terça-feira, 30 de agosto de 2011

Copa 2014: ex-sócio de fiscal favorecido
Escritório de ex-parceiro recebeu mais de R$ 17 milhões por 4 projetos

Cidades-sedes da Copa de 2014 pagaram mais de R$ 17 milhões à empresa de arquitetura do ex-sócio do homem escolhido justamente para fiscalizar os projetos arquitetônicos dos estádios.
O consultor do COL (Comitê Organizador Local) da Copa, Carlos de La Corte, indicado pelo presidente de entidade, Ricardo Teixeira, tem como tarefa conferir se as arenas estão dentro do padrão Fifa e acompanhar as obras.
Até 2009, ele era sócio de Danilo Carvalho, dono do escritório Stadia, que conseguiu, sem licitação, contratos em quatro dos mais caros projetos de estádios do Mundial.
Em ao menos um deles, De La Corte, quando já estava no COL, sugeriu a contratação da empresa do parceiro Carvalho, segundo um dos participantes da negociação.
"Procuramos a empresa de Carlos de La Corte e tivemos a sugestão do nome do Danilo, que é parceiro dele. O Carlos sugeriu dois ou três nomes. Como eu já estava em São Paulo e as outras empresas eram de fora do Brasil, foi mais fácil o contato. É aquela história de unir o útil ao agradável", declarou o ex-secretário da Copa-2014 no Rio Grande do Norte, Fernando Fernandes.
De La Corte e Carvalho foram sócios na Daro Engenharia de fevereiro de 2008 a outubro de 2009, segundo registros da Junta Comercial de São Paulo. Durante a sociedade, e quando De La Corte já era do COL, a Stadia obteve o maior contrato, para projetar a arena de Manaus. O valor: R$ 14,7 milhões.
Segundo Carvalho, foi junto do fiscal do COL, quando eles ainda eram sócios, que ele se aproximou das sedes.
"Trabalhei efetivamente por algum período no começo do COL e foi aí que acabei conhecendo as cidades. Eu ainda era sócio do Corte", disse inicialmente. Depois, afirmou que apenas participou de "reuniões" do comitê, que negou tê-lo contratado.
De acordo com o dono da Stadia, o que levou ao fim da sociedade foi uma "discordância de opiniões": ele queria projetar estádios, e De La Corte preferiu ficar no COL.

Desempenho
A Stadia foi montada cerca de um mês depois de a Fifa anunciar as sedes. E, com 53 dias de existência, já conseguiu seu primeiro contrato, sem licitação, para projetar a arena de Manaus.
O governo do Amazonas usou a brecha da Lei de Licitações, que dispensa concorrência nos casos de "inviabilidade de competição", para contratar a recém-criada empresa por "notório saber".
Em Natal, também sem passar por licitação, a Stadia recebeu ao menos R$ 2,3 milhões pelo projeto da Arena das Dunas. Lá, a empresa foi pivô de impasses na licitação das obras -posteriores ao projeto arquitetônico.
O governo potiguar teve de mudar um item do edital que previa que a empreiteira vencedora contratasse a Stadia para fazer também os projetos de engenharia, depois de o Ministério Público ter considerado a condição um direcionamento de licitação.
O montante faturado pela Stadia, entretanto, é maior que esses R$ 17 milhões de Manaus e Natal. Ela tem participação também nos estádios de Belo Horizonte (MG) e Cuiabá (MT). Nesses projetos, o escritório foi subcontratado por duas outras empresas, que se recusaram a dizer quanto pagaram.
Em Cuiabá, o governo contratou, sem licitação, a empresa GCP, por R$ 14,2 milhões -parte do dinheiro foi repassado à Stadia. O escritório é do arquiteto Sérgio Coelho. De novo, há relação com o fiscal do COL: Coelho e De La Corte trabalharam juntos no fim da década de 1990.
Em Belo Horizonte, a Stadia ajudou a empresa EBP a fazer a parte de arquitetura esportiva no modelo da PPP (Parceria Público-Privada) para reformar o Mineirão.

Comitê diz não saber de ligação de consultor
O Comitê Organizador Local da Copa disse desconhecer a relação entre seu consultor, Carlos de La Corte, e o arquiteto Danilo Carvalho, dono da empresa Stadia.
De La Corte negou conflito de interesse em fiscalizar projetos feitos pelo ex-sócio, assim como tê-lo beneficiado ou indicado a cidades-sedes.
Tanto o consultor quanto Carvalho disseram que, diferentemente do que mostram documentos da Junta Comercial de São Paulo e do "Diário Oficial do Amazonas", não eram mais sócios quando a Stadia obteve o primeiro contrato, em Manaus. Instados, não mostraram documentos que comprovassem a versão.
Carvalho também negou se beneficiar da relação com De La Corte. Ele disse que todos seus contratos são legais.
O governo do Amazonas disse que desconhece a sociedade entre os dois e que contratou a Stadia por recomendação da consultoria Deloitte, que nega ter indicado.
Ex-secretário da Copa do Mundo no Rio Grande do Norte, Fernando Fernandes afirmou que, além de De La Corte, a Stadia foi indicada por outras pessoas. Segundo ele, não houve tratamento diferenciado. O atual governo potiguar não respondeu.
A secretaria da Copa em Minas declarou que não há relação entre o trabalho feito por Carvalho no Mineirão e o consultor do COL. A EBP, que contratou a Stadia, disse desconhecer a relação entre a empresa e De La Corte.
O governo de Mato Grosso disse não ter contrato com a Stadia e sim com o escritório GCP, que, diz, contratou a Stadia pela relação custo-benefício e desconhece a ligação entre os arquitetos.

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