Lava-jato: CGU tentou limitar
punições de empreiteiras a multas
Proposta foi recusada pela
força-tarefa do Ministério Público Federal
Os procuradores Orlando Martello, Deltan Dallagnol e Eduardo Pelella, do MPF |
A Controladoria-Geral da União (CGU) tentou fazer um acordo com a
força-tarefa do Ministério Público Federal encarregada da Operação
Lava-Jato para limitar punições às empreiteiras envolvidas em
fraudes na Petrobras, evitando que elas fossem declaradas inidôneas
e, consequentemente, ficassem impedidas de fechar novos contratos
com o governo federal. A proposta, revelada por uma das autoridades
que acompanha as investigações, foi rejeitada pela força-tarefa. O
acordo foi encarado pelos investigadores como uma tentativa do
governo de salvar empresas que estão à frente de grandes obras
públicas no país.
A proposta foi apresentada a um grupo de procuradores da República
pelo secretário executivo da Controladoria-Geral, Carlos Higino, no
fim do mês passado. Higino sugeriu a fixação de multas às
empreiteiras como punição máxima em âmbito administrativo. Com isso,
as empresas teriam que devolver aos cofres públicos uma quantia em
dinheiro, mas se livrariam da punição mais drástica: a declaração de
inidoneidade.
Mas o MPF entendeu que não seria possível limitar as punições a
multas às empresas que até o momento não aceitaram colaborar com as
investigações. Por enquanto, a maioria das construtoras apenas
aceita reconhecer parte das acusações e pagar uma indenização.
Um possível acordo com a CGU sem um entendimento prévio com o
Ministério Público não garantiria, no entanto, que as empreiteiras
se livrariam de ações penais, nem mesmo de uma eventual tentativa do
MPF de, pela via judicial, pedir que as empresas envolvidas ficassem
impedidas de fazer qualquer contrato com o governo.
Carlos Higino, secretário executivo da Controladoria-Geral da União |
CONFIRMADO
Higino confirmou a tentativa de entendimento.
— O processo punitivo leva à declaração de inidoneidade. E a
experiência que tivemos com a Delta e a Gautama (construtoras
punidas em escândalos anteriores) é que a declaração de inidoneidade
provoca uma grande possibilidade de fechar a empresa —disse.
Durante a negociação, Higino e seus auxiliares argumentaram que
seria melhor aplicar multas às empreiteiras agora e receber o
dinheiro o mais brevemente possível. Uma punição mais drástica, no
curso normal dos processos penais e administrativos, poderia chegar
tarde demais, segundo esse raciocínio.
Na conversa, os representantes da CGU alegaram que algumas
empreiteiras poderiam entrar em crise financeira e não teriam
dinheiro nem mesmo para ressarcir parcialmente os prejuízos. A
insolvência poderia até contaminar o sistema financeiro,
especialmente bancos que abrigam negócios das empresas.
Higino disse que não buscava um acordo coletivo. A ideia, segundo
ele, seria negociar acordos individuais conforme as peculiaridades
de cada caso. Ele argumenta que a ideia não é proteger a empresa do
risco financeiro. Mas evitar que uma punição severa resulte em perda
total para os cofres públicos.
— A ideia é evitar uma vitória de Pirro: quebra-se a empresa e não
se recupera um tostão para o serviço público — afirmou Higino.
As duas partes não chegaram a um consenso, mas as tratativas
prosseguem. Se quiser, a Controladoria-Geral pode fazer acordos de
leniência com as empreiteiras independentemente da opinião dos
procuradores. A chancela prévia do Ministério Público evitaria
futuras contestações jurídicas das decisões sobre as empreiteiras, e
ainda facilitaria a adesão das empresas.
Em outra frente, procuradores da força-tarefa dependem também da
Controladoria-Geral e do Tribunal de Contas da União para calibrar
as punições às empresas que decidirem colaborar com as investigações
nos processos penais. Sem algum tipo de compensação em âmbito
administrativo, algumas empresas poderiam se sentir pouco
estimuladas a colaborar na esfera penal.
EMPREITEIRAS PROPUSERAM PAGAR R$ 1 BILHÃO
Desde que foram alvo da sétima fase da Operação Lava-Jato, as
empreiteiras vêm tentando em várias frentes negociar um acordo para
atenuar suas punições. Representantes das empresas procuraram o
Ministério Público Federal para negociar o pagamento conjunto de R$
1 bilhão de multa. Em troca queriam um abrandamento das penas. Os
procuradores recusaram. Para eles, só seria possível fazer acordo se
os executivos decidissem contar o que sabem sobre os desvios de
dinheiro na Petrobras.
Numa conversa com parlamentares, o procurador-geral da República,
Rodrigo Janot, chegou a declarar que não havia hipótese de aceitar
acordo coletivo com as empreiteiras. O procurador até ironizou a
iniciativa. Para ele, a iniciativa seria uma espécie de “cartel da
leniência”. Em dezembro, Janot afirmou que o Ministério Público está
atuando para não deixar ninguém impune.
— Ninguém se beneficiará de ajustes espúrios. Isso todos temos de
ter certeza. A resposta para aqueles que assaltaram a Petrobras será
firme. A decisão é ir fundo nas responsabilizações civil e criminal.
Mesmo diante das condições estabelecidas pelo MPF, as empreiteiras
continuaram numa busca incessante por uma alternativa a punições
máximas. Entre os papéis apreendidos na Engevix, em novembro
passado, a PF encontrou uma anotação em que o autor faz referência à
urgência de um acordo.
Para o autor do documento, Janot e o ministro Teori Zavascki, do
Supremo, dificilmente adotariam medidas extremas. “Janot e Teori
sabem que não podem tomar a decisão. Pode parar o país”, diz a
anotação, de 6 de novembro.
Nas últimas semanas surgiram rumores de que pelo menos duas das
grandes empresas estão com dificuldades para pagar dívidas e
contrair novos empréstimos. As dificuldades aumentaram depois que a
Petrobras anunciou, em 30 de dezembro, que as 23 investigadas na
Lava-Jato estão proibidas de participar de novas licitações e serão
alvos de processos individuais.
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