domingo, 8 de fevereiro de 2015


Impeachment é golpe?

Hélio  Schwartsman
"Qualquer deputado pode pedir à Mesa da Câmara a abertura de processo [de impeachment] contra o presidente da República. Dizer que isso é golpe é falta de assunto." A frase não é de um tucano em busca do 3º turno, mas de um petista insuspeito. Ela foi articulada por José Dirceu em 1999, quando o PT liderava um movimento para afastar o então recém-reeleito Fernando Henrique Cardoso, que, como Dilma, perpetrara um estelionato eleitoral ao manipular o câmbio em favor de sua candidatura.
Trago essas incômodas lembranças numa tentativa de flagrar o militante, petista ou tucano, no ato de aplicar pesos diferentes à mesma medida. Se deixarmos de lado a paixão política para tentar pensar os conceitos com rigor, teremos de concordar com Dirceu. O impeachment é o contrário de um golpe. Trata-se de um mecanismo constitucionalmente previsto que pode ser utilizado para sair de certas crises. Embora seja um processo traumático, é certamente preferível a tanques nas ruas.
Como toda relíquia institucional, o impeachment encerra ambiguidades. Ele surgiu na Inglaterra medieval como um procedimento penal. Para que seja aplicado, a autoridade precisa ser acusada de um "crime de responsabilidade". Mas a definição do que seja esse tal de crime de responsabilidade é suficientemente aberta para comportar qualquer coisa, o que permite que o instituto seja utilizado como instrumento político.
Na prática, o impeachment é um mecanismo de revogação de mandato travestido de trâmite judicial. Seria legal trocá-lo pelo mais moderno recall de voto, que existe na Venezuela e em porções dos EUA, mas é improvável que legisladores transfiram à população um poder que hoje é seu.
Quanto a Dilma, não creio que ela será afastada nem o desejo. É sempre mais didático quando o governante conclui seu mandato. É nessas horas que o eleitor decide se vai ou não rejeitar as políticas por ele adotadas.

Ainda o impeachment
As razões pelas quais não acredito muito que a presidente Dilma Rousseff venha a sofrer impeachment e os motivos pelos quais não desejo que isso ocorra.
Hoje, a cada desdobramento da Operação Lava Jato, a situação parece ficar pior para o governo do PT e para Dilma. É preciso considerar, porém, que nossa amostra é, por assim dizer, viciada. Por enquanto, estão sendo divulgadas só acusações referentes a indivíduos que não têm foro privilegiado. Dentro de algumas semanas, quando vier à luz a parte atinente a políticos, que tramita no STF, a distribuição das suspeitas deve ficar um pouco mais democrática.
Se as informações de bastidores publicadas na imprensa são corretas, gente importante de outros partidos também vai ganhar espaço no noticiário. Especula-se até que os nomes dos presidentes da Câmara e do Senado poderão aparecer. Não é impossível que o Legislativo saia tão ou mais fragilizado quanto o Executivo.
E esse é o tipo de situação que gera pizza. Sem um fato novo que ligue diretamente Dilma a um malfeito, o mais provável é que parlamentares façam algum teatro, mas, no fundo, trabalhem para que o "status quo", do qual são beneficiários, seja mantido.

E por que o impeachment é indesejável? Destituir a presidente não seria o melhor meio de "cortar o mal pela raiz". Não gosto da ideia de reduzir o problema da corrupção ao nome de Dilma. Nada indica que ela seja a mentora nem a maior favorecida pelo esquema. Creio que faz mais sentido que as pessoas possam ver o resultado das políticas que ela adotou e tenham a chance de rejeitá-las. Esse processo de exclusão de más ideias, que é a base do avanço institucional, fica mais transparente quando os governantes concluem seus mandatos.

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