Juiz manda Odebrecht explicar notas sobre 'anular' Lava Jato e políticos
O juiz federal Sergio Moro intimou os advogados de Marcelo Odebrecht a
dar explicações sobre as anotações encontradas pela Polícia Federal nos
telefones celulares do empresário que sugerem que ele deu instruções
para tentar obstruir as investigações da Operação Lava Jato antes de ser
preso.
O empresário está preso em Curitiba desde 19 de junho, junto com outros
quatro executivos que trabalhavam para o grupo Odebrecht e também são
acusados de participar do esquema de corrupção descoberto na Petrobras.
Uma das anotações fala em "trabalhar para para/anular (dissidentes PF...)".
No despacho, embora faça a ressalva que os trechos estão sujeitos à
interpretação, o juiz Moro escreveu que a menção aos 'dissidentes da PF'
é a mais perturbadora porque "coloca uma sombra sobre o significado da
anotação".
Na interpretação da Polícia Federal, o trecho indica a possibilidade de
que o empreiteiro pretendia usar policiais federais para tumultuar as
investigações.
No ano passado, a descoberta de uma escuta na cela ocupada pelo doleiro
Alberto Youssef levantou suspeitas de que policiais federais poderiam
estar atuando para atrapalhar as investigações do petrolão.
Moro considerou que uma outra anotação — "higienizar apetrechos MF e
RA", referência do o empresário a dois executivos do grupo sob
investigação, Márcio Faria e Rogério Araújo, que hoje estão presos com
ele em Curitiba — sugere destruição de provas.
No mesmo conjunto de anotações, surgem "Vazar doação campanha. Nova nota
minha midia? GA, FP, AM, MT, Lula? ECunha?" — o que, para o juiz Sergio
Moro, poderia ser uma tentativa de constranger beneficiários de doações
eleitorais.
Além das referências ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao
deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), segundo a polícia, "MT" é o
vice-presidente Michel Temer, "GA" é o governador Geraldo Alckmin
(PSDB-SP) e "FP" é o governador Fernando Pimentel (PT-MG).
O contexto não deixa claro por que e em que circunstâncias o empresário
redigiu as iniciais atribuídas aos políticos no telefone.
Moro estabeleceu prazo de dois dias para que os advogados de Marcelo
Odebrecht apresentem explicações sobre significado dos textos
encontrados no celular.
O executivo da Odebrecht, Marcio Faria da Silva (em destaque), deixando a sede da PF em São Paulo |
OUTRO LADO
Em nota, a defesa de Marcelo Odebrecht disse que a Polícia Federal fez
"interpretações distorcidas, descontextualizadas e sem nenhuma lógica
temporal de suas anotações pessoais". O relatório de análise da PF,
segundo a assessoria, não se atém a fatos concretos, mas se apega a
suposições.
"O mais grave é a tentativa de atribuir ao Marcelo Odebrecht a
responsabilidade pelos ilícitos gravíssimos que estão sendo apurados e
envolveriam a cúpula da Polícia Federal do Paraná, como a questão da
instalação de escutas em celas, dentre outras", diz trecho da nota.
Os políticos citados disseram que não têm como comentar as notas do telefone de Odebrecht.
Por meio de assessores, o ex-presidente Lula disse que não sabe porque seu nome aparecia nas anotações do empresário.
A assessoria do vice-presidente Michel Temer disse que a menção a seu
nome se trata de uma "inferência" da Polícia Federal. Segundo a
assessoria, Temer conhece Marcelo Odebrecht, mas não sabe nem sequer se
as iniciais "MT" referem-se de fato a ele.
Já auxiliares do governador Geraldo Alckmin afirmaram que o conteúdo
divulgado é "ininteligível". "Além disso, não há, nas siglas nela
contidas, nenhuma comprovação ou sequer indício de tratar-se de alguém
em especial, tampouco de algum assunto específico".
Segundo a assessoria do tucano, o governador não recebeu qualquer pedido
de ajuda do empresário Marcelo Odebrecht e que o único evento recente
em que se encontraram foi jantar de homenagem ao ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso.
O subsecretário de Comunicação de Minas Gerais, Ronald Cavalcante, disse
que o governador Fernando Pimentel não teria como comentar o caso por
não conhecer nem por que as anotações foram feitas nem a razão da
Polícia Federal ter concluído que FP seria Fernando Pimentel.
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