Diálogos obtidos pela Operação Lava
Jato mostram que ministro-chefe da Casa Civil Jaques Wagner teria
ajudado executivo condenado da OAS a negociar liberação de verba quando
era governador
O ministro da Casa Civil Jaques Wagner e o executivo da OAS Léo Pinheiro |
Mensagens de telefone interceptadas por investigadores da Operação Lava
Jato apontam relação do ex-governador da Bahia e atual ministro da Casa
Civil, Jaques Wagner (PT), com o ex-presidente da empreiteira OAS José
Adelmário Pinheiro Filho, conhecido como Léo Pinheiro, um dos condenados
por participação no esquema de corrupção da Petrobrás. Há conversas
diretas entre os dois e também de interlocutores do governo baiano
durante a segunda gestão Wagner (2011-2015) com executivos da empresa.
Os investigadores suspeitam que parte das conversas trate de doações
para a campanha petista na disputa pela prefeitura de Salvador.
O material é mantido sob sigilo em Brasília e na Justiça Federal do
Paraná. Os diálogos foram obtidos pelos investigadores da Lava Jato em
Curitiba (PR) e remetidos à Procuradoria-Geral da República (PGR) por
haver menção ao nome do ministro, que possui foro privilegiado. Até o
momento, não há inquérito aberto no Supremo Tribunal Federal contra ele.
As interceptações são de mensagens de texto trocadas entre agosto de
2012 e outubro de 2014. Nelas, há negociação de apoio financeiro ao
candidato petista à prefeitura de Salvador em 2012, Nelson Pellegrino, e
também pedidos de intermediação de Wagner com o governo federal a favor
dos empresários.
Investigadores colocam sob suspeita trechos cifrados de conversas que
utilizam códigos, apelidos e supostos endereços que, na verdade, indicam
valores pagos, de acordo com as apurações. Jaques Wagner, por exemplo, é
identificado como “JW”. Os responsáveis pela investigação acreditam que
ele também é o “Compositor”, uma referência ao maestro e compositor
alemão Richard Wagner.
O candidato do PT à prefeitura de Salvador em 2012 era Nelson
Pellegrino, citado nas mensagens como “NP” ou “Andarilho”, em alusão a
“peregrino”, trocadilho com seu sobrenome. No primeiro turno daquela
eleição, ele disputou o comando da capital baiana com ACM Neto (DEM) e
com Mário Kertész (então PMDB), identificados nas conversas como
“Grampinho” e “MK”, respectivamente.
Intermediador
No segundo turno, o candidato peemedebista decide deixar o partido, que
aderiu à campanha de ACM Neto, e apoiar Pellegrino. As conversas
interceptadas revelam negociações envolvendo apoio político de Kertész
ao candidato petista no segundo turno e o pagamento das campanhas.
Wagner aparece como intermediador direto das conversas.
Mensagem trocada entre Léo Pinheiro, condenado a 16 anos de prisão por
corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa no esquema
desenvolvido dentro da Petrobrás, e um celular identificado pelos
investigadores como pertencente a Jaques Wagner, no dia 10 de outubro de
2012, mostra suposta conversa com o então governador sobre a negociação
de apoio do PMDB ao candidato petista no segundo turno.
No dia seguinte, quando Kertész marcou coletiva para anunciar sua saída
do PMDB, Pinheiro enviou mensagem a Jaques Wagner. “Assunto MK, preciso
lhe falar. Abs.”. Um pouco mais cedo, Pinheiro havia enviado mensagem a
Manuel Ribeiro Filho. Investigadores suspeitam se tratar de possível
código para efetuar um pagamento. No texto, o executivo escreveu: “O
endereço que filho me forneceu foi M.K. Street 3.600”. A suspeita dos
investigadores é que o número se refira a um valor pago e a sigla “MK”
ao destinatário do dinheiro.
Depois, os executivos da OAS chegaram a comentar: “o valor é muito
alto”, em referência ao número 3.600. Troca de mensagens entre Léo
Pinheiro e Cesar Mata Pires Filho, executivo da empreiteira, mostra que
“JW” estaria ciente do apoio a ser intermediado ao candidato petista.
“O senhor tem alguma programação para Andarilho/Compositor??”,
questionou Pires. “O Compositor me ligou ontem, disse-lhe que estava
fora e que MR iria procurá-lo x MK (saldo). Se resolveríamos parte com o
nosso apoio ao Andarilho ou qual seria a solução?”, respondeu Léo
Pinheiro. “Acho que poderíamos resolver MK como parte do apoio...”,
retrucou Pires. “Vamos aguardar o que JW decide”, completou Léo
Pinheiro. No andamento das conversas, um dos executivos relata que teve
reunião com o “Compositor”, que assegurou que iria “baixar” o montante. A
partir daí, os executivos passaram a discutir números do suposto
pagamento.
