quarta-feira, 13 de janeiro de 2016




Dependência do Bolsa Família aumenta com a crise — quanto mais pobre a família, maior o impacto na renda — orçamento do governo para 2016 não dá margem para que reajuste do programa acompanhe a inflação






A previsão de um reajuste abaixo da inflação de 2015 para o programa Bolsa Família neste ano deverá ter um impacto direto na renda das residências mais pobres do Brasil. Considerado o gasto efetivo do ano passado, de R$ 27,7 bilhões, e o orçamento para o programa deste ano, de R$ 28,1 bilhões, o máximo reajuste possível para o benefício será de 1,4%. Sem especificar números, o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) divulgou na semana passada que haverá R$ 1 bilhão a mais para o programa em 2016, o que permitiria uma correção maior, de até 3,7%. Ainda assim, o porcentual ficará bem abaixo do IPCA, índice de inflação oficial do País, que ficou em 10,67% no ano passado, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Durante uma década, o orçamento do Bolsa Família cresceu consistentemente acima da inflação (ver quadro acima), mas a situação se inverteu desde o ano passado, quando o total liberado para o programa subiu só 1,8% em relação a 2014. “O Bolsa Família impacta bastante o consumo e a vida de seus beneficiários, que possuem renda extremamente baixa. Entretanto, o valor desembolsado tem baixa representatividade. Corresponde a aproximadamente 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro”, afirma Renato Meirelles, diretor do Data Popular. Segundo o instituto, 50% dos pagamentos são feitos na região Nordeste do País, que concentra 6,9 milhões do total de 13,9 milhões de beneficiários.
Diante do perfil dos beneficiários, a perda do poder de compra do Bolsa Família deverá impactar justamente a camada mais carente da população. Em 2014, a consultoria Plano CDE, especializada na base da pirâmide, realizou um estudo que subdividiu beneficiários do programa em quatro categorias sociais distintas. Segundo o sócio-diretor da Plano CDE, Maurício de Almeida Prado, o Bolsa Família representava 23% do rendimento doméstico total do mais pobre dos quatro grupos. “O Bolsa Família garante a recorrência de renda para as famílias mais pobres. Nos meses em que o trabalho é escasso, pois a informalidade é alta entre essa população, é o benefício que coloca a comida na mesa”, diz o especialista.
Renda frágil. Com a crise econômica e o consequente aumento do desemprego, a tendência é que as famílias fiquem mais dependentes do programa.
Como a renda varia muito de um mês para o outro, boa parte dos beneficiários do Bolsa Família vive em uma espécie de “gangorra social”, segundo a consultoria Plano CDE. Um indivíduo da classe D pode passar para a classe E conforme a variação dos ganhos dos “bicos” em um determinado mês. É por isso, segundo André Torretta, fundador da A Ponte Estratégia, outra consultoria especializada na baixa renda, que uma perda real no benefício, mesmo que pequena, pode fazer muita diferença na vida desse público. “Para o contingente mais pobre, R$ 20 podem ser equivalentes a três dias de alimentação.”
Trabalhando há mais de uma década com projetos envolvendo as classes C e D, Torretta diz que a informação sobre o fim da bonança econômica dos últimos dez anos ainda não foi totalmente absorvida pela população de baixa renda. Para ele, esse é um processo que deve durar cerca de cinco anos. Ao fim deste prazo, explica ele, as conquistas dos tempos de vacas gordas — como os eletrodomésticos — chegarão ao fim da vida útil. “Hoje, essas famílias já estão apertando o cinto, mas, em relação à extensão da crise, a ficha não caiu totalmente.”






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