Governo lança plano que permite redução de jornada de trabalho e salário
Despesas serão custeadas pelo Fundo de
Amparo ao Trabalhador (FAT), que vai complementar parte da perda
salarial; governo diz que medida é menos custosa do que pagar
seguro-desemprego
O governo anunciou um plano para evitar novas demissões na indústria,
uma tentativa clara de interromper o aumento do nível de demissões do
País e de evitar que a popularidade da presidente continue derretendo. A
equipe de Dilma Rousseff propôs que a jornada de trabalho e os salários
dos empregados sejam reduzidos em até 30% em momentos de crise ou de
queda expressiva de produção, como o que ocorre agora nos setores
automobilístico e químico. Para o empregado, no entanto, o salário será
cortado em até 15%, porque haverá uma complementação com os recursos do
Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
O Plano de Proteção ao Emprego (PPE) demorou três anos para sair do
forno e envolveu discussões com a indústria e os sindicatos. O governo
se inspirou em um programa muito semelhante ao adotado na Alemanha,
berço das indústrias automobilísticas.
O custo do programa, no entanto, não foi esclarecido, embora os
ministros tenham reforçado que é mais barato complementar o salário por
meio do FAT do que arcar com os custos do seguro-desemprego, em casos de
demissões. Na hipótese de 50 mil trabalhadores com salário de R$ 2.500
serem atendidos pelo plano, o gasto do governo será de R$ 112,5 milhões.
Esse valor é R$ 68 milhões menor do que bancar o seguro-desemprego da
mesma quantidade de trabalhadores com esse salário.
A redução da jornada e do salário precisa ser aprovada em assembleias
com os sindicatos para ser implementada. A Constituição impede a redução
de direitos trabalhistas, a não ser por acordos desse tipo. O limite
por trabalhador para a contrapartida do FAT será de R$ 900,84 (o
correspondente a 65% da parcela máxima que o fundo paga de
seguro-desemprego). O salário máximo para ser contemplado por esse plano
é de R$ 6 mil.
Um trabalhador que recebe R$ 2.500 de salário, por exemplo, e entrar no
PPE, passaria a ganhar R$ 2.125, dos quais R$ 1.750 pagos pela empresa e
R$ 375 bancado com recursos do FAT, fundo responsável pelo pagamento do
seguro-desemprego e do abono salarial. Os setores que podem aderir ao
PPE por seis meses - prorrogáveis por mais seis - serão definidos por um
comitê formado por representantes de cinco ministérios. Nessa primeira
etapa, o programa terá validade até dezembro de 2016.
Como contrapartida, as empresas que aderirem ao PPE não poderão demitir
os funcionários que tiveram sua jornada de trabalho reduzida enquanto o
plano estiver em vigor. Ao fim do plano, também serão proibidos cortes
dessas vagas por prazo equivalente a um terço do período de adesão. Por
exemplo: se a adesão da empresa ao plano foi de seis meses, ao fim desse
período, essa empresa tem que manter os empregos por mais dois meses.
"O governo custeia o trabalhador empregado e não desempregado, o que
garante o retorno econômico para o País", afirmou Rafael Marques,
presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, filiado a Central Única
dos Trabalhadores (CUT). De acordo com o sindicalista, o plano ainda
incentiva a negociação coletiva em períodos difíceis como o que ocorre
no setor automobilístico.
"O sentido desse programa é proteger o emprego. Nossa economia passa por
uma dificuldade e esse é um programa que ganham empregados, empresários
e governo", afirmou o ministro Miguel Rossetto, da Secretaria-Geral da
Presidência. A empresa recolherá o INSS e o FGTS do salário completado,
ou seja, sobre 85% do original. Mesmo assim, segundo o governo, o custo
de salários e encargos para as empresas será reduzido em 27%.
"Já temos indicadores positivos no País, mas ainda são pontuais e este
programa é uma das formas para acelerar a travessia dessa crise", disse o
ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, que reforçou que o novo plano
"é melhor que o lay-off, porque mantém o vínculo empregatício".
