segunda-feira, 21 de dezembro de 2015





Crise leva empresas a cancelarem ou adiarem novos projetos





Sem fôlego: Setor siderúrgico tem R$ 8 bilhões em investimentos suspensos


A crise econômica amplificada pelas dificuldades políticas do governo está fazendo com que a iniciativa privada engavete cada vez mais projetos de investimento no país. Em quatro setores, que têm peso de aproximadamente 20% no Produto Interno Bruto (PIB), os projetos cancelados, ou adiados, somam R$ 74,5 bilhões entre 2014 e 2015. Os mais novos episódios da crise — a perda do grau de investimento e a troca de comando no ministério da Fazenda — ameaçam também desestimular a entrada de recursos estrangeiros que são aplicados na produção. Desde janeiro, o investimento externo direto no Brasil soma quase US$ 55 bilhões.
Pior é que essa paradeira tem um custo para o mercado de trabalho brasileiro, que já vem perdendo fôlego mês a mês. Um estudo do International Finance Corporation (IFC), entidade ligada ao Banco Mundial, estima que, a cada US$ 1 bilhão investido em grandes projetos na América Latina, são gerados 40 mil novas vagas de emprego. Por este cálculo, o Brasil está perdendo cerca de 3 milhões de postos de trabalho com a postergação desses aportes.
Entre os setores, o que mais está engavetando projetos é o químico e petroquímico. Cálculo da Abiquim, entidade que representa as indústrias do segmento, estima que R$ 48 bilhões em novos investimentos previstos desde 2014 não saíram do papel. São novas plantas na área de fertilizantes, matérias-primas e insumos intermediários, que estariam prontas em 2017. Além de não criar novas vagas, pela primeira vez nos últimos 25 anos o setor está fechando postos de trabalho. Em 2015, devem ser demitidos 4 mil funcionários, 1% da força total de trabalho.
— A incerteza na economia paralisa o investimento, mas o setor tem problemas estruturais. O custo da energia é 40% maior do que nos EUA e produzir aqui torna-se mais caro. Além disso, importa-se insumos químicos e petroquímicos com alíquota zero — reclama Fernando Figueiredo, presidente da Abiquim.

IMPACTO NA CRISE DA PETROBRAS
Em outubro passado, a Braskem cancelou a construção na Bahia da primeira fábrica de plásticos de alta resistência do país, que ergueria em parceria com a alemã Styrolution. O valor era de US$ 200 milhões. De acordo com Figueiredo, também cancelaram projetos Vale e Galvani, mas o caso mais emblemático é o da Petrobras.
Mais da metade dos investimentos previstos no setor, cerca de R$ 25 bilhões, seriam feitos pela petrolífera. Procurada, a estatal informou que reduziu seu plano de investimentos totais de US$ 28 bilhões para US$ 25 bilhões este ano e de US$ 27 bilhões para US$ 19 bilhões em 2016. Em nota, a petrolífera esclareceu que a alta do câmbio e a queda no preço do barril do petróleo motivaram a decisão.
— Mas a empresa também está no centro do furacão provocado pelas investigações da Lava-Jato, e teve o caixa prejudicado pela decisão do governo de não reajustar o preço dos combustíveis durante um longo período — diz um analista de mercado que acompanha a empresa.
No setor de siderurgia, os produtores de aço, representados pelo Instituto do Aço, estão engavetando o equivalente a R$ 8 bilhões em investimentos. Marco Polo de Mello Lopes, presidente executivo da entidade, diz que o setor há poucos anos representava 25% do PIB e hoje está abaixo de 10%. Uma das grandes siderúrgicas que reduziu o volume de aportes é a CSN. A empresa informou que o recuo foi de 41% em 2015 na comparação com 2014. Este ano, o total investido chegará a R$ 1,3 bilhão.
— Temos uma perda de competitividade sistêmica — disse Marco Polo, acrescentando que poderiam ser criados pelo menos 7,7 mil empregos se os novos investimentos saíssem do papel.
A crise na economia afeta a decisão de investimento, mas a incerteza política também prejudica a expectativa do empresariado, diz o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale.
— Se a instabilidade política continuar em um cenário que a presidente Dilma Rousseff segue fraca até o final do mandato, a paralisia de investimento continuará forte — prevê Vale, lembrando que o nível de utilização da capacidade instalada da indústria está baixo “e não faz sentido a indústria pensar em investir agora”.
A expectativa da MB é de queda de quase 8% no PIB industrial neste ano e de 4,5% no ano que vem. Com esse resultado, diz ele, a indústria deve regredir aos níveis de 2002.

EMPREGO NO PATAMAR DE 2009
A Abinee, que representa a indústria eletroeletrônica, contabiliza R$ 500 milhões em investimentos engavetados neste ano. O montante equivale a 12,5% dos aportes totais previstos pelo segmento (R$ 4 bilhões). Humberto Barbato, presidente da entidade, cita o recuo de 10% em termos reais no faturamento do setor em 2015 para justificar esse encolhimento. O nível de emprego, diz Barbato, está voltando ao patamar de 2009, o que significa um corte de 38 mil postos de trabalho neste ano.
— Não tem por que investir. A situação está muito ruim e não vejo no horizonte chance de melhora — afirma.
No setor sucroalcooleiro, calcula-se que pelo menos R$ 18 bilhões que deveriam ser aportados anualmente para reforma de usinas, compra de novas máquinas e renovação do canavial, não estão saindo do papel.
— E se o Brasil quiser atingir a meta de produzir 50 bilhões de litros de etanol até 2030, serão necessários mais R$ 40 bilhões aplicados em novas plantas até lá — diz Antonio de Pádua, diretor técnico da Unica, entidade que representa o setor sucroalcooleiro, lembrando que falta também uma política de longo prazo para o álcool para estimular o setor.

QUEDA DE 25% EM MÁQUINAS
Um dos termômetros que mostra a retração do investimento na economia é a compra de bens de capital. São caminhões, máquinas e equipamentos pesados para novas unidades industriais ou renovação das plantas. De acordo com o economista da consultoria Tendências, Felipe Beraldi, a demanda por bens de capital encolheu nos três primeiros trimestres do ano. A retração foi de 8,8% de janeiro a março; de 14,2% no segundo trimestre e de 5,7% entre julho, agosto e setembro.
— No ano, nossa estimativa é de uma queda de 25,3% por bens de capital em relação a 2014. Neste período de incerteza, o empresário tende a represar esse investimento — diz Beraldi.
No caso do investimento estrangeiro voltado para a produção, técnicos da equipe econômica temem que a indefinição sobre o futuro político do Brasil afete a única coisa que realmente vai bem na economia: as contas externas.
— Pode haver impacto, mas até agora ainda não tem afetado — frisou a fonte.
Os US$ 55 bilhões que chegaram ao país nos dez primeiros meses do ano cobriram o déficit das contas externas brasileiras acumulado até agora, além de aumentar a capacidade produtiva das fábricas por aqui. A incerteza política preocupa.
— Pode ocorrer uma redução no horizonte mais longo, se esses problemas persistirem. Mas, se for uma solução rápida, para qualquer sentido, o efeito deve ser pequeno — disse outro técnico da equipe econômica.






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