FHC vê risco de Brasil perder o que conquistou
Homenageado nos EUA, ex-presidente tucano critica políticas econômica e externa de Dilma e reprova bordão usado por Lula
Fernando Henrique Cardoso discursa em evento em Nova York |
A uma plateia de 1.200 pessoas reunidas em um jantar de gala ontem em
Nova York, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou que os
avanços construídos no Brasil a partir da Constituição de 1988 pareciam
“desfazer-se no ar” nos últimos anos. Defendendo que o País se guie por
“uma lanterna na proa, e não na popa”, o tucano disse esperar que os
caminhos percorridos até hoje “não se percam”.
Para Fernando Henrique, essa “construção” de décadas foi feita por
gerações e não permite que se diga “nunca neste País antes de mim fez-se
tal e tal coisa” – uma referência ao bordão que marca os discursos de
seu sucessor, o petista Luiz Inácio Lula da Silva. “Um país não se
constrói senão pondo tijolo sobre tijolo, obra de gerações.”
FHC foi um dos dois homenageados em jantar oferecido no hotel
Waldorf-Astoria pela Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos em Nova
York. Desde 1970, a entidade dá o prêmio Pessoa do Ano a um brasileiro e
a um americano que atuaram pela melhoria nas relações entre os dois
países. O outro homenageado foi o ex-presidente Bill Clinton, cujo
mandato coincidiu com grande parte do governo do tucano. O evento de
ontem foi o mais concorrido das 45 edições do prêmio concedido pela
câmara, que reúne 450 empresas dos dois países.
Em seu discurso de agradecimento, o ex-presidente preferiu não se
referir aos casos de corrupção que afetam o governo petista, aos quais
se referiu como práticas “não republicanas”. Disse que preferia “se
calar” por estar no exterior.
Sem mencionar o nome da presidente Dilma Rousseff, o tucano criticou a
política econômica do primeiro mandato da petista por manter medidas
anticíclicas adotadas em resposta à crise de 2008. “O governo
interpretou o que era política de conjuntura como um sinal para fazer
marcha à ré”, observou. “Paulatinamente fomos voltando à expansão sem
freios do setor estatal, ao descaso com as contas públicas, aos projetos
megalômanos que já haviam caracterizado e inviabilizado o êxito de
alguns governos do passado.”
O discurso caiu bem em uma plateia de tucanos, como os senadores Aécio
Neves (MG) e José Serra (SP) e o governador de São Paulo, Geraldo
Alckmin, além de simpatizantes do partido. O único político presente de
fora do PSDB era o ex-senador José Sarney (PMDB).
Do setor financeiro, estavam os presidentes do Bradesco, Luiz Carlos
Trabuco Cappi; do Itaú, Roberto Setubal; e do BTG Pactual, André
Esteves, além de José Olympio, do Credit Suisse, e do presidente do
conselho do Itaú, Pedro Moreira Salles. Os empresários Rubens Ometto e
José Luís Cutrale também foram convidados para o jantar, que teve wrap
de salmão defumado e cherne com camarões e aspargos e ingressos a partir
de US$ 1 mil.
Quando o homenageado subiu ao palco, ouviu-se um grito: “Volta,
presidente”. O publicitário Nizan Guanaes foi na mesma linha em seu
discurso. “Temos saudades de você, presidente”, disse, sob aplausos.
Para Clinton, FHC está entre os quatro ou cinco líderes mais
extraordinários que conheceu. “Ele era a pessoa certa para o seu tempo.
Ele é a pessoa certa para qualquer tempo.”
Política externa
Fernando Henrique fez a primeira parte do discurso em inglês e retornou ao português quando falou de questões brasileiras. O aplauso mais longo veio ao dizer: “Perdi em vários momentos a popularidade, nunca a credibilidade”.
Fernando Henrique fez a primeira parte do discurso em inglês e retornou ao português quando falou de questões brasileiras. O aplauso mais longo veio ao dizer: “Perdi em vários momentos a popularidade, nunca a credibilidade”.
O ex-presidente criticou a omissão do governo brasileiro diante de
violações de “práticas democráticas” na Venezuela e atacou o que
considera uma tímida repulsa ao terrorismo. “Não há sequer como pensar
em negociar com quem exibe as cabeças cortadas dos ‘infiéis’”, declarou,
em referência indireta ao discurso de Dilma na Assembleia-Geral da
Organização das Nações Unidas (ONU) do ano passado, no qual ela defendeu
o diálogo para solução da crise gerada pela emergência do Estado
Islâmico.
“Se quisermos participar da mesa decisória do mundo, temos de nos
comprometer com os valores democráticos e dar-lhes consequência”,
afirmou FHC. Para ele, em um mundo globalizado não há lugar para a
“mudez solidária” em nome da autodeterminação.
Ao mesmo tempo em que condenou a atual política externa brasileira, FHC
criticou a ingerência e a busca de hegemonia pelos Estados Unidos.
Segundo ele, são traços que começaram a ser modificados na gestão de
Clinton e prosseguem com Barack Obama em tentativas de acordo nuclear
com o Irã e reatamento de relações diplomáticas com Cuba.
Dilma quebra tradição e ignora prêmio a FHC
Dilma quebrou uma tradição de 47 anos. Pela primeira vez, o presidente
brasileiro não manda uma mensagem de congratulações ao vencedor do
prêmio ‘Pessoa do Ano’, concedido pela Câmara de Comércio Brasil-Estados
Unidos. A premiação é dada sempre a um brasileiro e um americano que
tenham se destacado na aproximação entre os dois países. Neste ano, os
homenageados são Fernando Henrique Cardoso e Bill Clinton. A cerimônia
aconteceu no Hotel Waldorf-Astoria, em Nova York, como manda a tradição.
No salão lotado, entre os mais de mil convidados sentados às mesas,
estão tucanos de alta plumagem, empresários e banqueiros. Todos saíram
do Brasil especialmente para a cerimônia – talvez a mais concorrida de
todos os tempos.
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