segunda-feira, 4 de janeiro de 2016




Desgaste de Lula deixa PT em alerta — petistas já reconhecem que ex-presidente passa por processo de ‘desmitificação’



O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva


A diretoria do Instituto Lula postergou para o início de 2016 a reunião de planejamento das atividades para o ano que se inicia. Desde que o instituto foi criado, em 2011, essa reunião é realizada no fim do ano anterior. Em 2015, isso não foi possível, segundo auxiliares do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, porque a agenda do petista em dezembro foi quase totalmente tomada por medidas defensivas. O episódio ilustra como foi 2015 para Lula, ano em que mais foi alvo de desgaste desde que deixou o Palácio do Planalto.
Depois de ajudar a reeleger sua sucessora, Dilma Rousseff, em uma disputa apertada contra o tucano Aécio Neves, em 2014, o ex-presidente que deixou o governo com o maior índice de aprovação já registrado no Brasil — 87%, segundo o CNI/Ibope — viu seu capital político escorrer pelas mãos em meio a fracassos na economia, erros na condução política do governo, o derretimento político do PT, manifestações nas ruas, ameaça de impeachment de Dilma, investigações envolvendo integrantes de sua família, amigos e o próprio instituto.
Em 20 de junho, durante encontro com líderes religiosos, em São Paulo, o próprio Lula resumiu a situação, com uma de suas tradicionais metáforas: “Dilma está no volume morto, o PT está abaixo do volume morto, eu estou no volume morto”.
Pesquisas mostram que, para o eleitorado, as boas lembranças do governo Lula estão cada vez mais distantes. Segundo o Datafolha, em dezembro de 2010, 71% consideravam o petista o maior presidente da história do Brasil. Em novembro de 2015, essa taxa era de 39%.
Dirigentes petistas admitem, reservadamente, que os acontecimentos de 2015 precipitaram um processo de desmitificação de Lula.
Segundo auxiliares próximos de Lula, o fracasso de Dilma na área econômica e as contradições entre o discurso de campanha da presidente e a prática são suas maiores preocupações. Em conversas recentes, ele teria manifestado incômodo com o impacto da economia nos programas sociais. A um interlocutor, expressou o temor de que o País “volte atrás dez anos” e forças de esquerda tenham de “começar tudo outra vez”.
Por isso, estaria concentrando seus esforços em ajudar Dilma a recompor sua base política (na sociedade e no Congresso), afastar o risco do impeachment e retomar a rota de crescimento econômico para evitar retrocesso na área social. “É a primeira vez que ele não sabe o que fazer”, diz um petista que o acompanha há mais de três décadas.
Mas a principal causa do abalo na imagem do ex-presidente, segundo análises internas do PT, é a aproximação de investigações como Lava Jato e Zelotes a amigos e parentes do petista. Desde que o doleiro Alberto Youssef disse que Lula “tinha conhecimento” do esquema de desvios na Petrobras, aumentou a impressão de que o cerco se fecha em torno do ex-presidente. Embora o juiz da Lava Jato, Sérgio Moro, e o Ministério Público Federal afirmem que Lula não é investigado, seu nome tem sido constantemente citado em relatórios da Polícia Federal e depoimentos.


Envolvimento de filho caçula na Zelotes atingiu Lula


Luis Claudio, filho de Lula, declarou à polícia federal que recebeu
'os valores que foram contratados'


A prisão pela Operação Lava Jato do pecuarista José Carlos Bumlai, que tinha trânsito livre no Palácio do Planalto durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva, é outra fonte de desgaste do ex-presidente. Descrito normalmente como “amigo de Lula”, Bumlai é citado por delatores por ter usado o nome do petista em negociatas.
Mas o principal golpe contra o ex-presidente foi o envolvimento de Luís Cláudio, seu filho caçula, nas investigações da Zelotes, que apura um esquema de venda de medidas provisórias durante o governo Lula. O fato de Luís Cláudio ter recebido R$ 2,5 milhões por um trabalho que, segundo a Polícia Federal, foi feito a partir de cópias da internet, deixou Lula atônito.
Desde que o petista assumiu o governo, em 2003, seu filho mais velho, Fábio Luiz, o Lulinha, que em 2005 recebera R$ 5 milhões da Brasil Telecom, era alvo de falsos boatos na internet. A investigação sobre Luís Cláudio, no entanto, pegou Lula e seu grupo de surpresa. A dificuldade de Luís Cláudio para explicar os recebimentos é motivo de dúvida até entre petistas.
Além disso, o próprio ex-presidente foi chamado a depor na condição de “informante” à Lava Jato, a Receita Federal abriu um processo de fiscalização das contas do Instituto Lula e o Ministério Público de São Paulo passou a investigar a ligação do petista com a reforma milionária de um triplex no Guarujá.
No centro do cerco, Lula virou um boneco batizado de “Pixuleco”, que o retrata como presidiário. Nas manifestações contra o governo e o PT, foi chamado de “bandido”. A sede do Instituto foi alvo de uma bomba caseira e, segundo relatos de petistas, ele tem receio até de circular em locais públicos onde pode ser hostilizado.
Pesquisas internas do PT mostram a forte corrosão na imagem de Lula. Segundo elas, o eleitorado vincula ao petista a crise econômica e as denúncias de corrupção. Já os aspectos positivos de seus oito anos de governo estão cada vez mais apagados da memória dos eleitores.
O partido trata o assunto como uma questão eleitoral. Em agosto o presidente do PT, Rui Falcão, disse que o objetivo da oposição é inviabilizar possível volta de Lula em 2018. No entorno do ex-presidente, a avaliação é de que a oposição não aceita uma nova derrota nas urnas e hoje tem dois caminhos. A curto prazo, o impeachment de Dilma. A médio prazo, minar Lula e o PT por meio da criminalização.
Apesar do cenário negativo, o PT acredita em uma reversão do quadro até 2018. Avaliações que circulam no partido e no Instituto Lula mostram que quando o entrevistado é lembrado das realizações de Lula, a rejeição cai. “É só dar um microfone na mão dele que ele se recupera”, disse Celso Marcondes, um dos diretores do instituto.


Para lembrar: o ex-presidente e as apurações


Segundo o Instituto Lula, o ex-presidente está tranquilo em relação ao aspecto jurídico das citações, mas admite que elas têm sido usadas para desgastá-lo politicamente. “É evidente que existe um processo de desconstrução da imagem do Lula”, disse o jornalista Celso Marcondes, um dos diretores do instituto.

  • Tráfico de influência — Em maio de 2015, o Ministério Público Federal pediu esclarecimentos a Lula, à Odebrecht — alvo da Operação Lava Jato — e ao BNDES sobre suspeitas de tráfico de influência — de 2011 a 2014, Lula teria ajudado a empreiteira a obter contratos no exterior com recursos do banco.
  • Instituto e empresa — A Polícia Federal afirmou em junho de 2015 que a Camargo Corrêa — que já teve executivos condenados na Lava Jato — pagou R$ 3 milhões ao Instituto Lula e mais R$ 1,5 milhão à LILS Palestras, Eventos e Publicidade, empresa do ex-presidente, entre 2011 e 2013.
  • Investigação — A Procuradoria da República no Distrito Federal abriu em julho procedimento de investigação criminal para apurar se o ex-presidente praticou tráfico internacional de influência em favor da Odebrecht. A Procuradoria suspeita que Lula obteve “vantagens econômicas” da empresa.
  • ‘Assuntos BNDES’ — PF citou o nome do ex-presidente nos autos da Lava Jato sobre a Odebrecht. Em relatório sobre interceptação telefônica da 14ª fase da operação, a PF informou ao juiz Sérgio Moro que o ex-presidente conversou com o executivo Alexandrino Alencar, da Odebrecht, em 15 de junho — quatro dias depois do telefonema, Alexandrino foi preso. Segundo o relatório, Lula estaria preocupado com “assuntos do BNDES”.
  • Delator 1 — Em delação premiada, o dono da UTC, Ricardo Pessoa, afirmou que, entre repasses “legais e ilegais” para partidos com a finalidade de “abrir portas” no Congresso e em órgãos públicos, pagou em 2006 R$ 2,4 milhões à campanha de Lula. Pessoa disse, porém, que não sabe se o ex-presidente tinha conhecimento da origem ilegal do dinheiro.
  • Coaf — O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão de inteligência do Ministério da Fazenda, remeteu em agosto ao menos três relatórios diferentes indicando movimentação atípica da empresa do ex-presidente, a LILS, para investigações do Ministério Público Federal e da PF.
  • ‘Informante’ — A PF pediu em setembro ao Supremo que Lula fosse ouvido no inquérito que investiga envolvimento de políticos no esquema de corrupção na Petrobras. O pedido aponta suspeita de que Lula pode ter sido “beneficiado pelo esquema”. O ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no STF, autoriza a PF a colher depoimento do ex-presidente como “informante”.
  • Delator 2 — Fernando Baiano afirmou que Lula se reuniu pelo menos duas vezes com o pecuarista José Carlos Bumlai e com João Carlos Ferraz, então presidente da Sete Brasil — companhia criada pela Petrobras para construção de navios-sonda —, para tratar de negócios intermediados por ele. Segundo Baiano, os encontros ocorreram no Instituto Lula e antecederam a cobrança de R$ 3 milhões por Bumlai para supostamente pagar uma dívida de imóvel de uma nora do ex-presidente.
  • Pagamentos — Laudo da PF apontou que instituições ligadas ao ex-presidente receberam quase R$ 4 milhões da Odebrecht, entre 2011 e 2014. Os pagamentos foram feitos ao Instituto Lula e à LILS. Ainda segundo o laudo, as instituições receberam R$ 17,2 milhões de outras empreiteiras alvo da Lava Jato.
  • Zelotes — No fim de setembro, PF, Receita e Ministério Público Federal cumpriram mandado de busca e apreensão no escritório de Luís Cláudio Lula da Silva, filho do ex-presidente. A ação integrou a Operação Zelotes, que investiga esquema de compra de medidas provisórias para favorecer montadoras de veículos.
  • Depoimento — Em dezembro o ex-presidente prestou depoimentos à PF na condição de “informante” em inquérito que tramita no Supremo para apurar suposta formação de quadrilha por políticos de PP, PT e PMDB para desviar recursos da Petrobras. Ele disse não ter conhecimento sobre os eventos de corrupção ocorridos na estatal e falou em tentativa de “criminalizar” o PT.
  • Amigo preso — No fim de novembro, o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente, foi preso suspeito de intermediar propinas envolvendo contrato do navio-sonda da Petrobras. A PF investiga empréstimo de R$ 12 milhões tomado por Bumlai no Banco Schahin – o real destinatário do dinheiro foi o PT, segundo o empresário.






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