Cidade na Dinamarca oferece a
radicais programa de reabilitação
Iniciativa foi criada depois que 30
jovens muçulmanos de Aarhus viajaram para a Síria em 2013.
Extremistas recebem atendimento psicológico e ajuda para retomarem estudos ou trabalho, mas são monitorados.
Extremistas recebem atendimento psicológico e ajuda para retomarem estudos ou trabalho, mas são monitorados.
Em meados de 2013, o dinamarquês Mohamed, 25, viajou às cidades
sírias de Idlib e Aleppo para se juntar a grupos extremistas
islâmicos. Dois meses depois, voltou para casa, em Aarhus, segunda
maior cidade da Dinamarca.
"Decidi fazer a viagem por causa da opressão do regime de Bashar
al-Assad contra inocentes sírios, mas retornei porque vi que não
podia ajudar como imaginava", disse Mohamed.
Ele não revela o sobrenome, nem permite que sejam feitas imagens.
Não quer ser identificado como alguém que foi para a "jihad", a
guerra sagrada dos muçulmanos.
Mohamed integra um programa de reabilitação de jihadistas criado em
2014 em Aarhus para "desradicalizar" jovens como ele e evitar que
outros tracem a mesma rota.
Essa "segunda chance" surgiu após o serviço de inteligência de
Aarhus descobrir que 30 jovens muçulmanos haviam viajado para a
Síria em 2013 - número considerado alto em uma cidade de cerca de
300 mil habitantes.
Desses 30, 22 frequentavam a mesma mesquita, num bairro na periferia
onde vive a comunidade islâmica.
O centro recebeu um ultimato das autoridades: deveria ajudar a
conter o fluxo e combater o extremismo ou correria risco de ser
fechado.
"Eu não tenho aeroporto. A polícia sabe por onde eles foram. Não
temos responsabilidade pela viagem", disse Oussama el-Saadi,
palestino que comanda a mesquita.
Ele diz reconhecer oito desses 22. A maioria, entre 18 e 25 anos,
foi combater o regime do ditador Bashar al-Assad, e cinco morreram,
segundo as autoridades da Dinamarca.
REINSERÇÃO
O movimento criou um impasse: a legislação dinamarquesa não
restringe que um cidadão viaje àquela região e muito menos que
retorne ao território dinamarquês.
Então como lidar com riscos de atos de extremismos se eles decidirem
voltar para casa? A solução foi um programa para "desradicalizá-los"
e reinseri-los na sociedade.
"Uma alternativa é não fazer nada, o que pode ser um risco à
sociedade. O que podemos fazer para reduzir esse risco? Ajudá-los no
retorno", disse Jorge Ilum, diretor-geral da polícia de Aarhus.
O programa é uma parceria entre a prefeitura e a polícia, com a
colaboração de uma universidade e sem custo para o jihadista.
É um projeto impensável em países como Reino Unido, Alemanha,
Bélgica, Espanha e França, que têm buscado aumentar o controle e
barrar o retorno de quem buscou o caminho do conflito no Oriente
Médio - e se possível, prendê-lo.
Recentemente, um brasileiro de 18 anos foi preso pela Interpol na
Bulgária a caminho da Síria. É acusado na Espanha de integrar a
facção radical Estado Islâmico (EI).
RESULTADOS
Ao que parece, a iniciativa na Dinamarca tem dado resultado: em
2014, segundo o governo local, apenas um jovem de Aarhus foi para a
Síria.
Pelo menos 16 dos 30 que viajaram em 2013 regressaram à cidade no
ano passado, parte porque soube do programa por meio de parentes.
"O programa não é uma loja de presentes para eles. É também uma
maneira possível de criar estabilidade e segurança para a sociedade
local", afirmou à reportagem Toke Agerschou, chefe da secretaria de
jovens da cidade.
Os dados e nomes deles são tratados com sigilo. De maneira privada,
jovens e a família recebem atendimento psicológico, em parceria com
a Universidade de Aarhus, e orientações para não retornar ao
conflito.
Ainda são auxiliados a retomarem estudos e empregos, sem
necessariamente revelar o passado. E, claro, são monitorados.
