quarta-feira, 16 de março de 2016


Com o 'messias' Lula, Dilma tenta autogolpe.





Em condições normais, os suspeitos costumam ser expurgados dos governos. Sob a anormalidade que passou a reger sua ex-gestão, Dilma rebaixa todos os padrões éticos. Lula chega ao quarto andar do Palácio do Planalto arrastando as correntes dos processos em que é investigado por corrupção, tráfico de influência, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica.
Os ministros do STF frequentemente acham que estão sentados à direita de Deus. Ao fugir da caneta de Sérgio Moro para refugiar-se atrás do biombo celestial do foro privilegiado — agora convertido em 'desaforo privilegiado' — Lula trata o Supremo como uma espécie de Casa da Mãe Joana de toga, reduzindo-o ao patamar de tribunal de quinta instância.
Não é só: Lula chefiará a articulação política do governo e projetará sua sombra sobre toda a Esplanada, especialmente sobre a pasta da Fazenda. Depois de acusar os rivais de tramar um golpe, Dilma recorre a um autogolpe. Lula entrará pela porta dos fundos numa espécie de terceiro mandato. Ao patrociná-lo, Dilma como que exerce um dos poucos privilégios que ainda lhe restam — o privilégio de escolher seu próprio caminho para o inferno. Com o governo esfarelando-se, Dilma atrelou seu destino ao de Lula, divorciando-se definitivamente das ruas.
No último domingo (13.mar.2016), o asfalto roncara sobretudo para exigir o impeachment de Dilma e prestigiar Sérgio Moro, cacifando-o para punir inclusive Lula ‘Jararaca’ da Silva. Em resposta a essas demandas, Dilma resolveu unir o inútil ao desagradável: para se manter no cargo, concede à serpente o foro privilegiado dos ministros, livrando a cobra criada do PT dos rigores do juiz da Lava Jato.
O movimento é inútil porque, ainda que consiga deter o impeachment, o máximo que Lula fará por Dilma é acomodá-la no verbete da enciclopédia como a primeira pessoa na história a se tornar ex-presidente ainda no exercício da Presidência. É desagradável porque a presença de Lula na Esplanada, além de não ser um bom exemplo, é um péssimo aviso: o governo entrou na fase do vale-tudo.
Tomado pelo que se diz dele no Planalto, Lula retornará a Brasília para operar milagres. Na política, promete reagrupar o bloco partidário que dava suporte aos governos petistas no Congresso. Na economia, acena com uma reviravolta capaz de abreviar a retomada do crescimento. Falta combinar com a lógica.
Quando ainda era um presidente da República popular, Lula só conseguiu apoio no Congresso comprando aliados com o dinheiro sujo do mensalão e do petrolão. Os parlamentares governistas continuam com o mesmo código de barras na testa. Mas o governo, com a força-tarefa da Lava Jato no seu encalço, já não pode remunerá-los como antes.
Retratado nas ruas como um boneco-presidiário batizado de Pixuleco, investigado por corrupção, tráfico de influência, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica, Luís Inácio já não é o mesmo Lula da Silva. É nessa condição de ex-Lula que terá de convencer o PMDB, por exemplo, de que é mais negócio permanecer com Dilma do que colocar na cadeira dela o correligionário Michel Temer, seu substituto constitucional. A contabilidade do impeachment favorece Dilma. Para aprovar o pedido na Câmara, os antagonistas do governo precisam reunir 342 votos. Para barrar o impedimento, o Planalto tem de juntar apenas 171 votos.
Na economia, a guinada defendida por Lula e seus devotos no PT passa pelo abandono de projetos como a reforma da Previdência e de estratégias como o rigor fiscal. Tudo em nome de uma hipotética retomada do crescimento ainda em 2016. Como se fosse possível colher bons indicadores sem plantá-los.
De resto, a aposta do Planalto na capacidade de Lula de fazer e acontecer desconsidera o fato de que a Lava Jato introduz na conjuntura muitas surpresas, espantos, choques, assombrações e uma certa dose de ‘sim senhor, quem diria?!?’. Aos pouquinhos, a turma de Curitiba vai fechando o cerco. E já estão no forno novas delações.
Fica-se com a impressão de que Dilma, vendida em 2010 como gestora genial, passará a dispor não de um ministro providencial, mas de um cúmplice full time. De certo mesmo, a conversão de Lula em superchefe propiciará uma perda na dignidade da Presidenta que, convencida a entregar ao antecessor o futuro dos escombros que restaram do seu governo, rebaixa sua autoridade por meio de um autogolpe.




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