Inserção política das Farc e
reforma agrária são 'pontos-chave'
da paz na Colômbia
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Negociações tentam colocar fim a quase 50 anos de conflito
armado na Colômbia |
A questão fundiária e a possibilidade de participação de
ex-guerrilheiros na vida política do país deverão ser o cerne de um
possível processo de paz entre o governo colombiano e as Farc
(Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), que estão em
negociações atualmente.
Analistas ouvidos apontam que, embora "sensíveis", esses são os
temas cruciais para colocar fim a quase 50 anos de conflito armado
no país.
A discussão sobre a agenda de negociação para o fim do conflito
armado colombiano ganhou força dentro e fora do país depois de o
presidente Juan Manuel Santos ter confirmado, que vem mantendo
"conversas exploratórias pela paz" com as Farc.
Na quarta-feira ( 29 de agosto), um suposto texto do acordo foi
"vazado" pela emissora colombiana RCN Rádio.
O suposto acordo abordaria seis pontos de negociação: política de
desenvolvimento agrário, participação política, fim do conflito,
drogas, vítimas e reparação e a implementação e verificação do
processo em si.
Embora o governo colombiano não tenha confirmado a autenticidade do
documento divulgado pela rádio, para analistas os pontos de
discussão tendem a ser "fiéis" ao que os negociadores estão buscando
neste momento.
Participação política
Dentre os temas em discussão, a participação política de
ex-guerrilheiros deverá encontrar empecilhos.
Em junho, o Congresso colombiano aprovou o Marco Legal para a Paz –
reforma constitucional que abre caminho para um processo de paz —,
mas o tema da participação política ficou de fora, para
regulamentação posterior.
Segundo estimativas de ONGs que analisam o conflito colombiano, as
Farc teriam entre 8 mil e 10 mil homens em suas frentes.
Para o cientista político Alonso Tobón, do Centro de Recursos para
Análise do Conflito (CERAC), o controverso ingresso de
ex-guerrilheiros na vida política será uma exigência das Farc.
"De um lado, há a pressão da sociedade civil e defensores de
direitos humanos para que os crimes cometidos pelos guerrilheiros
sejam punidos. Do outro, há a reivindicação da própria guerrilha
para que consiga ter garantias de participação política", avalia.
Quando o texto do Marco da Paz foi aprovado, o autor do projeto, o
senador conservador Roy Barreras, disse várias vezes que o
comandante das Farc, Timoleón Jiménez ("Timochenko"), não poderia
ter participação política, por ter "responsabilidade nos crimes
cometidos pela guerrilha".
Tobón acredita que não será fácil encontrar o equilíbrio para
garantir reparação às vítimas e o direito de participação dos
reintegrados à sociedade.
Segundo ele, será complicado separar o crime político do crime de
guerra. "Vai ser mais difícil ainda com a pressão contrária da
extrema direita e aliados do ex-presidente Álvaro Uribe", avalia.
Reforma agrária
Já a questão fundiária deve incluir o debate sobre a definição de
fronteiras agrícolas e redistribuição de terras. O tema é uma
demanda antiga das Farc.
"A problemática da terra sempre esteve presente no país, porque a
disputa entre pequenos camponeses e grandes latifundiários nasceu
antes mesmo das Farc", conta Alonso Tobón.
Assim mesmo, o analista se diz otimista porque, segundo ele, pela
primeira vez a questão agrária será debatida em um momento em que o
Estado colombiano trabalha com o tema. Tobón refere-se à aplicação a
Lei de Vítimas e Restituição de Terras, em vigor desde julho do ano
passado.
De janeiro até agora, a Unidade de Restituição de Terras recebeu
mais de 19 mil pedidos de camponeses para recuperar mais de 1,5
milhão de hectares.
Apesar da lei em vigor, o analista político Benjamín Herrera, da
Pontifícia Universidade Javeriana da Colômbia, é mais cético. Ele
acredita que a aplicação da atual legislação não será suficiente
para resolver a questão fundiária.
"Uma coisa é restituir terras despojadas pelo conflito, por
paramilitares ou pela própria guerrilha. Outra coisa é mexer no
latifúndio. A lei em vigor não é abrangente nesse nível", critica.
Para Herrera, somente se houver muito interesse de ambas as partes
um acordo para o fim do conflito poderá ser celebrado.
"No passado, as Farc sempre quiseram uma revolução radical e o
governo sempre mostrou pouca disposição para concessões. Tomara que,
agora, as duas partes estejam mais flexíveis", opina.
Apoio internacional
A confirmação de que o governo colombiano está negociando com a
guerrilha ganhou apoio de países e de organismos internacionais como
a ONU.
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, ofereceu apoio para mediar a
resolução do conflito e disse estar "muito satisfeito" pela
confirmação das conversas preliminares.
Os Estados Unidos, grandes aliados da Colômbia, disseram reconhecer
os esforços para acabar com o conflito mais antigo do continente
americano.
"Esperamos que encontrem a paz duradoura e a segurança cidadã que a
Colômbia merece", declarou a porta-voz do Departamento de Estado,
Victoria Nuland.
Além disso, o documento divulgado pela rádio também diz,
supostamente, que as negociações seriam realizadas na Noruega e em
Cuba, acompanhadas por Venezuela e Chile.
O texto não exclui a participação de outros países no processo.