O empreiteiro dono da UTC, preso pela PF, liga caixa de campanha de Dilma ao petrolão
Manuscrito do empreiteiro Ricardo Pessoa
obtido por VEJA diz que o esquema de corrupção instalado na Petrobras
era na essência político, e não o mero resultado do conluio de alguns
empresários e diretores venais da estatal. Ele também diz que o
tesoureiro do comitê de reeleição da presidente está “preocupadíssimo”.
Revista Veja divulga anotações do presidente da UTC, que cita outras operações da Petrobrás e doação eleitoral à candidata a reeleição
Revista Veja divulga anotações do presidente da UTC, que cita outras operações da Petrobrás e doação eleitoral à candidata a reeleição
O presidente da UTC, Ricardo Pessoa, em 14 de novembro, dia em que foi detido pela PF |
Preso na carceragem da Polícia Federal em Curitiba desde 14 de novembro,
o presidente da empreiteira UTC, Ricardo Pessoa, afirmou em anotações à
mão que as irregularidades na Diretoria de Abastecimento da Petrobrás -
da qual foi titular o ex-diretor Paulo Roberto Costa, delator do
esquema alvo da Operação Lava Jato - são “fichinha” se levadas em conta
outras áreas da estatal. O executivo, apontado como coordenador do
cartel que atuou em contratos da petrolífera, também escreveu sobre as
doações das empresas à campanha à reeleição da presidente Dilma
Rousseff.
As anotações foram divulgadas pela revista Veja, que teve acesso a seis
folhas de caderno manuscritas. A publicação confirmou que a caligrafia é
de Pessoa por meio de um exame grafotécnico feito pelo perito Ricardo
Molina, da Unicamp.
Ao mencionar as doações de campanha, Pessoa escreveu que “as
empreiteiras juntas doaram para a campanha de Dilma milhões”. “Já pensou
se há vinculações em algumas delas. O que dirá o nosso procurador-geral
da República. STF a se pronunciar”, anotou o presidente da UTC.
Segundo a revista, o trecho era antecedido por outro texto no qual
Pessoa escreve que, embora parlamentares considerem que doações oficiais
de campanha não configuram crime, pode haver delito se for provada
relação direta entre a contribuição eleitoral e contratos públicos.
Na delação premiada de Augusto Mendonça, executivo da Toyo Setal, ele
havia dito aos investigadores da Lava Jato que o ex-diretor de Serviços
Renato Duque pediu doação ao PT como contrapartida aos contratos da
empresa com a Petrobrás. Duque nega desvios.
Pessoa menciona também que o tesoureiro da campanha de Dilma, Edinho
Silva, está “preocupadíssimo”. “Todas as empreiteiras acusadas de
esquema criminoso na Operação Lava Jato doaram para campanha de Dilma.
Será se (sic) falarão sobre vinculações campanha x obras da Petrobrás?”
O tesoureiro petista disse que conheceu Pessoa no período eleitoral e
que, nas três ocasiões em que estiveram juntos, discutiu doações
oficiais. “Acredito que todos os tesoureiros de campanha tiveram contato
com ele, porque a empresa era uma grande doadora”, afirmou Edinho.
Sem preocupação
Edinho Silva disse que não tem "absolutamente nenhuma preocupação" com
os desdobramentos das investigações. Ele disse que a arrecadação foi
feita dentro da legalidade, seguindo normas da Justiça Eleitoral, que
aprovou as contas "por unanimidade".
Edinho afirmou que teve três encontros com Ricardo Pessoa, entre agosto e
setembro de 2014, para acertar as doações. Segundo o petista, em nenhum
momento houve referência a obras ou contratos da Petrobras.
Ele disse ainda que a UTC não fez repasses apenas para o PT. "O
procedimento da nossa campanha foi idêntico aos demais comitês: você
pega a lista, bate na porta, pede doação, mas dentro da legalidade",
completou.
