O grupo gaúcho de comunicação RBS pagou R$ 2,5 milhões a ministro do TCU para anular multa tributária no CARF
O MPF apresentou mais uma denúncia derivada das
investigações da Operação Zelotes, que desmontou esquema de corrupção no
Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). O alvo dessa vez é o
grupo RBS, que tentava anular uma multa tributária de meio bilhão de
reais.
O Ministério Público Federal (MPF) apresentou na
sexta-feira (30.nov.2018) uma nova denúncia no âmbito da Operação
Zelotes, responsável por desmantelar um esquema de crimes contra a
administração estruturado junto ao Conselho Administrativo de Recursos
Fiscais (Carf). Além de denunciar 14 pessoas, o documento menciona a
suposta ligação do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Augusto
Nardes com os acusados no esquema apontado envolvendo o grupo RBS.
De acordo com os procuradores, Nardes mantinha
proximidade e “parceria nos ilícitos” com sócios da consultoria SGR, que
seria intermediária dos pagamentos de vantagens indevidas que
supostamente favoreceriam a RBS no Carf. Segundo o MPF, o processo
administrativo fiscal envolvia uma autuação tributária imposta ao grupo
de mais de R$ 500 milhões.
Segundo o MPF, Augusto Nardes manteve “proximidade”
com José Ricardo Silva, da empresa de consultoria SGR, uma relação que
teria “assumido parceria nos ilícitos perpetrados".
A acusação entregue à Justiça pelo MPF ainda faz
menções ao deputado federal Afonso Motta (PDT-RS), ex-diretor jurídico
do grupo de comunicação RBS, no suposto esquema de corrupção para evitar
que a empresa pagasse uma multa de mais de meio bilhão de reais à
Receita Federal.
De acordo com emails obtidos pelos procuradores,
Nardes recebeu R$ 1,6 milhão da SGR, empresa que fazia distribuição de
propinas. Nardes e Motta não foram denunciados, mas sim os demais
participantes do esquema. Por terem foro privilegiado, o ministro e o
deputado respondem a um inquérito semelhante no Supremo Tribunal Federal
(STF).
“Tais elementos demonstram que a proximidade entre
os sócios da N&P (João Augusto Ribeiro Nardes e Carlos Juliano
Nardes) e da SGR (José Ricardo da Silva, João Batista Gruginski, Edison
Pereira Rodrigues) estava além de um mero contato profissional
ocasional, tendo perdurado e assumido parceria nos ilícitos
perpetrados”, afirma trecho da denúncia, referindo-se a emails
encontrados durante a investigação. Essas mensagens, segundo o MPF,
apontam Nardes e um sobrinho como beneficiários de mais R$ 2 milhões,
vindos da SGR.
“Em 24 de fevereiro de 2012, Gegliane repassou a José
Ricardo controle de pagamentos atualizado (DOC.038). A soma dos valores
atribuídos ao “TIO” e “JU” corresponde à R$ 2.556.974,00 (dois milhões,
quinhentos e cinquenta e seis mil, e novecentos e setenta e quatro
reais), sendo R$ 1,65 milhão à João Augusto Nardes”, explica o
Ministério Público. Em 2012, Nardes já era ministro do TCU, onde está
desde 2005.
O ministro do TCU, João Augusto Ribeiro Nardes,
tem foro privilegiado e não é um dos denunciados pelo MPF, como explicam
os procuradores. “Em razão da prerrogativa de foro detida por João
Augusto, uma vez que este ocupa o cargo de Ministro do Tribunal de
Contas da União — TCU, as menções ao seu nome são exclusivamente para
contextualizar os fatos, não significando nenhum juízo sobre o conteúdo
jurídico de suas condutas”, assinalam. Por outro lado, Nardes é alvo de
inquérito no STF que apura seu suposto envolvimento no caso. O processo
está na PGR desde fevereiro para realização de coleta de provas.
Augusto Nardes era dono de uma empresa contratada
pela SGR, mas afirmou recentemente que deixou essa firma e que “não
assinou nada com a RBS”. O grupo de comunicação também tem negado sua
relação com firmas do ministro e rejeitado qualquer autorização para a
SGR subcontratá-las.
