Às 17h14 da sexta-feira, 18 de março, um agente da Polícia Federal que atua na cidade paranaense de Guaíra, fronteira com o Paraguai, enviou um e-mail pedindo socorro à Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) em Brasília. Ele informou que, em pelo menos três ocasiões recentes, oficiais da Marinha paraguaia trocaram tiros com policiais brasileiros – segundo ele, para acobertar traficantes e contrabandistas no Rio Paraná, que marca a divisa com a cidade paraguaia de Salto del Guaira.
Nesta quarta-feira (23/03), o presidente da Fenapef, Marcos Wink, decidiu agir. “A Marinha do Paraguai está atirando contra agentes brasileiros e ninguém faz nada”, diz ele. Wink procurou o deputado Paulo Pimenta (PT-RS). Relator da CPI que investigou, em 2006, o tráfico de armas no Brasil, Pimenta poderia servir de ponte até o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo. “Queremos espalhar para o mundo a realidade na fronteira”, afirma Wink, indignado.
Em e-mails aos quais se teve acesso, agentes da Delegacia Especial de Polícia Marítima (DEPOM) de Guaíra informam que a Marinha paraguaia tem recebido propina de traficantes e contrabandistas para disparar armas de grosso calibre contra policiais brasileiros. O objetivo seria permitir – em troca de propina – que o tráfico de drogas continue a agir impunemente na região.
Violência em Guaíra: trecho do caderno que registra os plantões da Polícia Federal descreve o tiroteio no Rio Paraná
Um dos ataques registrados pela Fenapef aconteceu por volta das 12h do dia 17 de março, uma quinta-feira: dois agentes da PF em Guaíra embarcaram numa lancha para iniciar a patrulha rotineira no Rio Paraná quando avistaram um bote de alumínio, pintado de verde e equipado com um motor, deslizando rumo ao Paraguai. Imediatamente, exigiram ao piloto que parasse e, durante a revista, flagraram uma carga de pneus contrabandeados. Como de praxe, apreenderam o bote e seguiram para a delegacia em Guaira para registrar a ocorrência.
A 200 metros do atracadouro, em águas brasileiras, os agentes perceberam que uma lancha da Marinha do Paraguai, com cabine fechada, acelerava na direção do barco apreendido, que era escoltado pela PF. Quando os paraguaios chegaram a cem metros de distância, começaram a disparar com uma metralhadora calibre ponto 30, própria para derrubar helicópteros, instalada na proa e apontada na direção dos policiais brasileiros. Eles revidaram com 60 tiros de fuzil HK G36, arma muito menos potente, e acabaram rapidamente com a munição. Tiveram de recuar. A lancha da Marinha paraguaia se aproximou e levou de volta o bote criminoso.
Num e-mail enviado em 21 de março, um dos agentes de Guaíra afirma que nos últimos dois anos houve no mínimo cinco confrontos entre a Marinha paraguaia e a PF, reclama das condições precárias das embarcações brasileiras e revela que integrantes da Polícia Federal recomendaram o abafamento da ocorrência do tiroteio no Rio Paraná. Também conta que uma licitação, aberta para a compra de uma lancha blindada para a PF de Guaíra, foi interrompida sem motivos aparentes.
Uma reportagem do jornal Folha de S. Paulo publicada em maio de 2010 confirma que não foi a primeira vez que forças brasileiras e paraguaias protagonizaram um tiroteio na região. Nela, um delegado da PF afirmou terem ocorrido, desde março daquele ano, mais de 20 confrontos entre a Marinha paraguaia e agentes federais brasileiros em Foz do Iguaçu. Em um só dia três tiroteios foram registrados.
Em 16 de agosto de 2010, num documento de circulação interna da Polícia Federal ao qual se teve acesso, um policial federal de Guaíra avisou ao chefe da delegacia da PF na cidade que a Marinha paraguaia havia ganhado dos traficantes um motor de popa de 300 hp com o objetivo de perseguir a lancha da polícia brasileira.
A Marinha paraguaia passou a vigiar a fronteira com o Brasil em março de 2005, depois que um advogado avisou o Ministério Público do Paraguai que a polícia facilitava o contrabando feito por embarcações na região. A Fenapef informou que os tiroteios estão cada vez mais frequentes porque os policiais brasileiros estão frustrando muitas travessias de barcos criminosos pelo Rio Paraná. De 2007 a 2011, 163 embarcações foram apreendidas pela Polícia Federal na fronteira paranaense. Falta agora descobrir a identidade dos bandidos escondidos dentro de fardas e camuflados em embarcações oficiais das Forças Armadas do Paraguai.
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