No ano do lema ‘Pátria Educadora’,
MEC perde R$ 10,5 bi, ou 10% do orçamento — cortes em programas,
pagamentos atrasados, greve e trocas de ministro marcaram o 2015 da
pasta
O Ministério da Educação (MEC) perdeu R$ 10,5 bilhões, ou 10% do
orçamento, em 2015, ano em que a presidente Dilma Rousseff escolheu o
slogan “Pátria Educadora” como lema de seu segundo mandato. Cortes em
programas, pagamentos atrasados e trocas de ministros marcaram o ano da
pasta.
A presidente anunciou o lema já no primeiro dia de 2015, mas os
problemas na área também apareceram depressa. Antes mesmo de oficializar
o represamento de orçamento no âmbito do ajuste fiscal, a tesoura
atingiu programas como o Financiamento Estudantil (Fies) e o Pronatec,
as duas principais bandeiras de Dilma na área da educação durante as
eleições de 2014.
Depois de uma expansão de financiamentos entre 2010 e 2014, o governo
alterou as regras do Fies ainda nos últimos dias de 2014. Restringiu o
acesso ao programa e chegou a adiar pagamentos a empresas educacionais. O
ano fechou com 313 mil contratos, 57% menos do que o registrado em
2014.
Dados atualizados mostram que a União gastou R$ 12 bilhões com o Fies em
2015, 16% menos do que os R$ 13,7 bilhões de 2014 — apesar de já haver
mais contratos acumulados. No Pronatec, o início de novas turmas foi
adiado no primeiro semestre e também houve atraso de pagamentos às
escolas. O MEC defende que foi registrado 1,1 milhão de novas matrículas
em 2015.
No decorrer do ano, outras iniciativas sofreram com a escassez de
recursos, como o Mais Educação, voltado a escolas de tempo integral, e o
Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), que transfere verbas
diretamente para as unidades.
Bolsas de programas de iniciação à docência e de alfabetização também
atrasaram. O corte na verba de custeio provocou reflexos nas
universidades federais, que agonizaram com problemas de caixa. O MEC
ainda teve de lidar com uma greve de cinco meses de duração dos
professores universitários federais.
Com dificuldade de arcar com os compromissos já existentes, a pasta viu a
expansão de gastos com a educação, prevista no Plano Nacional de
Educação (PNE), ser ameaçada. Aprovado em 2014, o PNE estipula 20 metas
para a educação em 10 anos e traz a previsão de ampliação dos recursos
da área para o equivalente a 10% do Produto Interno Bruto (PIB) no
período. Atualmente, esse porcentual fica em torno de 6%.
Para o coordenador-geral da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação,
Daniel Cara, o ano não foi bom para o setor. “Pensamos no início que a
Pátria Educadora significaria o cumprimento do PNE dentro do primeiro
mandato, mas o cumprimento neste ano foi ruim”, diz. “O motivo foi o
ajuste fiscal excessivo. O próprio governo impediu a realização de seu
lema”, completa.
O diretor da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp), Luiz Carlos de Freitas, analisa que, embora tenha seu peso, a
questão orçamentária não é o único problema enfrentado na área. “Em um
ano de mandato estamos no terceiro ministro. A educação é uma área com
um imenso passivo motivado pelo acúmulo histórico de falta de prioridade
e investimento e há uma pressão muito grande para que os resultados
apareçam logo. No entanto, não há atalhos para a boa educação”, diz.
A primeira opção para o MEC no segundo mandato da presidente Dilma era o
ex-governador do Ceará Cid Gomes. Ficou 76 dias no cargo e saiu após
chamar o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, de
achacador. Em seguida, assume o professor da USP Renato Janine Ribeiro,
que fica cinco meses no MEC. Em outubro, é substituído por Aloizio
Mercadante, que volta ao cargo que já havia ocupado entre 2011 e 2014.
De acordo com Janine Ribeiro, não foi possível prever que o golpe
financeiro no MEC seria tão grande. “Em um ano sem dinheiro, fica um
problema muito grande”, diz ele, que defende a melhora nos gastos e
critica o PNE. “O PNE é um plano de gastos, não é de melhora nos gastos.
Passa a ter a crise e não se sustenta a expansão prevista.”
Em nota, o MEC defendeu que, mesmo com as restrições orçamentárias
impostas pela necessidade do ajuste fiscal, foram preservados os
“programas e as ações estruturantes do MEC”. “Em 2015, foi dado mais um
passo importante nesses 13 anos de governos que mantiveram o projeto
educacional de compromisso com a ampliação do acesso e da permanência
nos diferentes níveis de ensino e com a qualidade da educação”, completa
a nota.
Lema “Pátria Educadora” expôs governo
Além de não mostrar realizações para legitimar o lema “Pátria
Educadora”, o governo teve dificuldade de transmitir para a sociedade o
significado do mote. O único momento em que o debate em torno do projeto
veio à tona foi quando o então ministro da Secretaria de Assuntos
Estratégicos Mangabeira Unger divulgou um documento com o título “Pátria
Educadora”. A iniciativa mais expôs a disputa entre Mangabeira e o MEC
do que mostrou caminhos para o setor.
A escolha do lema não passou pelo MEC. Foi uma decisão da presidente
Dilma Rousseff e seus assessores. Dentro da pasta, o comentário era de
que a escolha criara uma pressão constante sobre a pasta.
A divulgação do documento por Mangabeira foi feita logo depois de Janine
Ribeiro assumir a pasta. Pelo teor da proposta — que trazia pontos que
envolvem atribuições do MEC —, criou um mal-estar no governo. Segundo
fontes dentro do MEC, Mangabeira recebera a missão de criar o escopo
conceitual da Pátria Educadora, mas, com pretensões de se tornar titular
da Educação, avançou. Divulgou o documento sem encaminhá-lo ao
ministro.
O texto foi criticado pela maioria dos especialistas.
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