Um dos denunciados na recente acusação do MPF é
José Ricardo da Silva, da SGR e ex-integrante do Carf, apontado na
Zelotes como lobista que intermediava negociações entre contribuintes e
membros do tribunal administrativo. “No caso específico da presente
denúncia, todos que de alguma forma concorreram para o objetivo final
foram agraciados com valores significativos, até mesmo aqueles cujas
condutas limitaram-se a indicar, aproximar e avalizar a associação
criminosa comandada por José Ricardo da Silva”, afirmam os procuradores.
O Advogado Marlus Arns de Oliveira, que atua na
defesa de José Ricardo Silva, informou que seu cliente não foi intimado
pela Justiça e, quando isso ocorrer, apresentará seus argumentos de
defesa nos autos.
Além de José Ricardo Silva, outros 13 foram
denunciados por crimes como corrupção ativa, corrupção passiva, lavagem
ou ocultação de bens, que, segundo o MPF, resultaram na manipulação do
julgamento do Carf para favorecimento indevido ao grupo RBS.
Na denúncia, o MPF acusa também os conselheiros do
Carf à época dos fatos, Leonardo Henrique Magalhães de Oliveira e Carlos
Alberto Gonçalves Nunes — já falecido —, de receber propina para dar
decisões favoráveis à RBS.
Eles teriam recebido o dinheiro por meio de intermediários, como o sobrinho de Nardes, Carlos Juliano Nardes, e os ex-conselheiros do Carf José Ricardo Silva e Edison Rodrigues. De acordo com a participação de cada um, eles são acusados de corrupção ativa e passiva, além de lavagem de dinheiro. A fonte dos subornos seria a RBS, representada pelo deputado Afonso Motta.
Oliveira afirmou que soube da acusação pela reportagem, não tem conhecimento da denúncia, e que, se for o caso, se manifestará através de seu advogado.
Eles teriam recebido o dinheiro por meio de intermediários, como o sobrinho de Nardes, Carlos Juliano Nardes, e os ex-conselheiros do Carf José Ricardo Silva e Edison Rodrigues. De acordo com a participação de cada um, eles são acusados de corrupção ativa e passiva, além de lavagem de dinheiro. A fonte dos subornos seria a RBS, representada pelo deputado Afonso Motta.
Oliveira afirmou que soube da acusação pela reportagem, não tem conhecimento da denúncia, e que, se for o caso, se manifestará através de seu advogado.
O advogado Eduardo Toledo, que representa Edison
Rodrigues, afirmou que “desconhecendo os termos da acusação, é
impossível se manifestar”. Ainda segundo a defesa, seu cliente “não
cometeu ilícito algum no exercício de conselheiro”.
De acordo com o MPF, a aproximação entre a empresa
devedora do Fisco (Grupo RBS) e a SGR se deu pela figura de Nardes, que,
à época, era parlamentar.
“A aproximação entre empresa devedora do Fisco e SGR deu-se pela figura do então Deputado Federal Augusto Nardes, que avalizou a contratação da associação criminosa para o Diretor Jurídico do grupo RBS, hoje Deputado Federal, Afonso Motta”, apontam os procuradores.
“Durante esse período, o Grupo RBS, liderado por Afonso Motta, financiou uma rede organizada, formada pelos denunciados, que se interligaram de modo coordenado com vistas a proporcionar a divisão especializada de tarefas, para o objetivo final de desconstituir o crédito tributário lançado em face da autuada e, por conseguinte, ratear os proveitos econômicos obtidos ilicitamente”, também diz trecho da denúncia.
“A aproximação entre empresa devedora do Fisco e SGR deu-se pela figura do então Deputado Federal Augusto Nardes, que avalizou a contratação da associação criminosa para o Diretor Jurídico do grupo RBS, hoje Deputado Federal, Afonso Motta”, apontam os procuradores.
“Durante esse período, o Grupo RBS, liderado por Afonso Motta, financiou uma rede organizada, formada pelos denunciados, que se interligaram de modo coordenado com vistas a proporcionar a divisão especializada de tarefas, para o objetivo final de desconstituir o crédito tributário lançado em face da autuada e, por conseguinte, ratear os proveitos econômicos obtidos ilicitamente”, também diz trecho da denúncia.
