Juiz Sérgio Moro defende permanência de presidente da Odebrecht na prisão
Marcelo Odebrecht, presidente da empresa, ao ser preso |
O juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, afirmou em ofício
encaminhado ao Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, no qual
defende a manutenção da prisão preventiva do empresário Marcelo
Odebrecht, que os indícios de pagamento de propina pela Construtora
Norberto Odebrecht e pela Braskem, duas das empresas do Grupo, remetem à
responsabilidade de "alguém com poder de gestão sobre as duas". Na
avaliação de Moro, se não concordasse com os crimes, a Odebrecht poderia
ter buscado acordo de leniência.
"Se o paciente não concordasse com os crimes, seria de se esperar a
apuração interna dos fatos, a demissão dos subordinados e busca de
acordos de leniência", afirmou Moro em seu ofício.
Marcelo Odebrecht teve prisão preventiva decretada por Moro e foi preso
no dia 19 de junho. Desde então, está na carceragem da Polícia Federal
em Curitiba. Por enquanto, apenas a Construtora Norberto Odebrecht é
alvo de inquérito na Operação Lava-Jato. O nome da Braskem, empresa
controlada pelo Grupo, do setor petroquímico, surgiu no cabeçalho de um
comprovante de transferência apresentado pelo delator Rafael Ângulo,
funcionário do doleiro Alberto Youssef.
O acordo de leniência é previsto no artigo 16 da Lei 12.846, conhecida
como Lei Anticorrupção, sancionada em agosto de 2013. Pelas regras, a
empresa que adere ao trato compromete-se a identificar os envolvidos na
infração e a fornecer provas. Em troca, paga um terço da multa a que
seria condenada e é liberada de duas punições administrativas, a
publicação da decisão condenatória e a proibição de receber verbas
públicas.
Moro argumentou que, desde a decretação da prisão, as provas têm se
avolumado contra a Odebrech. Citou os 135 telefonemas entre Rogério
Araújo, executivo do Grupo, e Bernardo Freiburghaus, seguidos por
depósitos em contas controladas pelo ex-diretor da Petrobras Paulo
Roberto Costa (Quinus), pelo ex-gerente da estatal Pedro Barusco (Pexo) e
Renato Duque (Milzart Overseas), apresentados pelo Ministério Público
Federal. Costa e Barusco, dois dos delatores da Operação Lava-Jato,
reconheceram o recebimento de propina e apontaram Freiburghaus como
operador de depósitos e contas mantidas no exterior para receber
dinheiro proveniente da Odebrecht. Documentos em poder do Ministério
Público comprovaram que Freiburghaus, que deixou o Brasil no decorrer
das investigações, antes da decretação de prisões temporárias e
preventivas, era procurador de pelo menos quatro destas contas - Sygnus e
Quinnus, de Costa, e Canyon e Ibiko, de Barusco.
Ângulo afirmou que a Odebrecht fazia pagamentos de propinas através da
Braskem e que usava contas em nome das empresas Intercorp, Trident e
Klienfeld - as três fizeram depósitos nas contas dos ex-funcionários da
Petrobras, segundo demonstrou o MPF.
Assim como no despacho em que decretou a prisão preventiva de Odebrecht,
o juiz voltou a dizer que parece improvável que o esquema gigantesco de
propina fosse limitado a subordinados da empresa e que o e-mail em que o
empresário aparece como um dos destinatários, que fala sobre
"sobrepreço" em um contrato de sondas, revelaria no mínimo "que ele não
se mantinha olimpicamente afastado dos negócios relacionados à
exploração de óleo e gás". Os advogados da Odebrecht dizem que o termo
sobrepreço traduz uma cobrança corriqueira e regular neste mercado.
Moro afirmou que para eliminar o risco de reiteração delitiva seria
necessário "mudança nas práticas empresariais do grupo" e ressaltou que,
além de ser investigada por fraudes relacionadas a contratos com a
Petrobras, a Odebrecht teria participação em irregularidades e
pagamentos de propinas em contratos com a Hidrelétrica de Belo Monte e a
Usina Angra III, além de ter se reunido com dirigentes da Petrobras
para discutir propinas em agosto de 2014, em plena fase de investigações
da Operação Lava-Jato, como afirmou um dos delatores.
O juiz lembrou ainda que, no decorrer das investigações, foram alterados
documentos de duas empresas (Construtora Internacional Del Sur e
Hayley) supostamente usadas para repasse de propinas e que, bem antes da
Lava-Jato, o doleiro Alberto Youssef foi usado pela Odebrecht para
"intimidar terceiros".
Num dos depoimentos de delação, o doleiro afirmou que foi instado por
Márcio Faria, que na época era executivo da Odebrecht (ele deixou o
cargo depois de ser preso na Operação Lava-Jato), a falar com a Galvão
Engenharia para que parassem de furar licitações, oferecendo preços bem
mais baixos que as demais empreiteiras. Youssef afirmou que admoestou
executivos da Galvão, avisando que não participariam mais das licitações
da Petrobras caso não mudassem a conduta. Segundo ele, a mensagem foi
entendida.
A Odebrecht encaminhou nota afirmando que há um pré-julgamento dos executivos da empresa:
“O teor do ofício revela uma vez mais que o Juíz confunde prisão processual com pré-julgamento. Além disso, revela profundo desconhecimento do tamanho e da estrutura descentralizada do grupo Odebrecht, com seus 15 negócios distintos, que possuem lideranças claramente definidas e governanças próprias, além de mais de 100 empresas. O tamanho do grupo por si só já torna impossível que seu Diretor Presidente possa comandar de perto tantos assuntos. A Odebrecht reitera ainda que considera as medidas desnecessárias e ilegais, diante da inexistência de qualquer fato novo depois de mais de um ano de início da Operação Lava Jato.”
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