sábado, 20 de outubro de 2018



WhatsApp revoluciona pensamento petista






A notícia de que empresários financiam ilegalmente o envio massivo de mensagens anti-PT via WhatsApp revolucionou o pensamento do Partido dos Trabalhadores sobre as prisões, as delações e o trabalho da imprensa. Em menos de 24 horas tudo o que o partido considerava como afronta ao Estado Democrático de Direito nos quatro anos e meio de duração da Lava Jato passou a ser legal, necessário e urgente.
Em sua primeira manifestação sobre o caso, o presidenciável petista Fernando Haddad disse que o rival Jair Bolsonaro “deixou rastro” que permite vinculá-lo ao esquema de difusão de mensagens. Implacável, Haddad defendeu o uso da prisão como meio de obtenção de confissões. Mesmo que disponha, por ora, apenas de uma notícia de um jornal que o petismo incluía até ontem no rol da “mídia golpista”.
“Se você prender um empresário desses, ele vai fazer delação premiada”, declarou Haddad. “Basta prender um empresário que vai ter delação premiada e vão entregar a quadrilha toda. Nós estamos falando de 20 a 30 empresários envolvidos nesse esquema. Se prender um, em menos de dez dias a gente vai ter a relação de todos os empresários que estão financiando com caixa dois uma campanha difamatória.”
No petrolão, o PT condena as prisões mesmo quando são precedidas de meticulosos inquéritos. Em junho de 2015, a Executiva Nacional da legenda divulgou uma resolução para manifestar sua preocupação com as consequências do “prejulgamento de empresas acusadas no âmbito da Operação Lava-Jato”.
A manifestação do PT ocorreu cinco dias depois do encarceramento preventivo dos executivos das duas maiores empreiteiras do país: Marcelo Odebrecht, da empresa que leva o sobrenome de sua família, e Otávio Azevedo, da Construtora Andrade Gutierrez. Hoje, sabe-se que ambos estavam lambuzados com o óleo queimado da Petrobras até o último fio de cabelo.
No item de número quatro, o texto da resolução do PT desautoriza prisões como as que Haddad passou a defender: “Se o princípio de presunção de inocência é violado, se o espetáculo jurídico-político-midiático se sobrepõe à necessária produção de provas para inculpar previamente réus e indiciados; se as prisões preventivas sem fundamento se prolongam para constranger psicologicamente e induzir denúncias, tudo isso que se passa às vistas da cidadania, não é a corrupção que está sendo extirpada. É um Estado de exceção sendo gestado em afronta à Constituição e à democracia”.
Dias depois da divulgação da resolução petista, ainda em junho de 2015, a então presidente Dilma Rousseff torpedeou numa entrevista o instituto da delação premiada, incluído numa lei que ela própria havia sancionado. Um dos delatores da Lava Jato, o empreiteiro Ricardo Pessoa, dono da UTC, informara em depoimento que fizera repasses ilegais à campanha de Dilma à reeleição, em 2014. E ela: “Não respeito delator, até porque estive presa na ditadura militar e sei o que é. Tentaram me transformar numa delatora (…) e garanto que resisti bravamente”.
