Em carta, ex-presidente da Sete Brasil admite ter recebido propina
Ex-presidente da Sete Brasil João Carlos Ferraz |
Numa carta enviada em março à direção da Sete Brasil, o ex-presidente da
empresa João Carlos Ferraz admite pela primeira vez que recebeu US$
1.985.834,55 em propina dos estaleiros que trabalham para a companhia na
construção de sondas de exploração do pré-sal.
Ferraz afirma ter aceito as "gratificações" num "momento de fraqueza",
em que era pressionado por colegas. Ele não esclarece quem pagou nem
quem o pressionou. Diz que não pegou nada além do que declarou e pede um
número de conta bancária para devolver o dinheiro.
A Sete foi criada pela Petrobras para administrar as sondas do pré-sal.
Além da própria estatal, tem como sócios um grupo de bancos e fundos de
pensão estatais.
Até a confissão de Ferraz, apenas o ex-gerente da Petrobras Pedro
Barusco, um dos delatores da Operação Lava Jato, tinha falado em
propinas na Sete Brasil.
A carta do executivo foi enviada à equipe interna da Sete que auditou a
companhia depois de Barusco ter revelado à Justiça que o esquema de
corrupção na Petrobras foi replicado na Sete.
A empresa estima que as propinas somaram US$ 224 milhões. Segundo
depoimento de Barusco, dois terços foram para o ex-tesoureiro do PT João
Vaccari Neto. O restante foi dividido com gente da Sete e da Petrobras,
como o ex-diretor Renato Duque.
No mês passado, a Sete abriu um processo contra Ferraz que corre em
segredo de Justiça. A empresa pede que seu ex-presidente devolva R$ 22,2
milhões, valor que inclui os recursos desviados, sua indenização pela
rescisão contratual e os bônus pagos por desempenho no período em que
comandou a companhia.
Há cerca de duas semanas, Ferraz tentou um acordo com a Sete para pôr
fim ao processo. Propôs devolver menos da metade do que é cobrado, mas
os acionistas da companhia não aceitaram.
Em sua carta, o executivo assume ter recebido propina entre maio e
dezembro de 2013. Afirma que, fora esse episódio, não haveria mais nada
que pudesse "macular suas demais atividades" na empresa, realizadas com
"zelo e competência".
Para "mostrar boa-fé", como ressalta na carta, Ferraz se comprometeu a
dar uma procuração para que a Sete checasse a "inexistência de outros
valores depositados no exterior a partir de sua posse como diretor da
empresa".
CONTA NA SUÍÇA
Primeiro presidente da Sete Brasil, Ferraz ficou no cargo de dezembro de
2010 até maio de 2014. Ele e Pedro Barusco, ex-diretor de operações da
companhia, eram colegas na Petrobras e foram indicados pela estatal para
a diretoria da Sete, que estava sendo montada.
Ferraz deixou a Sete porque parte dos acionistas não estava contente com
seu desempenho. Saiu levando indenização de R$ 11,5 milhões, mas
tentara receber quase o dobro.
No fim de 2014, em acordo de delação, Barusco afirmou que ele, Ferraz e o
também ex-diretor da Sete Eduardo Musa tinham combinado o pagamento de
propina com os estaleiros EAS, Brasfels, Jurong, Enseada e Rio Grande.
Disse também que os três tinham conta Suíça, onde o dinheiro era
depositado. De acordo com Barusco, os estaleiros contratados pela Sete
pagariam de 0,9% a 1% do valor de construção de cada sonda, em troca dos
contratos.
Barusco recebeu 0,1% a mais dos estaleiros Jurong e Brasfels sem que os
parceiros soubessem porque, segundo seu depoimento à Justiça, "achava
injusta a distribuição diante do fato de ter sido um dos principais
responsáveis pelo projeto".
Ao todo seriam feitas 28 sondas, orçadas em US$ 22 bilhões. Depois de
prontas elas seriam alugadas à Petrobras. O envolvimento da Sete com a
Lava Jato acabou comprometendo a empresa, que hoje está paralisada em
processo de reestruturação.
OUTRO LADO
A Sete Brasil evitou falar sobre o assunto. Em nota explica que "reitera
que todas as ações internas relativas a temas de escopo jurídico vêm
sendo desenvolvidas nos fóruns adequados”.
A companhia destacou ainda que a atual direção desde que assumiu, em
maio de 2014, fez auditorias externas em todos os contratos. E afirma
que "a conclusão apresentada é que todos estavam dentro da legalidade e
com preços praticados pelo mercado. O atual comando da Sete Brasil tem
todo o interesse que todos os fatos em apuração pela Operação Lava-Jato
sejam esclarecidos."
O estaleiro Enseada afirmou "que nunca fez ou recebeu qualquer pagamento
indevido no âmbito de seus contratos nem tampouco recebeu ou atendeu a
qualquer solicitação neste sentido".
A Engevix, sócia do Rio Grande, diz que "está prestando os esclarecimentos necessários à Justiça".
Também em nota, o EAS disse que "não identificou quaisquer pagamentos
que comprovem o envolvimento da companhia". A empresa informou ter
contratado consultoria jurídica e forense para averiguar o caso.
O estaleiro Jurong não respondeu. A reportagem também não conseguiu contato com Brasfels.
RAIO X — SETE BRASIL
A empresa Sete Brasil foi criada em dezembro de 2010 para construir 28
sondas de perfuração que serão alugadas à Petrobras para exploração do
pré-sal.
Os principais sócios: BTG Pactual, Bradesco, Santander, fundos de pensão estatais, FI-FGTS e Petrobras.
A ligação com a Lava Jato impediu a empresa de receber um financiamento
de US$ 9 bilhões do BNDES. Em junho, sócios e credores da Sete chegaram a
um acordo para injetar dinheiro na empresa.
A confissão de Ferraz de ter recebido propina de estaleiros não
dificulta as atuais negociações em andamento para a reestruturação da
companhia, que prevê, entre outras medidas, a redução da encomenda de
sondas da Petrobras, atuais 28 para 15, à Sete.
Em delação, Pedro Barusco, ex-executivo da Petrobras e da Sete, afirmou
que ele, outros diretores das empresas e o ex-tesoureiro do PT João
Vacari Neto receberam dinheiro dos estaleiros contratados para fazer as
sondas. A empresa Sete Brasil já contratou os estaleiros Jurong,
Brasfels, Enseada, Rio Grande e Atlântico Sul.
O ex-presidente da Sete João Carlos Ferraz admitiu ter recebido quase
US$ 2 milhões de estaleiros que trabalham para a empresa e propôs
devolver o dinheiro.
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