Marco Maciel: o ocaso de um
articulador discreto — vice-presidente nos dois governos FHC sofre de
Alzheimer e vive em silêncio absoluto
Aos 71 anos, Marco Maciel foi diagnosticado com mal de Alzheimer — foto de 06.10.2010 |
Em meio a uma das maiores crises da democracia recente, Marco Maciel,
único vice-presidente do período democrático vivo (Itamar Franco e José
Alencar morreram em 2011), segue alheio aos acontecimentos. Enquanto o
noticiário da televisão atualiza a situação do processo de impeachment
da presidente Dilma Rousseff e as supostas manobras do vice Michel Temer
para ocupar seu posto, Maciel cerra os olhos em frente à TV e não
expressa qualquer opinião. Aos 75 anos, o mal de Alzheimer, doença que
provoca perda de memória, retirou-lhe a vida social, o entendimento
político, o interesse pelos assuntos públicos.
— Se lembra de alguma coisa, ele não demonstra nada. Do meio do ano para
cá, ele só responde raramente, e sempre por monossílabos. Se já era
calado, agora é mais ainda. Meus filhos dizem para eu parar, mas sempre
comento com ele: “Viu o que aconteceu com a política, viu isso ou
aquilo?”, recebo de volta o silêncio — conta a mulher de Maciel, Ana
Maria, companheira de mais de meio século e responsável por comandar a
equipe de cuidadores que se reveza na atenção ao ex-vice-presidente, na
sua residência em Brasília.
Nos dois governos FHC, Maciel, em média, ficou à frente da Presidência
um dia por semana, devido às viagens do então presidente — foto de 01.01.1999 |
De estilo discreto, Maciel, em média, governou o país por um dia a cada
semana que Fernando Henrique Cardoso esteve na Presidência, entre 1995 e
2002, devido às viagens do titular. Quando não despachava como chefe de
Estado interino, gostava de ficar em seu gabinete no subsolo do Palácio
do Planalto, em estratégica posição para, literal e figurativamente,
não fazer sombra ao titular.
Sua importância para a governo tucano fica evidente pela quantidade de
menções a ele no recém-lançado diário de FHC para os dois primeiros anos
de gestão: Maciel aparece 122 vezes nas mais de 900 páginas. O então
presidente o qualificava como “coordenador político” do governo no
Congresso e não era incomum a romaria de parlamentares ao gabinete do
vice.
Peça importante na eleição de Tancredo Neves, na gestão José Sarney (na foto tomando posse ao lado de Ulysses Guimarães), Maciel chefiou a Casa Civil — foto de 15.03.1985 |
Foi Maciel quem ajudou a conter os ímpetos do então senador Antônio
Carlos Magalhães, que agia com eventual rebeldia no Congresso, e a
conter crises como o escândalo da Pasta Rosa, sobre financiamento ilegal
de campanha de aliados. Durante o regime militar, foi um entusiasta da
volta à democracia. Obcecado com o tema da reforma política, que
considerava urgente, ele não pôde acompanhar as discussões comandadas
pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) sobre o assunto no
primeiro semestre deste ano.
— Ele ainda recebe alguns poucos amigos em casa, mas fica sentado e
calado durante todo o tempo — diz Ana Maria, que já chegou a representar
o marido em eventos do DEM.
Marco Maciel atuava para debelar crises com o senador Antônio Carlos
Magalhães, que eventualmente jogava o Congresso contra o governo FHC — foto de 14.03.1996 |
Durante quase cinquenta anos, Maciel começava a rotina com a leitura de
seis jornais, que recortava e rabiscava, e partia para suas articulações
políticas. Chegava em casa tarde da noite, mas a tempo de conversar
amenidades com a mulher. Perdeu a primeira eleição aos 70 anos. Depois
da derrota, parecia abatido. Uma depressão começou a ser tratada. Já era
sinal de Alzheimer. A doença evoluiu a ponto de tirar-lhe as
iniciativas. Ana Maria precisa prestar atenção a pequenos sinais para
saber se ele está doente ou com fome.
— É uma pena que você não possa conversar com ele sobre política. Eu sei
que ele gostaria. Vivemos uma ausência de alguém que está presente —
lamenta Ana Maria.
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