No lay-off, o contrato de trabalho é suspenso por cinco meses, que podem
ser prorrogados. O empregado recebe o seguro-desemprego por cinco
meses. No plano, o trabalhador continua empregado. Também haverá a
continuidade na arrecadação de contribuições trabalhistas e
previdenciárias e impostos, que são pagos pelas empresas e
trabalhadores. Para o governo, é mais vantajoso completar uma parte dos
salários e continuar arrecadando do que aumentar os gastos com o
seguro-desemprego.
O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos
Automotores (Anfavea), Luiz Moan, afirma que as montadores, ao lado dos
sindicatos, vão pressionar o Congresso para que a MP seja aprovada e a
mudança passe a valer definitivamente. "Instrumento fundamental para
ultrapassar essa crise", disse. "O dia a dia dos sindicatos hoje tem
sido lutar para conseguir lay-off ou férias coletivas. Mesmo usando
esses mecanismos, a quantidade de trabalhadores demitidos vem
aumentando. Então, esse programa vem em boa hora", afirmou Sérgio Luiz
Leite, primeiro secretário da Força Sindical.
Programa de Proteção ao Emprego - entenda o que muda
Texto prevê, em momentos de crise, redução de até 30% da
jornada e dos salários, mas o trabalhador receberá uma complementação de
15% do FAT; MP está em vigor, mas precisa passar pelo Congresso
O Diário Oficial da União traz publicada a Medida Provisória (MP) 680,
que institui o Programa de Proteção ao Emprego (PPE) e foi assinada na
segunda-feira, 06.jul.2015, pela presidente Dilma Rousseff. Também foi
publicado na edição do Diário Oficial de terça-feira, 07.jul.2015,
decreto que regulamenta trechos da MP e cria o comitê que definirá as
regras para adesão e funcionamento do programa.
A MP permite a redução da jornada de trabalho e dos salários dos
empregados na indústria em até 30% em tempos de crise ou de queda
expressiva de produção. Para o empregado, o salário será cortado em até
15%, já que haverá complementação do valor com recursos do Fundo de
Amparo ao Trabalhador (FAT). "A redução temporária da jornada de
trabalho poderá ter duração de até seis meses e poderá ser prorrogada,
desde que o período total não ultrapasse doze meses", determina a
medida.
O texto já está em vigor, mas ainda precisa passar pelo Congresso
Nacional para não perder a validade. O artigo 7º da MP, no entanto, só
entrará em vigor daqui a quatro meses. Esse trecho da norma trata da
contribuição da empresa à Seguridade Social recolhida sobre as
remunerações pagas no âmbito do novo programa.
O PPE tem como base iniciativa adotada na Alemanha. Poderão aderir ao
PPE as empresas que estiverem em situação de dificuldade
econômico-financeira, "nas condições e forma estabelecidas em ato do
Poder Executivo federal" - os setores que serão contemplados com o
plano, por exemplo, ainda serão fixados pelo comitê. A adesão ao PPE
terá duração de, no máximo, 12 meses e poderá ser feita até 31 de
dezembro deste ano.
De acordo com o decreto que regulamenta a MP, para aderir ao PPE a
empresa deverá comprovar, além de outras condições que serão definidas
pelo comitê, registro no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) há,
pelo menos, dois anos; regularidade fiscal, previdenciária e relativa
ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS); sua situação de
dificuldade econômico-financeira, a partir de informações definidas pelo
comitê; e existência de acordo coletivo de trabalho específico,
registrado no Ministério do Trabalho e Emprego.
PPE é ‘oportunista’ - para conselheiro do FAT
Representante do setor de serviços no Codefat diz que Plano de Proteção ao Emprego é mais uma medida para beneficiar montadoras
Membro do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador
(Codefat), o empresário Luigi Nese, representante da Confederação
Nacional de Serviços (CNS), criticou duramente as medidas do Plano de
Proteção ao Emprego (PPE), desenhadas pelo governo para tentar estancar
as demissões no País.
