Proposta para reduzir jornada e salário enfrenta resistência e pode não atender expectativas do governo
Anunciado para evitar um corte ainda maior de postos de trabalho, o
Plano de Proteção ao Emprego (PPE) enfrenta resistência de empresas e
sindicatos e já corre o risco de produzir resultados muito aquém do
esperado pelo governo.
A medida provisória que criou o plano autoriza empresas a reduzir
jornada de trabalho e salários em até 30%, pelo período máximo de um
ano. Na prática, porém, a perda do trabalhador seria de no máximo 15%,
porque o governo vai usar dinheiro do Fundo de Amparo ao Trabalhador
(FAT) para bancar metade do salário cortado. Antes de ser adotada, a
medida precisa ser alvo de acordo coletivo entre empresas e
trabalhadores. Sindicalistas preveem dificuldades para negociar o corte
de salários.
— A premissa tem de ser o menor impacto possível nos salários. Podemos,
por exemplo, negociar uma redução de 10% da jornada e do salário, mas
com as empresas bancado os 5% em forma de vale-alimentação. É uma
possibilidade — afirmou o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do
ABC, Rafael Marques.
Mais enfático, o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Betim e
região, João Alves, disse que o plano “não foi bem recebido” e não
haverá negociação para redução de jornada e salário.
— Esse é um programa de proteção à empresa, e não ao emprego. Não há
como o trabalhador pagar sozinho a queda do mercado. O governo, para
defender realmente os empregos, deveria adotar medidas mais eficazes de
controle da inflação e reduzir a taxa de juros para estimular os
investimentos no país — afirmou.
De acordo com o Ministério do Trabalho, pelo menos cinco setores já
manifestaram interesse em aderir ao PPE: automotivo, carnes, açúcar e
álcool, componentes eletrônicos e metalúrgico. Um comitê do governo
ainda vai definir os segmentos que podem aderir, mas segundo o
ministério, são potenciais beneficiários aqueles que recorrem ao lay-off
(suspensão temporária do contrato de trabalho). Entre janeiro e junho,
11.481 trabalhadores, principalmente da indústria (fabricação de
automóveis e álcool) e agropecuária (cultivo de cana-de-açúcar), foram
colocados em lay-off.
Especialista em mercado de trabalho, o professor da UFRJ João Saboia,
afirma que, diante da crise, a proposta do governo é boa para o
trabalhador. Mas há dúvidas sobre o interesse das empresas.
— Para o trabalhador, reduzir a jornada em 30% ganhando 85% do salário é
uma proposta muito positiva, mas a empresa vai ter que assumir alguns
compromissos, como a estabilidade ao fim do período. Resta saber o que a
empresas estão pensando. Se não tiver perspectiva de melhoria na
frente, não vão querer o acordo, vão insistir na demissão — diz.
Entre as empresas de máquinas e equipamentos, a previsão também é de baixa adesão ao plano.
— Num momento como este, todos devem dar a sua contribuição. Mas há no
Brasil a cultura de que toda proposta que vem do empregador é contra o
empregado. Não querem perder. Não conseguem compreender que pode se
perder o anel, mas não o dedo — afirma o diretor de Assuntos
Tributários, Relações Trabalhistas e Financiamentos da Associação
Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Hiroyuki
Sato.
Segundo Sato, o setor de máquinas e equipamentos deve ser um dos que não
devem aderir ao PPE. Além das negociações mais duras com os sindicatos,
muitas fabricantes não têm Certidão Negativa Débito (CND) adequada para
se candidatar ao programa:
— O setor está em situação complicada há muito tempo, e as empresas preferem pagar os salários do que os impostos.
A Whirlpool, donas das marcas Brastemp e Consul, não deve aderir ao
programa, segundo um alto executivo da empresa. Neste ano, a Whirlpool
reduziu sua folha de pagamento em 3 mil pessoas. No total, a companhia
emprega cercas de 18 mil pessoas no país.
— O empregado tem que ter em mente que ele vai perder até 15% do seu
salário. É a contrapartida dele. E isso, vai ser difícil de negociar.
Além disso, os ajustes que fizemos ao longo do ano já nos dão condições
de enfrentar esse momento de crise. No ambiente atual, é uma lei difícil
de pegar — disse o executivo.
A redução de salários com corte de jornada já era prevista na legislação
trabalhista, desde que negociada com os sindicatos dos trabalhadores. A
diferença é que no programa antigo, criado em 1998, não havia ajuda por
parte do governo. Segundo Sérgio Leite, da Força Sindical, os acordos
gerados desde então foram esporádicos:
— Essa permissão é muito antiga. Mas pouco utilizada. Não temos
levantamento porque esses acordos são muito dispersos — disse Leite.
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