sábado, 11 de julho de 2015


Em troca de mensagens, executivo trata de pedido para levar convidados do então presidente Lula a obra — Cerimonial de Lula pediu helicóptero de empreiteira para convidados, diz e-mail — Para a PF, e-mail indica elo entre Lula e empreiteira — Executivo da Camargo Corrêa transmitiu solicitação, em março de 2009, a dirigentes da empresa para providenciar transporte a seis aliados do petista acompanharem o então presidente em visita a Jirau

Lula discursa para funcionários da Camargo Corrêa na Usina de Jirau, em 2009

Relatório de análise de mídia apreendida pela Operação Lava Jato na sede da construtora Camargo Corrêa destaca e-mail de um executivo que cita suposto pedido do chefe do cerimonial do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva para providenciar helicóptero a um grupo de seis convidados do petista para uma visita à Usina Hidrelétrica Jirau, no Rio Madeira, em Rondônia.
A Usina Jirau integra o Complexo Hidrelétrico do Rio Madeira, e é um dos principais empreendimentos do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento, do Governo Federal.
A correspondência, de 9 de março de 2009, foi enviada às 22h53 por Antonio Carlos Portugal a outros seis executivos da Camargo Corrêa, que está sob suspeita de ter integrado cartel de empreiteiras no esquema de corrupção na Petrobrás.
Para os investigadores da Lava Jato, o e-mail é indício das relações próximas entre a empreiteira e o ex-presidente Lula.
No início de junho, a Polícia Federal juntou aos autos da investigação laudo pericial que indica pagamento da empreiteira no valor de R$ 3 milhões para o Instituto Lula e mais R$ 1,5 milhão para a LILS Palestras Eventos e Publicidade, de Luiz Inácio Lula da Silva, entre os anos de 2011 e 2013.
Foram três pagamentos de R$ 1 milhão cada registrados como “Contribuições e Doações” e “Bônus Eleitoral” para o Instituto, aberto por Lula após ele deixar a Presidência da República, em 2011.
O e-mail agora juntado pela PF aos autos da investigação foi interceptado na Camargo Corrêa em novembro, quando deflagrada a Operação Juízo Final, sétima fase da Lava Jato. Nele, o executivo Antonio Carlos Portugal diz a seus interlocutores que o então chefe do cerimonial de Lula o procurou para que resolvesse ‘um problema’ com os convidados do petista.
A lista dos convidados de Lula consta da mensagem, entre eles três senadores, um assessor especial ‘da ministra Dilma Rousseff’ (ela ocupava o Ministério de Minas e Energia), o então presidente do Sesi e o diretor-geral do Senai.
A mensagem foi encaminhada a outros seis altos executivos da empreiteira: Kalil Cury Filho, Luiz Roberto Ortiz Nascimento, Vitor Hallack, Antônio Miguel Marques, João Ricardo Auler e Francisco de Assis Oliveira Azevedo.
O ‘problema’, segundo Portugal, é que a capacidade do helicóptero oficial da Presidência estava completa. O chefe do cerimonial de Lula, segundo Portugal, solicitou que um helicóptero da empreiteira fosse colocado à disposição do Palácio do Planalto e que deveria estar no aeroporto de Porto Velho (RO) quando da chegada do avião presidencial para acompanhar o comboio oficial.
“Fui procurado, agora há pouco, às 22:00 hs. pelo Ministro Marcos Raposo, Chefe do Cerimonial do Presidente para resolver um problema surgido com os convidados do Pres. Lula à viagem do dia 12 a Rondônia, que irão no avião presidencial. Seis membros da comitiva não tem como viajarem no helicóptero oficial, pois, sua capacidade está completa”, escreveu Portugal.
Ainda segundo o executivo, o ministro pediu à empreiteira que ajudasse a ‘conduzir os seis convidados nos trajetos Porto Velho – Jirau e Jirau – Santo Antônio” .” Por outro lado deveria ser contactado o oficial da Aeronáutica que está no Escalão Avançado da Presidência para acertar os detalhes de pouso e decolagem desse aparelho para incorporar-se ao comboio aéreo oficial.”
No pé do e-mail, Portugal escreveu. “Relação dos convidados do Pres. Lula: – Senador Valdir Raupp (PMDB/RO), Senadora Fátima Cleide (PT/RO), Senador Expedito Júnior (PR/RO), Sr. Anderson Dornelles, Assessor Especial da Ministra Dilma Rousseff; Sr. Jair Meneghelli, Presidente do SESI, Sr. José Manuel Martins, Diretor-Geral do SENAI.” – Fátima Cleide (PT) e Expedito Júnior (PSDB) não exercem mais mandato no Senado.
Portugal finaliza. “Fico no aguardo de sua manifestação para poder transmiti-la ao Cerimonial do Presidente. Abraços.”
O setor de energia é a próxima área de interesse das investigações da Lava Jato, fora dos contratos da Petrobrás, que até aqui revelaram desvios de até R$ 19 bilhões, segundo a Polícia Federal. Dois executivos da Camargo Corrêa, Dalton Avancini e Eduardo Leite, confessaram em delação que a empreiteira pagou propina na obra da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, ainda em construção.