“Não sabemos quais setores vão ser escolhidos pelo comitê formado por
ministros, mas já sabemos que as montadoras vão ser privilegiadas.
Aliás, esse programa foi feito para as montadoras. É um absurdo”,
afirmou Nese, que também presidiu o Codefat por muitos anos. “Montadoras
não são mais a coqueluche do emprego. O governo tem de aprender isso”,
disse.
Beneficiar um só setor, como o automobilístico, vai contra discurso de Levy |
O Codefat é um conselho tripartite com representantes do governo, dos
trabalhadores e dos empresários, responsável por decidir as aplicações
de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). O conselho é
responsável também por aprovar o orçamento do fundo e o cronograma de
pagamento do seguro-desemprego e do abono salarial. Mesmo assim, o
Codefat não foi consultado sobre a elaboração do PPE, que utilizaria
recursos do FAT para complementar os salários dos trabalhadores que
aderirem ao programa.
Nese afirmou que o programa, implementado por meio de uma Medida
Provisória (MP) que ainda vai ser apreciada pelos parlamentares, pegou
de surpresa a bancada dos trabalhadores e dos empresários no conselho,
porque carrega uma forte contradição em relação às decisões tomadas
recentemente.
Em sua última reunião, o conselho aprovou o orçamento do fundo para o
ano de 2016. Nesse encontro, o governo conseguiu adiar metade do
pagamento do abono salarial para o ano que vem. Com a decisão, dos R$
19,1 bilhões de gastos previstos com o benefício para este ano, R$ 9
bilhões ficarão para 2016. O abono salarial é um benefício de até um
salário mínimo pago anualmente ao trabalhador que recebe remuneração
mensal de até dois salários mínimos. Cerca de 4 milhões de
trabalhadores, de um total de 8 milhões, receberão o benefício deste ano
só em 2016, segundo dados do Ministério do Trabalho. “Se não tinha
condição para pagar o abono, também não tem condições para pagar esse
benefício. Não tem coerência”, afirmou.
Privilégio. Para Nese, o PPE também derruba a promessa do
ministro da Fazenda, Joaquim Levy, de não privilegiar setores
específicos em detrimento de outros. Ao assumir o comando do ministério,
Levy criticou o que chamou de “patrimonialismo” nas decisões do
antecessor, Guido Mantega. Levy não participou do anúncio do PPE. “É uma
medida oportunista de alguns setores que conseguiram convencer o
governo a beneficiá-los”, disse Nese. “As políticas têm de ser para
todos. Essas políticas de soluções imediatistas não levam a nada.”
O governo estima que o PPE terá custo de R$ 29,7 milhões neste ano e de
R$ 67,9 milhões em 2016. Essa foi a projeção colocada na exposição de
motivos da MP 680, que instituiu o programa. De acordo com o texto, as
despesas serão custeadas pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
“Cumpre ressaltar, ademais, que o Poder Executivo atentará para o limite
orçamentário e financeiro no momento de estabelecer as condições para
adesão ao PPE e de aprovar as solicitações de adesão”, diz o texto.
Da parte dos sindicalistas, porém, foram só elogios. “Nesse período de
crise, o trabalhador que é demitido sofre ainda mais, porque não
consegue arranjar emprego e, quando arranja, o salário é mais baixo”,
disse Sérgio Luiz Leite, primeiro-secretário da Força Sindical e
presidente da Federação dos Trabalhadores nas Indústrias Químicas e
Farmacêuticas do Estado de São Paulo (Fequimfar). “Então é melhor ficar
empregado do que qualquer outra coisa.” Leite participou da formulação
do PPE, que envolveu até viagem à Alemanha, em 2012, para ver o modelo
adotado naquele país para períodos de crises.
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