sábado, 1 de outubro de 2011


Grécia revela a trágica falha da União Europeia

Há poucas dúvidas de que autoridades europeias racionais gostariam de evitar que a Grécia saia da zona do euro. A questão é se conseguiriam.
Economistas, num coro crescente, têm dito que uma moratória do endividado governo grego é inevitável. Num cenário pior, dizem eles, a moratória seria administrada de maneira equivocada, e isso poderia levar a Grécia a sair da moeda comum.
Seria "um desastre econômico e financeiro não só para a Grécia mas também para os 16 países que continuariam na zona do euro", argumentou o economista-chefe do Citigroup, Willem Buiter, num relatório de pesquisa divulgado este mês. Ocorreriam "corridas aos bancos em todos os países considerados pelo mercado e por investidores como em risco de deixar a zona do euro, por mais remoto que seja esse risco".
Investidores e credores desses países iriam efetivamente entrar em greve. Os efeitos repercutiriam pelo mundo.
Outros economistas calculam que o custo de deixar o euro para uma economia enfraquecida passe de 25% do PIB no primeiro ano. O preço da saída também seria gigantesco para as economias mais sadias do bloco.
Mas se abandonar o euro parece profundamente indesejável, pelo menos num momento de pânico financeiro, será que é evitável?
A história não dá muito consolo. Em seu influente tratado "A Grande Ilusão", publicado em 1910, o escritor Norman Angell argumentou que os países estavam tão interdependentes na economia e nas finanças que uma guerra prejudicaria o perdedor tanto quanto o vencedor. Diante dessas circunstâncias, argumentou, nenhum país seria tão tolo ao ponto de começar uma.
Sua análise sobre a catástrofe econômica que é a guerra seria comprovada; sua conclusão sobre o processo decisório dos governos foi tragicamente errada. Quatro anos depois os países da Europa se enfrentariam num terrível conflito.
Os governos da zona do euro já entraram sem querer em vários círculos viciosos, o que aumentou os riscos da moeda.
A perspectiva de uma moratória da Grécia é vista como algo que aumentaria a possibilidade de outras ocorrerem, o que, por sua vez, é considerado uma ameaça a bancos que detêm bilhões de dólares de títulos de dívida de governos. A conta de reerguer os bancos está na mão de governos já endividados. Se a confiança continuar diminuindo, uma corrida contra um país e seus bancos pode expulsar esse país da zona do euro.
Especialistas em finanças argumentam que ainda há soluções técnicas para coibir um pânico como esse. Mas não há instituições na zona do euro, exceto o Banco Central Europeu, equiparáveis àquelas que lidariam com tal situação dentro de um governo nacional. Também não há a centralização de poder para fazer suas decisões surtirem efeito.
A Comissão Europeia, o braço executivo da União Europeia, tem pouco poder porque a maioria dos grandes países do bloco quer que seja assim. O Conselho Europeu, que reúne os 27 governos, não pode agir sem que a maioria esteja de acordo.
Mesmo quando o bloco realmente age, ele é lento. O presidente da comissão, José Manuel Barroso, ressaltou em discurso sobre a condição da União Europeia, esta semana, que as democracias europeias operam coletivamente a uma velocidade muito menor que a dos mercados financeiros.
A Alemanha, uma das chaves para solucionar a crise, é soberana, com uma líder presidindo um país onde as pessoas discordam cada vez mais de pagar a conta pelo que consideram o esbanjamento dos outros. A cada estágio da crise de dívida as dificuldades da política alemã levaram a uma administração da crise que foi relutante, gradual e incompleta.
Quando as democracias europeias se movimentam, expõem os integrantes mais frágeis do euro. Os parlamentos da Eslováquia e Finlândia, dois países com população na faixa de cinco milhões, podem segurar uma expansão crucial do total de recursos de resgate. A Itália, a terceira maior economia do euro, agora puxada para a crise, é liderada por Silvio Berlusconi, um primeiro-ministro com poucos poderes e visto com um desprezo pouco disfarçado em muitas capitais da zona do euro.
A crise revelou a falta de confiança dos governos e das pessoas da zona do euro. O governo grego abandonou seu direito à confiança depois de mentir várias vezes nas suas estatísticas econômicas; sua população fica estereotipada. Não se pode confiar numa ação responsável da Itália e de seu líder. Seus sócios no euro acreditam que só quando uma espada pender sobre suas cabeças é que eles se sujeitarão à disciplina fiscal; mas essa espada pairante alimenta muita angústia para quem está assistindo.
O aviso de "A Grande Ilusão" ainda pode ser comprovado pelo futuro. A única instituição que os economistas dizem que pode tomar a frente e encerrar o pânico no momento – embora não consiga realizar as mudanças essenciais de longo prazo – é o BCE, que pode oferecer recursos ilimitados, sem exigências. Ele é constrangido de exercer esse poder pelo temor dos banqueiros centrais de que o BCE seja percebido como subserviente a governos.
Mesmo no universo árido dos bancos centrais, um banco central que presencia a fragmentação de sua própria união monetária seria considerado um fracasso, mantendo ou não a inflação abaixo da meta de 2%.
Mas seu futuro presidente, Mario Draghi, é italiano. Muitos observadores do BCE dizem que isso o forçará a provar suas credenciais de combate à inflação para os desconfiados alemães, e evitar ser visto como alguém que contornou as regras para ajudar a Itália. A liberdade de ação de Draghi ficaria portanto restringida. Seu antecessor, Jean-Claude Trichet, não tinha essas restrições. Pode valer a pena acompanhar o mês de outubro, o último em que ocupará o cargo.

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