O e-mail juntado pela PF aos autos da investigação

Obra. A Camargo Corrêa integrou o Consórcio Energia Sustentável do Brasil, vencedor do leilão de Jirau, em 2008. A um custo de R$ 10 bilhões, a usina localizada no Rio Madeira entrou em operação em 2013, mas as obras seguiram. O grupo acabou deixando o consórcio, posteriormente.
A visita de Lula a Jirau ocorreu, de fato, três dias depois. Em discurso, o então presidente citou os nomes de pelo menos três políticos de Rondônia incluídos na lista mencionada pelo executivo da Camargo Corrêa. “Deixa eu dizer duas coisas para vocês: eu dizia ao Governador, dizia ao Prefeito, e vinha discutindo no avião com o senador Expedito, com a Fátima Cleide e com o Raupp. Ou seja, eu vinha discutindo o seguinte: Eu quero ver como é que estará o Estado de Rondônia daqui a 15 anos.”
Lula disse que o investimento na usina alcançou R$ 10 bilhões e citou outro nome da lista de seus supostos convidados, Jair Meneguelli. “É uma coisa extraordinária, que eu nem sabia, que aconteceu aqui, agora, que eu quero valorizar muito: o acordo feito pelo Sebrae e pelas empresas para formar aqui 100 microempresários, prepará-los para que eles possam ajudar a dinamizar os investimentos e os empreendimentos aqui no estado de Rondônia. E, sobretudo, o acordo feito pelo Meneguelli, em nome do Sesi, com os empresários também, para a formação de 10 mil trabalhadores aqui, no estado de Rondônia.”

COM A PALAVRA, A PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
A SECRETARIA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA INFORMOU:
“A então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, acompanhou o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em visita oficial aos canteiros de obras de Santo Antônio e Jirau. Integraram a comitiva Marcos Raposo, servidor de carreira do Itamaraty, atualmente embaixador do Brasil em Lima, e o servidor Anderson Dornelles, hoje assessor especial da Presidenta da República, que não fez uso do helicóptero da companhia. Nenhuma norma legal foi infringida pelos referidos servidores, conforme o Código de Conduta da Administração Federal.”

COM A PALAVRA, A COMISSÃO DE ÉTICA PÚBLICA DA PRESIDÊNCIA
O presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência, Américo Lacombe, informou que na próxima segunda-feira (13.jul.2015) irá analisar se houve alguma irregularidade no episódio. “Vamos analisar diante dos fatos concretos que forem fornecidos. Depende dos fatos. Julgamos fatos, não julgamos hipóteses.”
Preliminarmente, Lacombe avalia que não houve irregularidade se, de fato, foi usado um helicóptero da Camargo Corrêa para levar convidados do então presidente Lula. “Ao que parece a licitação (das obras de Jirau) já tinha ocorrido, a empresa já havia ganho a concorrência.”
Para o presidente da Comissão de Ética se houve a cessão do helicóptero ela ocorreu após o processo de licitação, portanto, a empreiteira não buscava favorecimento.
“Irregularidade ocorreria se fosse uma visita antes da licitação a uma área no helicóptero de um dos concorrentes”, anotou Américo Lacombe. “Mas vamos verificar esse episódio na semana que vem, reitero, com base em fatos, não em hipóteses.”

