PT criou propina descontada no contracheque e não quer ser ‘criminalizado’
Polícia Federal à frente do diretório nacional do PT, no centro de São Paulo. |
Desde que explodiu a Lava Jato, há dois anos e três meses, o país
procura um significado maior de qualquer coisa que resuma essa época. Os
brasileiros do futuro talvez selecionem como um destes episódios
maiores o assalto do Partido dos Trabalhadores aos aposentados e
servidores públicos endividados. Dirão que foi um fato histórico porque
só então, com a invenção da propina descontada no contracheque, o PT
atingiu o ápice do despudor e da desfaçatez.
O consignado, como se sabe, é um tipo raro de empréstimo. É bom para
quem toma dinheiro emprestado porque as taxas de juros são baixas. É
ótimo para o banco que empresta porque a prestação é descontada
mensalmente do salário do servidor ou da pensão do aposentado. No
aperto, milhares de brasileiros aproveitaram. E tornaram-se, sem saber,
uma oportunidade que o PT aproveitou.
Entre 2010 e 2015, os milhares de brasileiros que se penduraram no
consignado pagaram uma taxa de administração inusual. Estava embutida em
cada parcela mensal a cifra de R$ 1,25. Dinheiro destinado a um
intermediário chamado Consist Software, contratado pelo Ministério do
Planejamento a pretexto de administrar o serviço.
Descobriu-se que a Consist retinha em sua caixa registradora apenas R$
0,40. Os outros R$ 0,85 viravam propina. De centavo em centavo, foram
assaltados R$ 100 milhões. Perto dos bilhões pilhados na Petrobras e no
setor elétrico, parece dinheiro de troco. No entanto, entre todos os
roubos praticados na era petista, foi esse que acabou com o que restava
do melhor legado daquele ex-PT da fase sindical: a sensibilidade social e
o respeito ao trabalho.
Andrey Borges de Mendonça, um dos 30 procuradores da República que se
ocupam da investigação, resumiu o descalabro: “R$ 100 milhões foram
desviados de funcionários públicos e pensionistas endividados, que se
privaram de medicamentos, e de suas necessidades básicas para abastecer
os cofres de corruptos. Isso tem que nos causar indignação, isso não
pode ser algo natural da nossa sociedade.”
O que mais assusta na marcha da política rumo à delinquência não é a
crueza, mas a hipocrisia. No gogó, o petismo é avesso à privatização.
Para incrementar as propinas, admite qualquer negócio. Dispunha de uma
empresa pública, o Serpro, para organizar o consignado. Preferiu
privatizar o serviço, direcionando-o à Consist. Nada mais natural.
Se a pregação de líderes pseudoesquerdistas como Lula havia ensinado
alguma coisa era a não esperar nenhum tipo de hesitação altruísta do
capital. Ele opera segundo as regras fixadas na Lei da Selva.
No futuro, quando puderem analisar a conjuntura atual sem ter de tapar o
nariz, os brasileiros concluirão: o que assustou as almas mais ingênuas
foi a facilidade com que se operou a autodissolução do PT como partido
político e a rapidez com que a legenda estruturou a coalizão que dava
suporte aos seus governos como uma lucrativa organização criminosa.
A sujeira prosperou tanto que acabou desenvolvendo no Brasil a indústria
da limpeza ética, cujo principal empreendimento é a Lava Jato.
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