Newton e a política no Brasil
Murillo de Aragão |
Na política brasileira, há um jogo visível, mas poucos sabem como
funciona, pois suas regras não são divulgadas. Só quem está na política
sabe como joga. A base de tudo é uma apropriação da Terceira Lei de
Newton: a toda ação corresponde uma reação de igual intensidade. Em
política, ao ataque responde-se inevitavelmente com outro, de igual ou
maior intensidade – é a chamada retaliação.
Como quase todos na política nacional têm rabo preso, o jogo é muito
útil como poderoso recurso, evitando o tratamento radical, que seria
cortar o próprio rabo. De saída, embute uma ameaça ditada por uma
espécie de reflexo condicionado: se você me atacar, eu faço retaliação.
Pode esperar.
Qual a lógica desse duelo no qual vale tudo? Calcula-se o
custo-benefício dos ataques e dos contra-ataques. As perdas e danos
resultantes do ato de atacar e, até mesmo, de retaliar. É um cálculo
simples. A Terceira Lei de Newton é especialmente útil na época das
eleições.
Como funciona? Basicamente, da seguinte forma: temos um escândalo. Por
exemplo, a questão da compra superfaturada de Pasadena pela Petrobras.
Prato cheio para a oposição fazer a festa por meio da convocação de uma
CPI, há anos a mais eficiente máquina de alimentar escândalos da
política nacional.
Para equilibrar as contas, a base governista ataca em duas frentes:
inclui na pauta de investigações aspectos que podem envolver o ex-aliado
Eduardo Campos (PSB) com a multiplicação dos custos da refinaria Abreu e
Lima, em Pernambuco, e remexe no pântano da denúncia de cartel na
operação Siemens-Alstom, que atinge em cheio o PSDB em São Paulo.
Quando não se pode incriminar isoladamente o adversário, tenta-se, ao
menos, não afundar sozinho na lama das denúncias. Todos se equiparam em
termos de rabo preso. Cada grupo político tem o seu problema, que, quase
sempre, envolve muito dinheiro e financiamento de pesadas estruturas
políticas e partidárias. Algumas vezes, fortuna pessoal, como no caso da
Siemens-Alstom, e contas polpudas na Suíça. Ou seja, está sempre no ar o
espectro de corrupção.
Recentemente, enquanto a pressão sobre o governo aumentava na CPI da
Petrobras, turbinada com revelações sobre manipulação dos
interrogatórios, o contra-ataque veio em cima do aeroporto “familiar” do
tucano Aécio Neves em Claudio, Minas Gerais. Organiza-se um pedido de
CPI para investigar a possível construção da pista com recursos públicos
e sem a devida autorização da Anac. Há quem especule que a pista possa
ser usada por traficantes!
É evidente que, para jogar com sucesso o jogo da ação-retaliação, é
preciso munição para sustentar um bombardeio bem-sucedido ao adversário.
Sem munição, o grupo acaba presa fácil dos contra-ataques. Idealmente,
quem não tem rabo preso fica livre para atacar sem ser retaliado. No
entanto, na primeira divisão da política nacional são poucos – muito
poucos – aqueles que passam incólumes em um teste mais
rigoroso.
O que sobra de tudo isso? Nada, ou pouca coisa. Na esfera política,
troca de chumbo não dói. Até mesmo pelo fato de que o adversário de hoje
pode ser o correligionário de amanhã e, quase sempre, o perigo mora
dentro do próprio grupo político, com a ameaça surda do fogo amigo.
Nesse campo, a vítima do momento é o ex-petista André Vargas (PR),
depois que se tornaram conhecidas as suas ligações com um doleiro
suspeito de crime.
As acusações do momento político, independentemente de sua gravidade,
fazem parte de um jogo de cena destinado a limitar a autonomia política
do adversário. Passadas as eleições, perdem consistência. Até serem
substituídas por uma nova dinâmica de acusações.
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