domingo, 9 de agosto de 2015


Como surgem as notas frias

Samy Dana
Você roubaria R$ 10 do caixa da sua empresa? Provavelmente não. No entanto, é comum ouvir o taxista questionar o valor que você deseja colocar no recibo. Caso você nunca tenha passado por essa cena, ela pode parecer um pouco surreal, mas a pergunta está relacionada à prática de pedir um valor mais elevado do que o gasto efetivamente na corrida para "receber" alguns trocados a mais na hora de entregar todos os recibos corporativos do mês.
Você paga R$ 15 pela corrida, mas fica com um recibo de R$ 25 - e ganha R$ 10 na operação.
O resultado final para a empresa é o mesmo - você se apropriou de R$ 10 da empresa. No entanto, como a ação não envolve você desviar os recursos ou retirar uma parte de um pagamento recebido pela companhia, a sensação é diferente.
O economista comportamental Dan Ariely explica: "Quando olhamos o mundo a nossa volta, grande parte da desonestidade que vemos envolve trapaças a um passo de distância do dinheiro. As empresas trapaceiam nos métodos de contabilidade; os executivos trapaceiam nas opções de ações com datas retroativas; os lobistas trapaceiam patrocinando festas para os políticos; os fabricantes de remédios trapaceiam pagando férias caras para médicos e esposas. Com certeza, essa gente não trapaceia com dinheiro vivo (a não ser ocasionalmente) e esta é a questão: trapacear é muito mais fácil quando se está a um passo de distância do dinheiro".
Para comprovar a sua tese, fez um experimento em um dos dormitórios do MIT. Colocou meia dúzia de latinhas de Coca-Cola em uma das geladeiras comunitárias do alojamento e um prato com seis notas de R$ 1 em outra. Em 72 horas, as Coca Colas haviam desaparecido, mas as notas de dinheiro continuavam lá.
O resultado mostra que para nós é mais fácil trapacear com objetos não-monetários do que quando a situação envolve dinheiro. O que está por trás disso é a racionalização. É mais fácil pensar em todas as latinhas de refrigerante que você já deixou na geladeira e que acabaram sumindo e que, por isso, não tem problema pegar uma latinha que apareceu na geladeira, do que encontrar uma boa explicação para pegar notas de dinheiro que não são suas.
A diferença, explica Ariely, não é o preço do item ou o medo de ser pego, mas a "capacidade das pessoas de justificar o item para elas mesmas". Em outro estudo, ele descobriu que se não é você que faz os seus relatórios de despesas, e sim um auxiliar administrativo ou secretária, fica ainda mais fácil de incluir "notas frias". Quanto mais distante você está do ato, mais chances você tem de trapacear.


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