domingo, 27 de julho de 2014


‘Só melhorar distribuição de renda não leva país a mudar de patamar’, diz Pedro Saffi

Pedro  Saffi

A distribuição da renda sozinha não será capaz de reduzir as desvantagens do Brasil, que avançou uma posição apenas no “ranking” mundial do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) em relação a outros países, ocupando o 79º. lugar entre 187 países. Esta é a avaliação do professor do Departamento de Finanças da Cambridge Judge Business School, Pedro Saffi. Ele disse que a educação, indicador que permaneceu estagnado no país, é uma das mazelas do crescimento econômico e que a falta dela perpetua a concentração da renda.

DESIGUALDADES
O fim da inflação após o Plano Real teve um choque positivo nas desigualdades, assim como as políticas sociais dos governos do PT, com destaque para o bolsa família. Por estas razões, o Brasil foi um dos poucos países do mundo em que as desigualdades caíram de maneira significativa na última década. Se olharmos as taxas de crescimento da base da pirâmide, a renda das pessoas teve uma taxa de crescimento chinesa. A renda dos mais ricos também subiu, mas a dos mais pobres cresceu muito mais depressa. Mas isso sozinho não é capaz de reduzir as desvantagens brasileiras.

EDUCAÇÃO
A diferença em relação a outros países ainda é muito grande. Apesar da melhor distribuição de renda dos últimos 10 anos, outros problemas começam a bater na porta. E a educação é um deles. A escolaridade média - e a esperada, que é a da geração atualmente na escola - está basicamente estagnada desde 2000. Há uma massa muito grande de pessoas que têm educação baixa e, por isso, a produtividade é baixa. O retorno do trabalho é baixo. Obviamente, no longo prazo, isso dificulta uma queda maior na desigualdade. A renda fica mais concentrada nas pessoas melhores educadas, que têm melhores perspectivas. Isso torna a sociedade mais rígida do ponto de vista da mobilidade entre as classes.

NÃO FALTA DINHEIRO
O problema do Brasil não é mais falta de dinheiro. Enquanto não melhorarmos a educação, não há como sair da categoria de país de renda média para um de primeiro mundo. A Coreia, que era o país com os piores índices de educação na década de 1960 tem hoje um dos melhores ensinos do mundo. Enquanto 40% da geração com 60 anos de idade têm o ensino médio, a de 30 tem 100%. No Brasil, esses percentuais passaram de 25% para 50%, mas a qualidade segue sendo muito ruim. Quando se fala em faculdade, é ainda pior. No Brasil, a geração de 60 anos com nível superior é de 10%, enquanto a que atualmente tem 30 anos, está em 13%. Na Coreia, passa de 14% para 65%, respectivamente. A média do G20 está em 40% para os mais jovens.

LONGO PRAZO
Não há como mudar o IDH significativamente de uma hora para outra. E há outros países que também avançam. O fato é que o tamanho das desigualdades no Brasil é tal que só melhorar a distribuição de renda não é suficiente para levar o país para o mesmo patamar de outras nações. A mudança na educação, por exemplo, só ocorrerá de uma geração para outra. Essa geração que hoje tem entre 10 e 15 anos é meio perdida, porque não houve muitas reformas nessa área. Se eles não estão bem agora, não vai ser a faculdade que vai torná-los muito melhores. As mudanças custam a ter efeito e só perpetuam nossa desigualdade social

CRESCIMENTO
A falta de educação é uma das maiores mazelas do país hoje e um dos responsáveis pelo crescimento tímido da economia brasileira e da sua baixa competitividade, além da carga tributária e da falta de infraestrutura. No longo prazo a lista de desafios é tão grande que é quase impossível resolvê-los um a um. É essencial a melhoria na qualidade na educação para que o Brasil possa competir com outras nações. Nossa mão de obra é, na média, pessimamente qualificada em todos os níveis e, infelizmente, sem grandes perspectivas de melhora. A expansão no acesso à educação não foi acompanhada por qualquer melhora significativa de qualidade. Corremos o risco de ficar eternamente dependentes da exportação de commodities enquanto os outros países emergentes se tornem competitivos em setores de alta tecnologia por conta da falta de investimento em educação.

PRÓXIMO GOVERNO
O próximo governo, seja ele qual for, terá que fazer um ajuste muito forte, como uma freada de ônibus, reorganizar a economia. O modelo baseado na expansão do consumo funciona por algum tempo, mas, se não se planta a semente das reformas, perde-se a oportunidade. Nossa maria fumaça perdeu um pouco a força.

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