A inflação das tarifas bancárias
Preços de tarifas e serviços de bancos sobem acima da inflação — reajustes em serviços podem passar de 100%
Os balanços do primeiro semestre divulgados pelos maiores bancos do país
mostram com mais nitidez o que os clientes já estão sentindo no bolso
há algum tempo: o preço das tarifas e serviços cobrados por essas
instituições tem subido muito além da inflação, ajudando a inflar os
ganhos do setor financeiro. Em alguns casos, esses aumentos superam os
100%. É o caso da Cesta Exclusiva Fácil, do Bradesco, cujo valor passou
de R$ 27,40 em março do ano passado para R$ 48 em fevereiro deste ano e
agora custa R$ 61,90 — o que representa uma alta de 125,9%. No período, a
inflação medida pela IPCA foi de 13%.
No BB, o pacote Modalidade 50 foi de R$ 31,50, em 2013, para R$ 49,15 em
fevereiro passado e, atualmente, o banco cobra pelos mesmos serviços R$
54,95 — alta de 74,44%. Já o MaxiConta Itaú Eletrônica, que custava R$
11,10, passou para R$ 13,90 no ano passado e agora sai por R$ 16,50, o
correspondente a uma alta de 48,64%.
Agência do Bradesco no Rio: pacote Cesta Exclusiva Fácil do banco passou de R$ 27,40 em março do ano passado para R$ 61,90 hoje |
46% NÃO SABEM QUANTO PAGAM
A compilação dos preços nos sites dos bancos considerou os mesmos
pacotes de serviços incluídos numa pesquisa do Instituto de Defesa do
Consumidor (Idec), que comparou valores cobrados entre março de 2014 e
fevereiro de 2015. Atualmente, alguns destes pacotes não estão mais
abertos a novas contratações, segundo os bancos, mas continuam
disponíveis aos clientes que tinham aderido no passado. Além de
operações básicas como saques, extratos e transferências entre contas,
nestes pacotes “livres” estão incluídos outros serviços como envio de
DOC ou TED, alerta por SMS e folhas de cheque.
— No momento em que perdem escala com crédito, os bancos recompõem uma
das vertentes de ganhos carregando nas tarifas. Mudam os nomes dos
pacotes periodicamente para confundir o cliente e cobrar mais — diz
Carlos Thadeu de Oliveira, gerente técnico do Idec.
Um levantamento do Idec com 246 internautas mostrou que 46% não sabem
qual é seu pacote de serviços nem quanto pagam. Oliveira lembra que
existe um pacote de serviços essenciais, gratuito, por determinação do
BC, e que atende às necessidades da maioria, oferecendo saques, cheques e
extratos. Há também os padronizados pelo Conselho Monetário Nacional
(CMN), que incluem itens como transferências e mais folhas de cheque.
São mais em conta que os pacotes “livres”, com preços entre R$ 9,50 e R$
10,50. Mas os bancos divulgam pouco essa cesta, o que leva menos gente a
usá-las, diz o Idec.
No chamado pacote “1” de serviços padronizados, os aumentos também
ocorreram, mas ficaram abaixo da inflação. Levantamento da Fundação
Instituto de Pesquisas Econômicas (Ipead), da Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG) mostrou que houve reajuste em quatro bancos: CEF,
Bradesco, Itaú Unibanco e Santander. Em média, o reajuste foi de 4,8%
para uma inflação de 13%, no período de março de 2014 até julho deste
ano.
A pesquisa do Idec mostrou que os reajustes foram mais frequentes nos
pacotes de custo intermediário, os mais usados pelos clientes, segundo a
instituição. Segundo cálculos da Austin Rating, as receitas totais com
serviços de Itaú, Bradesco e Santander avançaram 11,7% no período,
somando R$ 32,4 bilhões, contra R$ 29,0 bilhões de janeiro a junho de
2014.
‘MOVIMENTO HOMOGÊNEO DE ALTA’
No Bradesco, as receitas com prestação de serviços, onde se incluem as
tarifas, somaram R$ 11,8 bilhões no primeiro semestre, alta de R$ 1,251
bilhão em relação ao mesmo período de 2014 (crescimento de 13,4%). Já o
ganho do Itaú nesse item foi de R$ 14,9 bilhões nos primeiros seis meses
do ano, avanço de 12,2%. No Santander, o avanço foi de 7,9% no
semestre, totalizando R$ 5,7 bilhões. Os ganhos com serviços
representaram, na média, 15% da receita dos bancos.
Especialistas avaliam que, sem fiscalização do Banco Central e com
diversos pacotes com nomenclaturas diferentes (o que torna mais difícil
uma comparação pelos clientes), os bancos ficam livres para fixar o
preço que desejam. Para Luis Miguel Santacreu, analista de bancos da
Austin Ratings, além da alta dos preços, o aumento da base de clientes
eleva o ganho dos bancos com tarifas. Cerca de 60% da população já
possuem conta em banco, um crescimento de três pontos percentuais em
relação a 2013:
— O governo tentou padronizar a cobrança de tarifas, criando uma cesta
de pacotes básicos. Mas são como os planos de saúde mais simples: só
oferecem gaze e mercúrio (saques e extratos) aos clientes. Com outras
milhares de tarifas e vários pacotes de serviços, a padronização fica
difícil, e cada banco cobra do seu jeito.
Mesmo nas operações de crédito, lembra João Augusto Salles, analista de
bancos da consultoria Lopes Filho & Associados, há incidência de
tarifas, o que eleva a receita de serviços. Ele lembra que os bancos
podem reajustar as tarifas a cada seis meses, conforme determinação do
BC.
— Os bancos fazem um movimento homogêneo de aumento de tarifas. Quando
os juros baixaram, reduzindo a margem de ganho, tiveram que alinhar
esses preços — diz Salles, citando a concentração do mercado brasileiro,
que agora tem apenas cinco grandes bancos.
O professor de Escola de Economia da USP de Ribeirão Preto, Alberto
Borges Matias, e sócio da ABM Consulting, diz que mesmo num cenário de
crise, com oferta de crédito mais fraca, os bancos continuam ganhando:
— Os juros altos (a Selic está em 14,25% ao ano) também são repassados
aos clientes nos empréstimos, como mostraram os balanços divulgados até
agora indicando maiores ganhos nas operações de empréstimos.
Para o consultor de investimentos do Banco Ourinvest, Mauro Calil, o
consumidor precisa ficar atento às taxas. Se avaliar que o pacote
gratuito atende às suas necessidades, Calil recomenda escrever carta de
próprio punho pedindo a contratação do serviço sem a cobrança de
tarifas:
— Quando o consumidor pede esse pacote, que estabelece gratuitamente o
básico, o banco normalmente o faz desistir, propondo mais serviços.
Entretanto, 98% dos clientes fazem as transações via internet. É muito
raro o cliente ir à agência falar com o gerente.
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