NOTA DA SECRETARIA EXECUTIVA DA COMISSÃO DE ÉTICA PÚBLICA
“O consórcio Energia Sustentável do Brasil, composto pelas empresas GDF Suez Energy South America Participações Ltda., Camargo Corrêa, Eletrobras Eletrosul e Eletrobras Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf), venceu o leilão realizado, em 19.05.2008, pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), para a outorga do uso de bem público para a implantação da Usina Hidrelétrica Jirau (UHE Jirau) no Rio Madeira (Estado de Rondônia).
A União participa do capital social da Sociedade de Propósito Específico (SPE) denominada Energia Sustentável do Brasil S.A. (ESBR), através da Eletrobras Eletrosul (20% do capital social) e Eletrobras Chesf (20% do capital social).
A Usina Jirau está sendo construída a 120 km de Porto Velho, integra o Complexo Hidrelétrico do Rio Madeira, e é um dos principais empreendimentos do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento, do Governo Federal.
A Comissão de Ética, neste exame preliminar, não possui dados completos sobre o fato em questão.
O art. 7º do Código de Conduta da Alta Administração Federal estabelece que “a autoridade pública não poderá receber salário ou qualquer outra remuneração de fonte privada em desacordo com a lei, nem receber transporte, hospedagem ou quaisquer favores de particulares de forma a permitir situação que possa gerar dúvida sobre a sua probidade ou honorabilidade” – grifamos.
Não se pode perceber, ainda mesmo na ausência de outros detalhes, inobservância do citado dispositivo na utilização de veículos pertencentes a um dos sócios na construção do empreendimento no transporte entre a capital do Estado de Rondônia e a localidade em que é erigida a citada Usina Hidrelétrica.
O uso do veículo, pelo que se entende no exame das informações prestadas na consulta, esteve vinculado ao exercício da função pública – vistoria do andamento das obras – e não indica eventual “situação que possa gerar dúvida sobre” probidade ou honorabilidade de autoridade (art. 7º, CCAAF).
Registre-se, ainda, que como regra geral, a Comissão de Ética Pública recomenda que autoridades públicas sujeitas à sua jurisdição não utilizem equipamentos de propriedade de particulares (privados) para deslocamentos oficiais, inaugurações, etc, salvo o transporte aéreo comercial, regular, pago pelos cofres públicos.”

COM A PALAVRA, O INSTITUTO LULA
O Instituto Lula informou que o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi transportado no helicóptero da presidência e fez um sobrevôo das obras (de Jirau). A atividade constou da agenda oficial, foi acompanhada pela imprensa e divulgada.
A viagem, destacou o Instituto, foi para o lançamento da pedra fundamental da construção da usina de Jirau.
O Instituto informou que desconhece tanto o pedido quanto se o helicóptero foi disponibilizado.
Sobre indagação se é normal o fato de o então chefe do cerimonial de Lula ter solicitado um meio de transporte para seis pessoas que teriam sido convidadas do presidente, o Instituto Lula sugeriu que a pergunta fosse encaminhada ao próprio chefe do cerimonial na época.
Em junho, quando a Polícia Federal juntou aos autos da Lava Jato um laudo que apontava repasses da Camargo Corrêa, o Instituto Lula, por meio de sua assessoria de imprensa, observou que os valores registrados na contabilidade da empreiteira foram doados legalmente e não existe relação entre a entidade e questões eleitorais.
Segundo a assessoria, “os valores citados foram doados para o Instituto Lula para a manutenção e desenvolvimentos de atividades institucionais, conforme objeto social do seu estatuto, que estabelece, entre outras finalidades, o estudo e compartilhamento de políticas públicas dedicadas à erradicação da pobreza e da fome no mundo”.
Quanto aos valores para a empresa de eventos de Lula a assessoria informou que “os três pagamentos para a LILS são referentes a quatro palestras feitas pelo ex-presidente, todas elas eventos públicos e com seus respectivos contratos”.
“Essas doações e pagamentos foram devidamente contabilizados, declarados e recolhidos os impostos devidos.”
A nota informa ainda que “as doações ao Instituto Lula e as palestras do ex-presidente não têm nenhuma relação com contratos da Petrobrás”.
Ainda nessa ocasião, a Construtora Camargo Corrêa esclareceu que ‘as contribuições ao Instituto Lula referem-se a apoio institucional e ao patrocínio de palestras do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no exterior’.

COM A PALAVRA, A CAMARGO CORRÊA
Por sua Assessoria de Imprensa, a Construtora Camargo Corrêa declarou. “Quanto a solicitação, a Construtora Camargo Corrêa não teve prazo para confirmar a operação, mas esclarece que prestar o apoio necessário é comum para deslocamentos em região de difícil acesso.”

COM A PALAVRA, O SENADOR VALDIR RAUPP (PMDB-RO)
O senador Valdir Raupp (RO), vice presidente nacional do PMDB, disse que não se recorda de ter viajado em helicóptero da Camargo Corrêa. “Como é que vou saber que cor é a vaca que eu tomo o leite?”, questionou. “Eu me lembro que uma vez viajei em uma empresa de táxi aéreo, posei na pista de Jirau, mas em helicóptero eu não lembro.
Estive com a Dilma visitando enchentes, fui em um helicóptero da Força Aérea. Quase todas as vezes voava em helicóptero da Força Aérea. Verdadeiramente, nunca soube que a Camargo Corrêa tenha fretado (um helicóptero). Eu acho que não, todas as vezes eu fui nesse helicóptero da Força Aérea. Acho que não voei nesse helicóptero (da Camargo Corrêa).”

Os ex-senadores Fátima Cleide (PT/RO) e Expedito Júnior (PSDB/RO), não foram localizados. A reportagem também não conseguiu contato com Jair Meneghelli e José Manuel Martins.



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