‘Fichinha’
O presidente da UTC ainda afirma que a diretoria de Costa era “fichinha”
se fossem somados outras operações sob suspeita. “O que foi apresentado
sobre a área de Abastecimento da Petrobrás é muito pequeno quando se
junta tudo a Pasadena, SBM, Angola, esquema argentino, Transpetro,
Petroquímica e outras mais. Ah, e o contrato de meio ambiente na
Petrobrás Internacional? Se somarmos tudo, Abastecimento é fichinha”,
escreveu.
No comando do PT, a manifestação do executivo foi interpretada como um
recado ao governo e também ao mercado. O alerta político seria de que
teria disposição para incomodar o governo e aos empresários de que tem
força para tocar seus negócios, que estariam enfrentando dificuldades
depois da operação da Polícia Federal.
Sem ameaças
O advogado de Pessoa, Alberto Zacharias Toron, disse que as anotações
citadas pela revista não passaram pelas suas mãos nem eram de seu
conhecimento.
Toron afirmou que Ricardo Pessoa não fez ameaças e interpretou os
trechos divulgados como "apenas uma reflexão de alguém que está preso e
revoltado, injustiçado, enquanto outros acusados com envolvimento em
corrupção, como Renato Duque, estão soltos".
Foi uma referência ao ex-diretor de Serviços da Petrobras que foi solto após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).
Toron disse ter dificuldades para fazer maiores comentários sobre os
bilhetes porque a revista "publicou apenas trechos". Procurado, o
Planalto informou que não iria se manifestar.
O que vai pela cabeça dos empreiteiros?
Um bom resumo do que vai pela cabeça dos empreiteiros presos pela
Operação Lava-Jato está em um manuscrito de seis folhas de caderno
obtido por VEJA. Ele foi escrito pelo engenheiro baiano Ricardo Pessoa,
da UTC Engenharia. É a primeira manifestação de um integrante do clube
do bilhão desde a prisão. O documento contém queixas contra os antigos
parceiros de negócios e ameaças veladas a políticos. Em um dos trechos, o
empreiteiro liga os contratos sob suspeita assinados entre as
empreiteiras e a Petrobras ao caixa de campanha eleitoral da presidente
Dilma Rousseff.
Nas entrelinhas do manuscrito fica evidente o desconforto dos
empreiteiros de estarem sendo, pelo menos até agora, os bodes
expiatórios da complexa rede de corrupção armada na Petrobras. Eles têm
razão. Nas denúncias oferecidas pelo Ministério Público Federal e
aceitas pelo juiz Sergio Moro, o esquema de corrupção na Petrobras
parece ser apenas o conluio de empreiteiros gananciosos com meia dúzia
de diretores venais da Petrobras. Nada mais longe da verdade. Como Paulo
Roberto Costa revelou com toda a clareza, tratava-se de um esquema de
desvio de dinheiro para partidos e campanhas políticas organizado pelo
partido no poder, o PT. Entende-se, portanto, a insistência de Ricardo
Pessoa em lembrar que em sua concepção e funcionamento o esquema na
Petrobras era político. As empreiteiras entraram como a solução para o
problema de como entregar o dinheiro aos parlamentares e candidatos da
base aliada do governo do PT.
Pessoa cita nominalmente o tesoureiro do comitê de Dilma Rousseff, o
deputado petista Edinho Silva (SP): “Edinho Silva está preocupadíssimo.
Todas as empreiteiras acusadas de esquema criminoso da Operação
Lava-Jato doaram para a campanha de Dilma”. Arremata com outra pergunta
desafiadora, referindo-se ainda ao caixa do comitê eleitoral da
presidente: “Será se (sic) falarão sobre vinculação campanha x obras da
Petrobras?”. O empreiteiro faz chiste com o que já foi descoberto até
agora e afirma que o volume de dinheiro desviado na diretoria de Paulo
Roberto Costa é “fichinha” perto de outros negócios da Petrobras que
também teriam servido à coleta de propina.
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