Atuação de Cunha na área de comércio internacional
não aparece em biografia
não aparece em biografia
O talento de Eduardo Cunha para o ramo do comércio exterior era
desconhecido do próprio Eduardo Cunha. Citada agora pelo deputado como
fonte dos milhões que ele entesourou na Suíça, essa atividade não
aparece nas suas biografias oficiais. O site da Câmara e a página pessoal
que Cunha mantém na internet realçam apenas duas experiências na
iniciativa privada, ambas no Rio. Formado em economia, Cunha trabalhou
como auditor da empresa Arthur Andersen entre 1978 e 1980. E integrou o
quadro de economistas da Xerox do Brasil no período de 1980 a 1982.
Não há nas biografias nenhum vestígio da companhia de comércio exterior
que Cunha diz que abriu na década de 1980 para vender produtos
alimentícios a países africanos — sobretudo carne enlatada para a
República Democrática do Congo (antigo Zaire). Cunha não diz quem eram
seus fornecedores. Tampouco informa os nomes dos clientes. Declara que a
empresa já fechou, mas se abstém de citar datas. Não exibe documentos
que comprovem os negócios.
Nesse enredo, a única coisa realmente palpável é o dinheiro que foi
descoberto à revelia de Eduardo Cunha, graças à colaboração da
Promotoria da Suíça com o Ministério Público do Brasil. Hoje,
encontram-se bloqueadas em contas suíças atribuídas a Cunha cifras
equivalentes a mais de R$ 9 milhões. Foi o que sobrou. A Procuradoria da
República sustenta que o dinheiro provém de corrupção, não da alegada
habilidade de Cunha para vender carne enlatada à África.
Há uma biografia mais alentada de Eduardo Cunha na página da Presidência
da Câmara. De novo, o texto não faz uma mísera menção às atividades
empresariais do personagem. Anota que o deputado, “antes de ingressar na
carreira política, foi um importante executivo da área de
telecomunicações”, uma referência à passagem de Cunha pela presidência
da Telerj (1991-1993), uma ex-estatal que operava os telefones no Rio
como parte do antigo Sistema Telebras. Cunha obteve esse cargo do então
presidente Fernando Collor, cujo nome é omitido.
“Nascido no Rio de Janeiro, no dia 29 de setembro de 1958, Eduardo Cunha
é radialista, evangélico, casado e pai de quatro filhos”, acrescenta a
biografia. “Economista, formado na Universidade Cândido Mendes,
trabalhou como auditor de mercado na iniciativa privada, entre 1978 e
1982 [Arthur Andersen e Xerox]. Foi Presidente da Cehab, a Companhia de
Habitação do Estado do Rio de Janeiro, em 1999 …” Esse posto foi cedido a
Cunha pelo então governador fluminense Anthony Garotinho, hoje um
inimigo figadal do deputado.
Na versão que construiu para tentar dar aparência legal à fortuna que a
Procuradoria diz ser fruto de roubo, Cunha diz que se dedicou ao
comércio exterior na década de 1980. A reportagem conversou com três
pessoas que convivem com o deputado desde essa época. Concordaram em
falar sob a condição do anonimato. Nenhuma delas se recorda dessa
passagem empreendedora da existência de Cunha. Ao contrário. Afirmam que
foi nessa época que o deputado começou a tomar gosto pela política.
Em 1982, Cunha trabalhou na campanha de Eliseu Resende, que disputou o
governo de Minas Gerais pelo PTB. Em 1986, atuou no comitê eleitoral de
Moreira Franco, que se elegeu governador do Rio pelo PMDB. Em 1989,
participou da campanha presidencial de Fernando Collor, à época filiado
ao inexpressivo PRN. Cunha auxiliava o tesoureiro do comitê de Collor,
Paulo César Farias, na coleta de fundos privados de campanha. Agradou
tanto que virou presidente da telefônica do Rio, um cargo tão cobiçado à
época quanto uma diretoria da Petrobras.
“Hoje, Eduardo Cunha é reconhecidamente um dos políticos mais influentes
e atuantes”, sustenta a biografia exposta na página da Presidência da
Câmara. “Com espírito independente e profundo conhecimento do
regulamento da Câmara, Eduardo Cunha conquistou merecida credibilidade e
respeito de seus pares e, sobretudo, da sociedade brasileira.”
O texto arremata: “Por uma Câmara Independente, mais próxima do povo e
de suas causas e sem submissão aos Poderes Executivo e Judiciário, o
líder peemedebista prometeu incondicional empenho. Essa é a marca do
deputado Eduardo Cunha.”
No momento, Cunha carrega marcas menos edificantes. E a Câmara precisa
tornar-se independente também do seu presidente. Um personagem que se
oferece para fazer as vontades do Executivo, desde que o governo de
Dilma o ajude a salvar o mandato e a aliviar a tempestade que está por
vir no Judiciário.
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