Lobby
Os diálogos interceptados dão ideia de proximidade entre o ex-presidente
da OAS e o então governador da Bahia mesmo após as eleições municipais.
O executivo relata ainda encontros com “JW”. Em uma das mensagens, Léo
Pinheiro escreve “Governador, desculpe a 'invasão'”, antes de enviar seu
texto. Jaques responde: “Você é sempre bem vindo JW”. Em outra
conversa, Pinheiro chama o governador de “nosso JW”.
Em 2014, Léo Pinheiro pede ajuda a Jaques Wagner para falar com o então
ministro dos Transportes para “liberar o recurso no valor de R$ 41.760
milhões” referente a um convênio assinado em 2013. “Ok, vou fazê-lo abs
domingo vamos ganhar com certeza”, respondeu Jaques Wagner, cinco dias
antes do segundo turno da eleição presidencial de 2014.
Outro lado
O ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, não respondeu aos
questionamentos feitos pela reportagem até a conclusão desta matéria. O
advogado Edward Carvalho, um dos responsáveis pela defesa de executivos
da OAS na Operação Lava Jato, disse que não iria comentar as
informações. Já Mário Kertész afirmou que é amigo de Léo Pinheiro, mas
que não participou de arrecadação para campanha de Nelson Pellegrino no
segundo turno da disputa municipal em Salvador, tendo oferecido apenas
apoio político. Pelegrino foi procurado por meio de sua assessoria e não
retornou os contatos da reportagem.
Veja abaixo os diálogos interceptados pelos investigadores:
17/10/2012
Situação: Pinheiro fala com fundador da OAS sobre
apoio no 2.º turno da eleição para a prefeitura de Salvador. A conversa
cifrada faz menções a valores para pagar campanhas.
Léo Pinheiro: O Compositor (Jaques Wagner) me ligou ontem, disse-lhe que estava fora e que MR iria procurá-lo x MK (Mário Kertész, candidato do PMDB à prefeitura de Salvador em 2012) (saldo). Se resolveríamos parte como nosso apoio ao Andarilho (Nelson Pellegrino, candidato petista à prefeitura de Salvador em 2012) ou qual seria a solução?
Léo Pinheiro: O valor é muito alto. 3.600 Street Brown
18/10/2012
Situação: Conversa entre executivos da OAS aponta negociações com Jaques Wagner sobre volume de doações para campanha
Manuel Ribeiro Filho: Léo, vou estar com o compositor (Jaques Wagner) às 18. Ele adiou de 14 para 18. Algum conselho especial?
Manuel Ribeiro Filho: Amigos, estive com o figura. Ele falará com MK para deixar depois do evento. Disse que o valor não é real e não pediria para o Leo se soubesse o tamanho. Vai baixar e dividir.
Léo Pinheiro: Ok. Salvador acho que devemos dar +1.
Manuel Ribeiro Filho: A pedida foi +5, me fingi de surdo, depois 2 e acabamos no 1,5. 0,5 agora, deixando +1 para o final. VC ele disse que EV falando com o povo de lá disse que podia ser +0,5. Disse que não havia estimativa e não havia qualquer interesse, exceto atendê-lo. Mas forçou a barra mesmo e fui obrigado a chegar a +0,4.
Léo Pinheiro: Ok, tinha lhe mandando antes de lhe falar. 1,5 + 0,4.
21/10/2014
Situação: A cinco dias do 2º turno das eleições
presidenciais, Pinheiro pede a Wagner para intermediar liberação de
recursos dos Transportes
Léo Pinheiro para Jaques Wagner: Governador, Se for possível, peço seu apoio. Abs.
Varjão: “Léo, é importante que o nosso Gov. JW (Jaques Wagner) fale com o Min. dos Transportes Paulo Sergio para liberar recurso no valor de R$ 41.760 milhões, referente a ressarcimento d convênio TT 026/2008 da Via expressa, objeto o ofício 021/2013/GG assinado por ele em 10/10 de 2013.”
Jaques Wagner: Ok, vou fazê-lo abs domingos vamos ganhar com certeza.
Léo Pinheiro para César Mata Pires Filho: Já falei com JW (Jaques Wagner). Vai ligar para o PS. Bjs
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