Não bastasse o ataque a um mecanismo que se revelou vital para o êxito do combate à corrupção, Dilma misturou democracia com ditadura. Deu de ombros para o fato de que a delação que sancionara, longe de assemelhar-se à tortura, é uma ferramenta que a legislação oferece à defesa dos encrencados. É uma oportunidade que o criminoso tem de trocar a confissão por benefícios penais.
No mês passado, o próprio Haddad foi denunciado pelo Ministério Público paulista com base numa delação do mesmo empreiteiro Ricardo Pessoa. Acusaram-no de corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa. De acordo com a denúncia, Haddad recebeu da UTC propina de R$ 2,6 milhões para pagamento de dívida contraída durante sua campanha à prefeitura de São Paulo, em 2012.
A exemplo de Dilma, Haddad desqualificou o delator. O adjetivo mais brando que utilizou foi “mentiroso”. Em nota, o comitê de campanha do PT esculachou também o Ministério Público: “Surpreende que, no período eleitoral, uma narrativa do empresário Ricardo Pessoa, da UTC, sem qualquer prova, fundamente três ações propostas pelo Ministério Público de São Paulo contra o ex-prefeito e candidato a vice-presidente da República, Fernando Haddad”.
No episódio das mensagens de WhatsApp, cuja divulgação é atribuída a empresários a serviço de Bolsonaro, o PT é bem mais rigoroso. Trata o noticiário da ex-mídia golpista como elemento de prova: “Reportagem da Folha de S.Paulo desta quinta-feira (18.out.2018) confirma o que o PT vem denunciando ao longo do processo eleitoral: a campanha do deputado Jair Bolsonaro recebe financiamento ilegal e milionário de grandes empresas para manter uma indústria de mentiras na rede social WhatsApp”, escreveu o partido em texto veiculado no seu site.
Está em jogo agora, segundo o novo conceito do PT, “a sobrevivência do processo democrático”. A legenda tem razão. O surpreendente é que, no ano passado, o PT pediu e obteve no Tribunal Superior Eleitoral o arquivamento da denúncia de abuso de poder econômico praticado pela chapa Dilma Rousseff-Michel Temer na eleição de 2014.
O processo foi arquivado por excesso de provas. Por um placar apertado — 4 votos a 3 — os ministros do TSE decidiram enterrar evidências vivas de que a Odebrecht pagara com dinheiro sujo da Petrobras o marketing que moeu adversários do PT como Marina Silva e produziu o estelionato eleitoral que reconduziu Dilma e Temer ao Planalto.
Nessa época, o PT não via no financiamento ilegal de campanhas um risco ao “processo democrático”. Fraude mesmo, alardeou a legenda neste ano de 2018, é uma eleição sem Lula, um político preso que o PT tentou, sem sucesso, transformar em “preso político”. Não é à toa que Jair Bolsonaro está prestes a ser eleito pela maior força política existente no país: o antipetismo. Em matéria criminal, o PT é capaz de quase tudo, menos de oferecer algo que se pareça com um mea-culpa.


