Especialistas criticam política de desonerações do governo
e veem distorções
e veem distorções
Na mira do governo entre as ações para resgatar o equilíbrio das
contas públicas, as chamadas desonerações ainda contam com mais de
30 programas de alívio tributário em vigor. Na lista, além da
conhecida redução do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI)
para máquinas e tanquinhos de lavar roupas, constam benefícios
inusitados, como a redução do IPI sobre concentrado para elaboração
de refrigerantes e até uma redução a zero desse mesmo imposto para
néctar de fruta, benefícios concedidos em 2012. As chamadas “bebidas
frias”, aliás, são contempladas com a renúncia de tributos em vários
outros itens, como a redução de aumentos previstos de IPI, PIS e
Cofins para refrigerantes, cerveja e até a alíquota zero de PIS
Cofins para água mineral.
‘LOBBY’ DAS EMPRESAS — Esse tipo de desoneração “seletiva” é
criticado pelos economistas, por distorcer as condições competitivas
e desestimular a busca de competitividade pelas empresas.
— Assistimos nos últimos seis anos a um governo extremamente
sensível a grupos de interesse — diz Marcos Lisboa, presidente do
Insper, ironizando os critérios que nortearam a escolha dos
beneficiários das desonerações.
Na lista da Receita Federal de desonerações instituídas nesses anos,
também é possível encontrar reduções de IPI para lã de aço e papel
sintético. Em vigor desde 2011, tais concessões têm prazo
“indeterminado” para expirar. Há também benefício fiscal para alguns
produtos tipicamente brasileiros, caso do charque e do queijo reino.
Entre as desonerações concedidas no rol de ações anticíclicas de
governos recentes, e que já deixaram de vigorar, havia itens como
papéis de parede, luminárias e lustres, pisos laminados, de madeira,
vinílicos e placas de gesso. Todos com alívio na carga de IPI.
Rafael Bistafa, economista da Rosenberg Associados, concorda com
Lisboa e diz que esses exemplos inusitados ilustram bem o poder de
lobby de grandes empresas e entidades setoriais bem articuladas.
— As desonerações nos últimos anos foram dadas a quem as solicitou —
afirma Bistafa, em tom de crítica.
Para Lisboa, revisar as desonerações seria um caminho correto e
fundamental para a retomada do crescimento, sobretudo para a
indústria. E a estratégia ideal para corrigir essas distorções, diz,
passa pela adoção de “regras horizontais e comuns para todos” os
setores.
— Deve-se tratar os iguais como iguais. Isso simplifica a carga
tributária e evita o contencioso tributário que hoje prejudica
muitas empresas do setor produtivo, que têm que lidar com uma imensa
confusão de regras — diz Lisboa.
Os economistas concordam sobre as distorções que as desonerações
seletivas produzem no ambiente econômico, mas divergem quanto à
possibilidade de uma correção imediata do problema. Raul Velloso,
especialista em contas públicas, por exemplo, não vê dificuldades
para o novo governo rever esses benefícios e diz que isso deve ser
feito o quanto antes para que a economia “entre no eixo".
— Escolher um ou dois setores gera distorção e deixa nosso sistema
tributário ainda mais complexo — acrescenta.
Na avaliação de Rafael Bistafa, economista da Rosenberg Associados,
diante das dificuldades em reequilibrar as contas públicas, os
principais alvos do governo de Michel Temer deveriam ser as
desonerações da folha de pagamento, da Cide (imposto que incide
sobre os combustíveis) e do IPI para eletrodomésticos e da cesta
básica, que são as que mais trazem perda de receitas ao governo. Ele
lembra, porém, que esses programas já foram alvos do ex-ministro
Joaquim Levy, que fracassou ao tentar revogá-los no Congresso.
A retirada de benefícios, pondera Macos Lisboa, do Insper, precisa
ser gradual, uma vez que as empresas beneficiadas tomaram decisões
empresariais e de negócios com base nessas regras:
— Seria importante ter uma regra de transição, não muito longa, mas
que permitissem que as empresas pudessem se ajustar às novas regras.
IMPOSTO REDUZIDO POR LIMINAR — Um caso que ilustra bem a
complexidade gerada pelo emaranhado de critérios de desonerações é o
da indústria de eletroeletrônicos. Em agosto de 2014, no âmbito da
Lei do Bem, os fabricantes de itens de informática (computadores,
notebooks, celulares e tablets) tiveram a isenção do PIS/Cofins. Um
ano depois, em setembro de 2015, unilateralmente, o governo decidiu
editar a medida provisória 690, revogando as isenções, que
beneficiavam nada menos que 600 dos 1.200 produtos fabricados pelo
setor.
A Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee)
recorreu à Justiça e venceu em primeira instância. O processo ainda
tramita, mas o Congresso votou a MP 690 derrubando o benefício.
Depois disso, a Abinee recorreu ao Tribunal Regional Federal (TRF) e
conseguiu liminar para suspender os efeitos da MP.
— Esse vaivém de regras é um problema sério que temos enfrentado,
principalmente a partir do ano passado. Esta é a tal insegurança
jurídica, que prejudica investimentos e faz com que sejamos vistos
como um país pouco sério — diz Humberto Barbato, presidente da
Abinee.
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