"Nós dizemos a eles: Sabemos onde vocês estão'", diz o diretor da
polícia.
Além disso, reuniões abertas são realizadas com outros jovens,
algumas na mesquita de El-Saadi, para discutir o radicalismo - sem
entrar no mérito da crença religiosa, enfatizam as autoridades.
A lei dinamarquesa permite prendê-los e processá-los só se houver
indícios de que praticaram atos terroristas ou assassinatos durante
a estada na Síria.
Os que retornaram, entre eles Mohamed, negam isso e a polícia até
agora não encontrou provas que os incriminem. "Não é justo achar que
todos que vão para lá querem lutar", diz o jovem.
O chefe da mesquita frequentada por ele, porém, admite: "Alguns
contam que vão por motivos humanitários e lá dizem: Ok, podemos
entrar na luta também'".
Chefe de mesquita diz cooperar com
ação para recuperar jovens
Centro é apontado como origem da radicalização dos
muçulmanos
Chefe da mesquita apontada como origem do radicalismo dos jovens de
Aarhus, Oussama el-Saadi diz que o programa de reabilitação é
positivo e que tem colaborado com a iniciativa da prefeitura ao
abrir a mesquita ao debate.
Até agora, segundo ele, foram sete os encontros desse tipo. "Aqui é
uma casa aberta, recebemos todo mundo. Não conhecemos todos,
qualquer um pode entrar e sair. Às sextas-feiras temos entre 500 e 1
mil pessoas", afirmou, em entrevista concedida na mesquita.
Como a mesquita participa do programa de reabilitação?
Oussama El-Saadi - Nós intermediamos o contato. Num
primeiro momento, os jovens não gostam de encontrar a polícia,
que pediu para ajudá-la. Nós organizamos reuniões, algumas
fechadas, só com os que viajaram, outras abertas, com outros
jovens.
Por que considera injusta a ligação da sua mesquita com as
viagens?
Oussama El-Saadi - Nós falamos para a
polícia: Se você quer que ajudemos, precisam concordar que somos
parte dessa sociedade'. Nós vivemos num país livre, temos o
direito de ter religião, de ter um pensamento. Nós acreditamos
que a violência não é o caminho.
Não fazemos um discurso para as pessoas irem para lá, mas somos muçulmanos e sentimos por nossos irmãos na Síria e conversamos abertamente sobre isso, sobre o regime do [ditador Bashar] al-Assad, como derrubá-lo.
Não fazemos um discurso para as pessoas irem para lá, mas somos muçulmanos e sentimos por nossos irmãos na Síria e conversamos abertamente sobre isso, sobre o regime do [ditador Bashar] al-Assad, como derrubá-lo.
O senhor acredita que o programa é positivo?
Oussama El-Saadi - Eu acho que todos os
países deveriam ter isso, mas não só centrado nos muçulmanos. Na
Dinamarca temos centenas de judeus indo para Israel, e ninguém
fala disso, temos muitos curdos viajando para o Iraque, mas o
programa só trata de jihadistas.
Por que esses jovens vão para a Síria?
Oussama El-Saadi - Por vários motivos: a
maioria por questões humanitárias e muitos por causa das mídias
sociais, por onde conseguem ver muita coisa.
E por que voltam para a Dinamarca?
Oussama El-Saadi - Muitos dizem que voltaram
para visitar a família, alguns por causa do programa de
reabilitação, outros desiludidos com os conflitos entre as
próprias milícias.
Muitos foram em 2013, quando o Estado Islâmico ainda não estava forte, e dizem que decidiram voltar por não concordar com o confronto entre milícias, como o da al-Nusra com o EI.
Muitos foram em 2013, quando o Estado Islâmico ainda não estava forte, e dizem que decidiram voltar por não concordar com o confronto entre milícias, como o da al-Nusra com o EI.
Eles contam se pegaram em armas?
Oussama El-Saadi - Alguns deles sim, porque
a situação está extrema na Síria.
É correto chamá-los de jihadistas?
Oussama El-Saadi - Sim, eles são jihadistas.
Jihad é fazer algo para ajudar. Quando converso com você agora,
é jihad, porque eu tento explicar o que é bom na mesquita.
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