quarta-feira, 16 de dezembro de 2015




Gargalos emperram o avanço do Brasil no comércio exterior — questões burocráticas, carência em infraestrutura e mentalidade protecionista explicam a presença tímida do País no cenário de competição internacional



O Brasil tem um longo caminho a percorrer para se inserir na cadeia produtiva global. Além da necessidade de buscar parcerias vantajosas, há problemas internos a resolver para que o País avance no sentido de uma balança comercial favorável. Barreiras tarifárias, deficiências em infraestrutura e entraves burocráticos.
O professor de economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Lucas Ferraz aponta a infraestrutura como o principal gargalo do Brasil nesse campo.
Ele chama a atenção para o atraso no embarque de produtos nos portos brasileiros. As mercadorias que esperam liberação por dias, ele diz, têm o custo equivalente a um imposto adicional de 13% em seu valor de venda. No caso do que é importado, a conta chega a 14,2%. Ferraz lembrou um estudo da FGV que mostra que se esses atrasos fossem reduzidos em 40%, haveria uma economia de US$ 33 bilhões por ano, considerando os efeitos da burocracia sobre os custos das empresas. Quando se fala em manufaturas, o atraso pode representar perdas por volta de 30% para os exportadores e importadores.
“Um dia de atraso pode significar um gasto de 0,6% a 2,1% da carga comercializada, sendo 60% maior no caso de produtos manufaturados”, diz Ferraz.
Uma iniciativa do governo federal em direção à facilitação do comércio pretende reduzir em 40% o tempo gasto em trâmites e, para isso, centraliza o processo de exportação no Portal do Comércio Exterior. A aprovação que leva 13 dias no padrão atual deve ser feita em oito, conforme explica Ana Junqueira Pessoa, do Departamento de Competitividade no Comércio Exterior, do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).
“São prazos compatíveis com a média da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Isso significa que o Brasil estaria em outro patamar em termos de agilidade no fluxo comercial”, afirma. Ela estima que a redução no prazo de exportação diminua pela metade o tempo em que as cargas ficam nos portos, o que duplicaria a capacidade portuária brasileira.


Sétima economia do mundo, Brasil é apenas o 25ª exportador,
segundo ranking da Organização Mundial do Comércio (OMC)


Política. Para o coordenador-geral do Grupo de Análise de Conjuntura Internacional (Gacint) do Instituto de Relações Internacionais da USP, Ricardo Sennes, o maior impacto dos problemas que envolvem o comércio exterior está justamente na tomada de decisão — exportar ou não — pelo empresário.
O trâmite prolongado provoca, de acordo com ele, a desistência antes mesmo de começar. “Ao privilegiar uma lógica burocrática, nós estamos reforçando a ideia de apostar no sistema protecionista”, analisa Sennes, que faz uma avaliação política das práticas de comércio exterior locais. “É preciso avaliar o que queremos atrair como processo produtivo. Nós não estamos utilizando o potencial de atração de escala doméstica para trazer plataformas de nível tecnológico mais alto.”
Diretor de relações internacionais e comércio exterior da Fiesp, Thomas Zanotto concorda com o ponto de vista de Sennes. Para ele, as recentes alianças voltadas à exportação, como o Tratado Transpacífico não dão margem para muita discussão.
“O fechamento da economia brasileira deixou de ser uma opção”, diz. Para ele, é inaceitável fugir de uma aproximação com os países que compõem os novos blocos comerciais. “Seria uma forma de tirar o atraso que tivemos nos últimos anos nesse campo. O Brasil já tem legislação tão ou mais avançada em relação ao que é exigido por esses acordos”, analisa.
Protagonismo. O presidente do conselho curador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais, Rafael Benke, concorda com a tese de Zanotto. “A aliança do Pacífico cobre um quarto do comércio internacional”, pondera. Para ele, não há protagonismo brasileiro à altura do comércio exterior.
“O Brasil tem uma desproporcionalidade em relação ao tamanho da sua economia e o fluxo de comércio externo”, afirma Rafael Benke.


Comércio global deve sair do Atlântico para o Pacífico
Acordo que envolve 12 países,
entre eles Estados Unidos e ‘Tigres Asiáticos’,
é tido como prenuncio de nova geografia econômica


O novo desafio aos interesses comerciais do Brasil tem nome e direção definidos: o Tratado Transpacífico (TTP). Liderado pelos Estados Unidos e com a participação de outros onze países, o maior bloco de livre comércio do mundo movimenta 40% do PIB global e 33% do comércio mundial. Oficializado em outubro, vem fomentando o diálogo entre as maiores potências do planeta e, no que tange aos interesses das empresas locais, tem um porém: não congrega o Brasil.
Conforme analisa o professor de relações internacionais da ESPM, José Luiz Pimenta Junior, o novo bloco deve deslocar o centro comercial mundial, até então concentrado entre Estados Unidos e Europa, para os mercados banhados pelo Pacífico. “Os Estados Unidos calculam que o próximo boom de consumo vai vir da Ásia e isso já está acontecendo. Por isso, mudaram o pivô da economia, saíram do Oceano Atlântico.”
O especialista avalia que esse movimento pode causar uma concentração maior de trocas comerciais entre os países do TTP, excluindo o Brasil. Estados Unidos, Japão, Austrália e, entre outros, vizinhos como Chile e Peru tendem, de acordo com Pimenta, a estreitar cada vez mais o laço para transferência de matérias-primas, fontes energéticas e manufaturas.
“Diante desse cenário, como o Brasil se posiciona? A desculpa de não participar do Tratado porque não tem saída para o Pacífico não cola. Há uma mudança em curso”, explica. “Vejo um provável deslocamento do volume de exportações hoje, que é de U$S 54 bilhões para os países do Transpacífico, para outros países da aliança”, calcula José Luiz Pimenta.
Essa tendência já é vista em números do Banco Central. Desde o ano passado, o bloco do Pacífico vem diminuindo as importações do Brasil. Em 2011, esses quatro países importaram US$ 14,2 bilhões de produtos nacionais. No ano passado, o total foi de US$ 12,8 bilhões.


Tratado Transpacífico concentra países
que detém 40% do PIB mundial


Abertura. A saída para quem ficou de fora do TTP, em um primeiro momento, pode parecer firmar acordos bilaterais com os países envolvidos. Porém, o especialista em relações internacionais do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (IREI-Unb), Carlos Pio, aponta para a abertura unilateral do Brasil como uma medida necessária e eficiente para ampliar as possibilidades do mercado de exportação e importação. A saída envolveria, de acordo com Pio, a reavaliação do sistema tarifário brasileiro, considerado por ele como protecionista.
“Desde que foi criada a Tarifa Externa Comum (TEC), nos anos 1990, o mundo continuou se abrindo, mas a tarifa do Brasil continuou parada. Temos a TEC mais liberal da nossa história, mas ainda sim é protecionista”, pontua o especialista.
Pio se refere à tarifa de exportação estabelecida como padrão para os países integrantes do Mercosul, que é também usada como parâmetro para as trocas comerciais com outros países pelo mundo.
“Um acordo bilateral demora, para o Brasil, até dez anos para sair do papel. O País precisa de uma abertura mais rápida do comércio. A saída unilateral traria o choque estrutural que viabiliza uma real abertura comercial”, analisa Pio.






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