pode ser ainda maior neste ano
dependendo do quarto trimestre, claramente, é uma recessão
forte. Depressão só ocorre com um período muito prolongado de
recessão. Ainda não estamos lá, e oxalá não vamos estar, embora
acredite que será difícil evitar dois anos de queda do PIB.
A recessão em 2016 será muito forte?
Não vejo, da parte de nenhum analista, qualquer otimismo
no futuro próximo, ao menos para 2016. O ano que vem depende
muito do contexto político e social. Se as incertezas sobre o
quadro político continuarem, vai ser difícil para as empresas
tomarem decisões de investir, mesmo se houver, como há, boas
perspectivas para obter lucros a médio prazo, quando a economia
começar a se recuperar.
A senhora acompanhou de perto o Brasil na turbulência do
fim dos anos 1990 ...
A situação em 1999 era muito diferente. Os problemas
macroeconômicos eram menores: havia um problema de balanço de
pagamentos, mas havia uma política fiscal e de orçamento
razoavelmente restritiva e ajustada, com uma política monetária
forte e crível com a nova gestão do Banco Central (Armínio
Fraga) e com a desvalorização muito forte do câmbio. Os agentes
econômicos estavam mais otimistas que no momento atual. Também
havia um problema no governo, mas Fernando Henrique nunca chegou
aos níveis de desaprovação de Dilma. E o entorno político era
mais estável que agora. Joaquim Levy está encontrando
resistência por todas as partes, e isso não ajuda a criar
confiança nos agentes econômicos.
De certa maneira, então, a crise de agora é pior que a de
1999? Mesmo com as reservas internacionais, é mais difícil para
o Brasil sair da crise agora do que daquela vez?
Eu acho que sim, porque os problemas fundamentais do
Brasil hoje em dia não são de falta de liquidez internacional,
como em 1998/99, pois o câmbio mais ou menos flutuante resolve
isso. E temos uma política monetária mais institucionalizada que
em 1999, com metas de inflação. O problema maior hoje em dia são
as finanças públicas e a credibilidade sobre a capacidade de
manejar a economia.
Levy não está conseguindo dominar a economia?
Não há São Sebastião. Nenhuma pessoa sozinha pode fazer
milagres. Levy está enfatizando a necessidade do ajuste a curto
prazo para criar uma situação macroeconômica mais controlável.
Eu concordo com o que ele está fazendo, mas nem todo mundo
concorda e o apoia. Há uma incerteza política institucional
neste momento no Brasil que não permite que as políticas
econômicas sejam implementadas. O Brasil precisa ter uma
política de gastos mais racional, menos engessada e com maior
eficiência. E precisa de reformas estruturais, que necessitam de
um mínimo de coesão política para serem implementadas.
O que o Brasil precisa fazer para sair da crise? O setor
exportador pode ser motor de crescimento?
Eu acho que as exportações vão se recuperar se a política
de câmbio continuar razoavelmente flexível. Mas as exportações
são parcela bastante pequena da demanda no Brasil, um país ainda
muito fechado, e não serão o motor da economia. Para mim é
fundamental que alguns componentes da demanda interna,
principalmente os investimentos, se recuperem ao longo de 2016.
Continuo dizendo que isso depende muito do contexto político e
da capacidade do governo de fazer reformas estruturais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário