Chile tem maior plantação legal de maconha da América Latina
Iniciativa da Fundação Daya, a plantação chilena deve beneficiar cerca de 4 mil pacientes |
COLBÚN, Chile — Uma plantação de 6.900 mudas tem chamado atenção no
Chile, após sua inauguração oficial, no início deste ano. O motivo não
poderia ser mais nobre e inusitado: trata-se de pés de maconha,
cultivados há pouco mais de dois meses para serem usados como
medicamento por cerca de 4 mil pessoas que fazem terapias para doenças
como epilepsia, câncer e Mal de Parkinson. Esta é a maior plantação da
cannabis sativa na América Latina.
O cultivo é feito na zona rural de Colbún, a 270 quilômetros ao Sul de
Santiago, capital chilena, bem próximo à Cordilheira dos Andes. Apoiada
por 20 municípios do país, a iniciativa foi levada à frente pela
Fundação Daya, ONG que busca terapias alternativas para aliviar o
sofrimento humano.
A organização espera colher 1,5 milhão de toneladas de ervas de cannabis
entre março e maio, sob a supervisão de funcionários do Serviço
Agrícola e Pecuário do governo.
— Esta plantação é uma etapa essencial para a plataforma colaborativa
que objetiva desenvolver a maconha medicinal. No Chile, estamos na
vanguarda dessa questão porque temos a maior safra na América Latina
neste momento — disse Ana Maria Gazmuri, presidente da Fundação Daya.
Ela explica que os pacientes que serão beneficiados são moradores de cada uma das 20 cidades envolvidas no projeto.
— Em cada município haverá uma equipe médica que aplicará todos os
questionários e perguntas relacionadas com o estudo, entregando, em
princípio semanalmente e logo depois quinzenalmente, as doses
correspondentes àqueles pacientes que estão participando — afirmou Ana
Maria.
Trabalhador faz o manejo das plantas de cannabis sativa na maior plantação da América Latina |
PROJETO DE DESCRIMINALIZAÇÃO PATINA NO CONGRESSO CHILENO
Ironicamente, o Chile é conhecido por ser um país conservador. Não à
toa, o divórcio permaneceu ilegal até 2004, e o aborto o é até hoje, em
qualquer circunstância — mesmo em situações de estupro, feto com
anencefalia ou risco de morte para a gestante, três casos em que a
legislação brasileira, por exemplo, permite a interrupção da gravidez.
Com relação à maconha, no entanto, o Chile foi o primeiro país
latino-americano a autorizar o cultivo da planta para fins medicinais, a
partir de um projeto de lei aprovado na cidade de La Florida, em
dezembro de 2014. Na ocasião, a iniciativa pretendia atender 200
pacientes de câncer.
Desta vez, a inauguração da plantação na zona rural de Colbún vem num
momento em que o Congresso chileno patina na discussão de um projeto de
lei para descriminalizar o cultivo de maconha para uso pessoal, tanto
medicinal quanto recreativo. Atualmente, a maconha está classificada
como droga ilícita, e quem for flagrado cultivando para fins não
medicinais ou portando a erva pode ser preso, com penas que vão de cinco
a dez anos.
Isso só foi possibilitado porque, desde o mês passado, o país conta com
uma legislação que autoriza a elaboração e venda de medicamentos com
substâncias derivadas do cânhamo — como a maconha também é conhecida.
Tal norma também foi adotada recentemente por nações como Porto Rico e
Colômbia.
O cultivo da cannabis em grande escala e para uso terapêutico conta com o
apoio técnico da Universidade de Valparaíso, que disponibilizou
especialistas para estudarem as plantas. Também participam do projeto o
Instituto do Câncer do Chile e hospitais públicos, que farão estudos
clínicos com a meta de desenvolver pelo menos três remédios diferentes.
— Claramente, no Chile, estamos vivendo uma mudança nas políticas e na
percepção cidadã. Estamos muito satisfeitos de que esta transformação
esteja ocorrendo agora, quando o mundo vive um ressurgimento da maconha
medicinal — assinala a presidente da Fundação Daya.
Nenhum comentário:
Postar um comentário