Mais resistente, 'supergonorreia' deixa
autoridades em alerta
O medo de uma tal de supergonorreia tem deixado autoridades de saúde do mundo todo de cabelo em pé.
A bactéria causadora da doença, antes considerada um tanto boba e
inofensiva, já mostra sinais de resistência aos antibióticos disponíveis
e fez acender um sinal de alerta em vários países, incluindo o Brasil.
Desde 2008, o número de casos de gonorreia na Europa cresceu 79%,
segundo relatório recente do Centro Europeu de Prevenção e Controle de
Doenças. Nos EUA, os casos aumentaram 8,2% entre 2009 e 2013.
Com mais bactérias circulando por aí e, portanto, mais antibióticos
sendo usados contra elas, aumenta a pressão seletiva para que sobrem
apenas as mais resistentes, lembra Ralcyon Teixeira, supervisor do
pronto-socorro do Instituto de Infectologia Emilio Ribas, em São Paulo. O
uso indevido de antibióticos também contribui.
Neste ano, a Inglaterra registrou um surto de gonorreia resistente ao
antibiótico azitromicina no norte do país, segundo a Associação
Britânica de Saúde Sexual e HIV. Japão, França e Espanha registraram nos
últimos anos casos de gonorreia resistente ao medicamento padrão, a
ceftriaxona. E estudo publicado na revista "New England Journal of
Medicine" relatou uma nova cepa de bactéria resistente na Austrália.
Nos EUA, pesquisadores dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças já
estão até sequenciando o DNA da bactéria para fazer testes que digam
rapidamente se a infecção do paciente é resistente a essa ou aquela
droga.
"A gonorreia sem tratamento é inevitável, só uma questão de tempo",
disse Colm O'Mahony, consultor de medicina geniturinária no Countess of
Chester Hospital (Inglaterra), em palestra no Congresso Europeu de
Dermatologia, em Copenhague. "E a indústria não está interessada em
desenvolver novos antibióticos."
De fato, o investimento em antibióticos, de forma geral, tem caído. Em
2008, 8 das 15 grandes farmacêuticas haviam abandonado seus programas de
descoberta de antibióticos e duas delas tinham feito cortes nessa área
na década passada, segundo a Organização Mundial da Saúde.
Isso porque as pesquisas são caras e a resistência bacteriana pode
diminuir o tempo de vida das drogas. Antibióticos são usados por pouco
tempo, ao contrário de remédios para doenças crônicas, e ainda há
remédios genéricos que conseguem tratar a maioria das infecções.
No Brasil, um novo protocolo de tratamento, lançado pelo governo há duas
semanas, passou a contraindicar o uso do antibiótico ciprofloxacina
(até então o tratamento padrão, de dose única e oral) contra a gonorreia
nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Estudos nesse locais demonstraram a circulação de cepas de gonococos
resistentes ao medicamento. A recomendação agora é usar uma droga
injetável mais nova, chamada ceftriaxona.
Segundo Adele Benzaken, diretora adjunta do Departamento de DST, Aids e
Hepatites Virais do Ministério da Saúde, o governo já iniciou um estudo
nacional, em duas capitais por região, para verificar se há cepas
resistentes também em outros Estados.
Há ainda um projeto de notificar os casos de gonorreia em homens — nas
mulheres, em geral a doença é assintomática —, o que permitirá estimar
se os casos têm crescido ou aumentado no país. Hoje, não há esses dados.
Quem trabalha em pronto-socorro, porém, percebe um aumento de casos na
prática — não só de gonorreia, mas também das outras infecções
sexualmente transmissíveis.
"A impressão é que as pessoas estão se protegendo menos. Estamos na era
do sexo sem camisinha", diz Ralcyon Teixeira, do Emilio Ribas. "Em
grande parte é por causa da impressão de que a Aids virou 'apenas' uma
doença crônica, mas sabemos que não é assim. E outras doenças, como a
gonorreia, continuam por aí."
HOMENS > Geralmente o primeiro sintoma é dor ao urinar. Depois de alguns dias, aparece o corrimento uretral com pus. A doença pode se agravar e causar infecção nos testículos e até esterilidade |
MULHERES > Na maioria das vezes é assintomática. Mas pode causar corrimento e complicações mais graves, como infecção nas tubas uterinas, doença inflamatória pélvica e esterilidade |
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