quarta-feira, 1 de junho de 2016

Nova lei permite criação de peixes não nativos nos rios da Amazônia — governo do Amazonas sancionou texto sem consulta a órgãos federais — especialistas falam em risco incalculável ao meio ambiente



Encontro do Rio Negro com o Rio Solimões, próximo a Manaus
fauna local seria afetada com nova autorização


Milhares de espécies de peixes que habitam os rios amazônicos podem estar com seus dias contados. Sem realizar consultas a órgãos federais, instituições ligadas ao meio ambiente ou mesmo à população, o governo do Amazonas decidiu sancionar uma lei que permite a criação de peixes não nativos em rios que cortam o Estado do Amazonas.
Pelo texto da lei ordinária 79/2016, sancionada na segunda-feira, 30.maio.2016, pelo governador José Melo (PROS), fica liberado o cultivo de espécies exóticas nos rios da região, bastando uma autorização do órgão estadual competente. A lei permite ainda o barramento de igarapés e a autorização de empreendimento de criação em áreas de preservação permanente, “quando de interesse público”.
O risco é incalculável, segundo especialistas. Toda a literatura científica e ambiental que trata do tema alerta para os riscos de introdução de peixes não nativos em áreas de extrema riqueza em sua ictiofauna, como é o caso da Amazônia.
O presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Rômulo Mello, disse que só soube há pouco da lei e que tomará medidas cabíveis contra a proposta. “Vamos ter que tomar as providências jurídicas cabíveis. A Amazônia tem centenas de espécies da ictiofauna. Essa lei significa prejudicar uma das maiores riquezas que a gente tem”, disse Rômulo.
"O governo federal como um todo também deve questionar, porque isso mexe com atribuições da Secretaria de Pesca e do Ministério do Meio Ambiente, além do ICMBio. É um impacto enorme. A introdução de espécies exóticas pode ser a destruição dos peixes nessa região.”
Segundo Nurti Bensusan, especialista em biodiversidade do Instituto Socioambiental (ISA), trata-se de uma lei de consequências graves e irreversíveis. “Isso é uma coisa sem volta. O resultado da introdução de espécies, como a tilápia, por exemplo, é deslocar outras espécies, que simplesmente desaparecem. São problemas incalculáveis, que podem comprometer profundamente a biodiversidade. As coisas estão interligadas. É simplesmente chocante.”

Moção de repúdio — Representantes de diversos órgãos públicos e instituições ligadas ao meio ambiente enviaram uma moção de repúdio ao Ministério Público Federal no Amazonas, para que o órgão pressione o governo estadual revogue a lei e abra discussões sobre o assunto.
O documento é assinado por especialistas e técnicos do ICMBio, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), WCS, Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Ibama, Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e GSA Consultoria e Meio Ambiente.
Enviado ao procurador do MPF Rafael da Silva Rocha, o texto lembra que, às vésperas do dia 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, o governo do Amazonas protagoniza “mais um episódio de retrocesso, sem embasamento técnico e com pouco ou nenhum conhecimento dos impactos e problemas ambientais” que a lei pode causar.
“Atualmente, deveríamos valorizar o fato da Amazônia ainda estar livre de espécies exóticas de peixes com populações estabelecidas, o que ocorre em todos os demais biomas do País (e em boa parte do mundo) há bastante tempo, sem a possibilidade de reversão ou envolvendo custos para controle e erradicação das mesmas”, afirma o documento.
Em outro trecho, alerta que “a introdução de espécies não nativas é processo que tem induzido a um complexo processo de degradação dos ecossistemas, de forma comprovada, com vários exemplos ao redor do mundo”.
Os especialistas ressaltam ainda que o Brasil tem atuado em parceria com países vizinho para, justamente, combater a introdução de peixes exóticos na região amazônica.




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