Pesquisas antecipam o fim da hegemonia lulista


Nas últimas quatro sucessões presidenciais, Lula mandou e, sobretudo, desmandou no poder federal. Elegeu-se duas vezes. E transformou Dilma Rousseff num conto do vigário no qual o eleitorado caiu um par de vezes. Esse poder hegemônico de Lula, informam todas as pesquisas, está com os dias contados. Acabará no próximo dia 28 de outubro.
Deve-se o infortúnio de Lula ao próprio Lula, que conseguiu converter Fernando Haddad, seu segundo poste, em candidato favorito a transformar Jair Bolsonaro no próximo presidente da República. Lula escolheu seu próprio caminho para o inferno ao imaginar que poderia prevalecer impondo uma nova solução doméstica petista.
Preso, Lula sabia que sua foto dificilmente estaria na urna de 2018. Poderia ter transferido eleitores para um candidato fora dos quadros do PT. Tinha em Ciro Gomes uma versão livre do contágio da Lava Jato. Mas preferiu a aposta mais arriscada. Ao lançar um poste do PT, descobriu que o antipetismo é, hoje, mais forte que o lulismo. Lula chega ao fim da sua era como cabo eleitoral da ultradireita.



Divulgada a dez dias do segundo turno, a nova pesquisa do Datafolha deu à sucessão presidencial uma aparência de jogo jogado. O staff de Jair Bolsonaro mal consegue conter a euforia. Como sua liderança não chegou a ser colocada em xeque por Fernando Haddad, o capitão aproxima-se do Planalto como se recebesse um cheque em branco do eleitorado. Engano.
O principal atributo de campanhas como a de Bolsonaro, que irradiam um imaginário forte, é ter rompido com a situação anterior, dando a impressão de que nada será como antes. Não é pouca coisa. Foi à cova no primeiro turno aquele PSDB que se oferecia como polo de poder há seis sucessões. Vão à lona no segundo round o petismo e, sobretudo, o lulismo.
No momento, o eleitor mostra-se pago e satisfeito com a retórica de Bolsonaro, feita de probidade, segurança e prosperidade. Mas a situação é mais complexa. Tão complexa que ficou simples como o ABC. A, o programa aguado de Bolsonaro produz alta expectativa; B, a boa vontade virará cobrança em janeiro; C, a corrosão da legitimidade do eleito crescerá à medida que o eleitor for percebendo que o único lugar onde o sucesso vem antes do trabalho é o dicionário.
Bolsonaro coleciona no Datafolha 59% das intenções de votos válidos, contra 41% atribuídos a Haddad. O petismo já se dedica à produção de teorias para explicar a derrota. O exercício é tão inevitável quanto inútil, pois não produz a hecatombe que seria necessária para engolir até 28 de outubro os 18 pontos percentuais que separam o substituto de Lula do seu algoz.
Um detalhe potencializa o desafio de Bolsonaro. O resultado da eleição será marcado não pela preferência, mas pela rejeição do eleitorado. Subiu para 54% a taxa de eleitores que declaram que jamais votariam em Haddad. Quer dizer: o capitão será empurrado para a cadeira de presidente pela maior força política da temporada: o antipetismo.
O índice de rejeição a Bolsonaro diminuiu. Mas continua enorme: 41%. Significa dizer que não haverá na plateia muita gente com disposição para aplaudir um governo que não entregue rapidamente a mudança que prometeu.
Do ponto de vista econômico, a aura de Bolsonaro já tem dono: o liberalismo do economista Paulo Guedes. Que esbarrará no fisiologismo do Legislativo. Do ponto de vista político, seu governo precisa virar o sistema do avesso. Fácil de prometer. Difícil de executar.
Em condições normais, o eleitor talvez se esforçasse para distinguir políticos melhores e piores. Mas os gatunos ficaram ainda mais pardos depois que a Lava Jato transformou a política em mais uma ramificação do crime organizado. Depois que o governo empregocida de Dilma Rousseff foi sucedido pela cleptogestão de Michel Temer, a ideologia do eleitor tornou-se uma espécie de radicalismo retrógrado, movido a fúria, desinformação e inconsequência. Deu em Bolsonaro.
Jogando parado, Bolsonaro avisou que não irá a nenhum debate, embora os médicos o tenham liberado. Segundo o Datafolha, 73% dos eleitores avaliam que ele deveria duelar com Haddad diante das câmeras. Entretanto, 76% declaram que não cogitam modificar o voto por causa de debates. Nesse contexto, a fuga parece um grande negócio para o favorito. Mas essa percepção só é válida até certo ponto. O ponto de interrogação.
É verdade que há algo de sádico na forma como os candidatos são expostos, questionados, insultados e até ridicularizados nos debates. Neste segundo turno de 2018, a perversão ganharia nova dimensão, pois um dos contendores convalesce de duas cirurgias provocadas por uma facada.
Mas o sadismo não seria necessário apenas para o esclarecimento de eleitores que parecem dar de ombros para o contraditório. Valeria mais pela educação democrática que propiciaria a um candidato com pendores autocráticos. O mesmo Datafolha que coloca Bolsonaro a um milímetro da poltrona de presidente da República já revelou que sete em cada dez brasileiros enxergam a democracia como o melhor sistema de governo.
É mais uma evidência de que, eleito, Bolsonaro não vai dispor de um cheque em branco do eleitorado. Tiros para o alto ou murros na mesa não serão aceitáveis. O capitão terá de aprender a negociar. Algo que jamais fez nos seus quase 28 anos de Parlamento.




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