Planalto escolheu chineses
para construir gasoduto da Petrobras
Lula admitiu em 2010 que decisão teve motivação ideológica; ministros fizeram votação na Granja do Torto
Gabrielli, Lula, Dilma e Wagner (encoberto) na inauguração do gasoduto em 2010: superfaturamento e empresa que existe só no papel |
Apesar de a Petrobras defender oficialmente que se manteve dissociada da
empresa criada para construir a rede de gasodutos Gasene, foi o próprio
governo do ex-presidente Lula que escolheu os chineses como parceiros
nas obras dos quase mil quilômetros de dutos entre Cacimbas (ES) e Catu
(BA). A decisão a favor dos chineses foi tomada dentro da Granja do
Torto (residência presidencial), e, segundo afirmou o próprio Lula, teve
viés “ideológico”.
Ao discursar na inauguração do trecho baiano do gasoduto, em 26 de março
de 2010, Lula revelou que a escolha se deu por meio de uma votação
entre ministros, e com a ciência da então ministra de Minas e Energia,
Dilma Rousseff. Já havia uma negociação em andamento com parceiros
japoneses, mas o governo agiu diretamente na definição do projeto.
Lula disse no discurso: “Sabe o companheiro José Sergio Gabrielli
(ex-presidente da Petrobras), sabe a ministra Dilma (...) que a decisão
de fazer este gasoduto com a China foi uma decisão ideológica. Nós já
tínhamos um estudo e um trabalho avançado com o banco japonês — o JBIC —
para financiar a obra, quando, em 2004, lá na Granja do Torto, eu e
alguns ministros fomos discutir se a gente ia fazer parceria com a China
ou com o Japão. (...) E foi a primeira e última vez em que eu fiz uma
votação no Ministério. (...) A China ganhou por quatro a dois, e nós
fizemos a parceria com a China”.
O GLOBO revelou no domingo (04.jan.2015) que a Petrobras criou uma empresa de fachada para construir o gasoduto.
A Transportadora Gasene funcionou na mesma sede de um escritório de
contabilidade no Rio, contratado para a prestação de serviços contábeis
ao negócio. O dono do escritório foi colocado como laranja na
presidência da empresa — uma sociedade de propósito específico (SPE) —
responsável por investimentos de R$ 6,3 bilhões.
AUDITORES CITAM CHINESES
Técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU) reproduziram em auditoria
de dezembro que a Agência Nacional de Petróleo (ANP) considerou como
“empresas de papel” os empreendimentos criados. Trechos das obras entre
Cacimbas e Catu foram superfaturados em mais de 1.800%, segundo o
relatório técnico.
“A SPE não tem qualquer ligação societária com a Petrobras”, argumentou a
direção da estatal, em nota. O arranjo financeiro para a Gasene foi
estruturado pela área financeira da Petrobras entre 2004 e 2005, segundo
a estatal.
A escolha feita dentro da Granja do Torto resultou em problemas
posteriores, como consta na auditoria do TCU. Os auditores citam que a
contratação da chinesa Sinopec International Petroleum pela
Transportadora Gasene, a um custo de R$ 266,2 milhões, foi “condição
preestabelecida pelas autoridades chinesas para financiamento ao
projeto”. O banco de desenvolvimento da China financiou parte do
projeto.
A área técnica do TCU considerou que a dispensa de licitação para a
contratação da Sinopec feriu a Constituição brasileira. O relatório pede
a responsabilização de Gabrielli e do ex-presidente da Transportadora
Gasene Antônio Carlos Pinto de Azeredo, que diz ter sido apenas um
“preposto” na função. Gabrielli e Azeredo já encaminharam defesas ao
TCU, mas o tribunal não viu motivos para dispensa de licitação e
rejeitou as justificativas.
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