quinta-feira, 6 de setembro de 2018



O brasileiro parece estar moralmente sedado



Na sexta-feira (07.set.2018), Dia da Independência, o brasileiro estará a um mês de mais um encontro com as urnas. E ninguém tem ideia do que pode acontecer na corrida presidencial mais imprevisível da era democrática. Noutros tempos, a essa altura do calendário, as pesquisas forneciam pistas mais sólidas. Hoje, elas demoram a ajustar a bússola.
As pesquisas são feitas com rigor científico. Mas o eleitor brasileiro nunca votou tão leigo quanto agora. Um pedaço grande do eleitorado, irritado, cogita votar em ninguém. Há quem imagine que, a partir de certo patamar, os votos anulados provocam nova eleição. Ilusão. Numa democracia, grande nulidades são eleitas principalmente pelos eleitores que não votam.
Nos próximos dias, novas pesquisas desovarão novos números na praça. Sem Lula, o jogo ficou mais claro apenas até certo ponto. O ponto de interrogação. É preciso encontrar não uma, mas pelo menos três respostas:
1) O eleitor de Bolsonaro é sólido ou gasoso?
2) O latifúndio eletrônico fará Alckmin levantar voo?
3) O eleitor de Lula ficará no cercadinho do PT ou se dissolverá entre Haddad, Marina, Ciro e ninguém?
Essas são as perguntas de R$ 1 milhão.

Jair Bolsonaro continua com um pé no segundo turno. Mas vai ganhando a aparência de candidato favorito a fazer do seu adversário no segundo turno o próximo presidente do Brasil. Bolsonaro lidera o ranking da rejeição: 44% dos eleitores afirmam que não votariam nele de jeito nenhum. Esse índice faz do capitão o adversário dos sonhos de todos os seus rivais, uma espécie de sparring. Para desassossego de Bolsonaro, todos os seus adversários têm índices de rejeição bem menores que os dele. E o candidato do PSL exibe na campanha um discurso que favorece a divisão, não a soma. É útil para solidificar o apreço dos convertidos. Revela-se ineficiente, porém, na atração de novos adeptos.
Mantendo-se essa tendência, a campanha será marcada nas próximas semanas por uma disputa pela única vaga à disposição no momento —a vaga de anti-Bolsonaro.

Em tempos de crise, uma mensagem capaz de se comunicar com o bolso pode render dividendos. Ciro Gomes, o candidato que promete tirar 63 milhões de eleitores do SPC foi o único a ultrapassar os limites da margem de erro de uma recente pesquisa, que é de dois pontos, subiu três.

O vínculo com Lula, outra fonte de votos na disputa de 2018, ainda não impulsionou o desempenho de Haddad. Ele continua frequentando o noticiário e o horário político no rádio e na TV como estepe do líder preso. O PT planeja formalizar a troca de Lula por Haddad apenas na próxima terça-feira (11.set.2018). Com isso, o novo poste terá escassos 26 dias para reivindicar os votos do padrinho, hoje dispersos. O egoísmo deixa Lula em posição confortável. Se Haddad chegar ao segundo turno, deverá o feito à divindade presidiária. Eventual infortúnio será debitado à falta de carisma do candidato-laranja.

Geraldo Alckmin encontrou uma fórmula inusitada para resolver seu problema de falta de votos. Como não consegue seduzir eleitores no volume que gostaria, quer proibir a divulgação da próxima pesquisa do Datafolha. Os advogados da coligação tucana formalizaram o pedido de censura em petição protocolada no Tribunal Superior Eleitoral.
Há na praça dois tipos de pesquisa de opinião: as que são feitas por encomenda dos políticos e as que são bancadas por veículos de comunicação. Uma serve para orientar os candidatos. E Alckmin gostaria que a outra servisse para desorientar a plateia. O pretexto para o pedido de censura foi o fato de o Datafolha ter substituído Lula por Haddad nos seus questionários sobre intenção de votos.
Nas palavras dos doutores a serviço de Alckmin, ''tem-se que ainda não existe pedido de registro de candidatura à Presidência da República pela Coligação Brasil Feliz, sendo certo, ainda, que Fernando Haddad não é candidato ao cargo titular, visto que está registrado como candidato a vice-presidente''.
Nas pesquisas telefônicas encomendadas pelo comitê de Alckmin, a candidatura de Haddad não só existe como passou a ser monitorada diariamente. Ao tentar evitar que o Datafolha leve suas informações à vitrine, o candidato expõe seu medo.


Num intervalo de 24 horas, o passado mal-assombrado de tucanos e petistas invadiu as campanhas de Geraldo Alckmin e de Fernando Haddad. Contra o presidenciável do PSDB, o Ministério Público de São Paulo ajuizou na quarta-feira (05.set.2018) uma ação de improbidade escorada em delações da Odebrecht. Contra o estepe de Lula, os promotores protocolaram na véspera uma denúncia criminal amparada em deduragem de Ricardo Pessoa, dono da UTC.
Alckmin e Haddad representam interesses políticos diferentes. Mas tornam-se seres indistinguíveis quando analisados apenas a partir das reações às encrencas judiciais. Jogados dentro do tanque de lama, os dois deslocam suas massas na mistura viscosa e esperneiam da mesma maneira que outros encrencados. Atribuem o mau jeito à perseguição política ou a tentativas espúrias de interferir na disputa eleitoral.
Alckmin é acusado de receber R$ 9,9 milhões do departamento de propinas da Odebrecht para sua campanha de 2014. Haddad é acusado de morder R$ 2,6 milhões da UTC em 2013, para tapar um buraco de sua campanha para prefeito. Não há nenhuma sentença. Mas, em condições normais, os dados seriam levados em conta no julgamento dos eleitores. O problema é que a sujeira generalizou-se de tal maneira que o brasileiro parece estar moralmente sedado.




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