O deputado federal Afonso Motta (PDT-RS), ex-diretor
jurídico do grupo RBS, que teria supostamente representado a empresa nas
negociações é outro caso de pessoa com foro é mencionada na peça
jurídica.
O Grupo RBS afirmou em nota via assessoria de
imprensa que “todos os honorários advocatícios relacionados a sua defesa
em processo no Carf iniciado em 2000 e concluído após 11 anos foram
contabilizados e informados às autoridades competentes”. A RBS afirma
que “jamais celebrou qualquer tipo de contrato com a empresa N&P
Planalto Soluções e Negócios, pessoas a ela vinculadas ou com o ministro
do TCU Augusto Nardes”. Observa ainda que “o deputado Afonso Motta
deixou a empresa em 2009”.
A denúncia do MPF já foi apresentada à Justiça
Federal de Brasília. Se for considerado que há indícios mínimos de
crime, o magistrado recebe a acusação, abre uma ação penal e os
denunciados se transformam em réus, iniciando o processo.
Mesmo sem acusar formalmente suspeitos com foro privilegiado, a Procuradoria da República no Distrito Federal fez várias menções ao ministro do TCU, João Augusto Ribeiro Nardes, e ao deputado federal Afonso Motta (PDT-RS).
Mesmo sem acusar formalmente suspeitos com foro privilegiado, a Procuradoria da República no Distrito Federal fez várias menções ao ministro do TCU, João Augusto Ribeiro Nardes, e ao deputado federal Afonso Motta (PDT-RS).
De acordo com os procuradores, “o Grupo RBS, liderado
por Afonso Motta, financiou uma rede organizada, formada pelos
denunciados, que se interligaram de modo coordenado”. O objetivo era
“proporcionar a divisão especializada de tarefas, para o objetivo final
de desconstituir o crédito tributário [derrubar a multa milionária por
não pagamento dos impostos devidos] lançado em face da autuada [a
empresa de comunicação] e, por conseguinte, ratear os proveitos
econômicos obtidos ilicitamente”.
Os procuradores afirmam que o hoje deputado fechou cinco contratos falsos com “diversos” escritórios integrados por conselheiros e ex-conselheiros do Carf, que também seriam destinatários da propina.
Os procuradores afirmam que o hoje deputado fechou cinco contratos falsos com “diversos” escritórios integrados por conselheiros e ex-conselheiros do Carf, que também seriam destinatários da propina.
HISTÓRICO — MULTA DE R$ 582 MILHÕES — A RBS foi multada em R$
582 milhões pela Receita Federal em 2001, mas conseguiu derrubar a multa
dois anos depois no Carf. Entretanto, havia mais disputas e recursos
para que a empresa enfrentasse neste mesmo órgão.
Assim, em 2005, o grupo de mídia contratou também a empresa de
consultoria SGR, do ex-conselheiro do Carf José Ricardo Silva, para
ajudar seus advogados na tentativa de reverter a cobrança. Por sua vez,
no mesmo ano, a SGR contrata a Planalto Soluções, ou N&P
Consultoria, firma da qual Nardes foi sócio até aquele ano — o outro
sócio era seu sobrinho Carlos Nardes.
A aproximação entre empresa devedora do Fisco e SGR deu-se pela figura
do então deputado federal Augusto Nardes [PP-RS], que avalizou a
contratação da associação criminosa para o diretor jurídico do grupo
RBS, hoje deputado federal Afonso Motta.
“Uma vez que Afonso Motta sabia que a fraude tributária praticada pela
RBS não resistiria a uma análise isenta da Câmara revisora do Conselho
de Contribuintes, recorreu aos préstimos de Augusto Nardes e seu
sobrinho, Carlos Juliano Ribeiro Nardes, que indicaram a SGR como o
caminho seguro para a consecução de seus propósitos escusos”.
A RBS vence e perde vários recursos no Carf até terminar vencedora da
disputa em 2011. Não precisaria mais pagar os impostos e nem a multa por
suposta sonegação. Aí começam os pagamentos às consultorias, segundo os
investigadores.
O grupo de comunicação pagou R$ 11,9 milhões à SGR em quatro parcelas
entre 2011 e 2012, mostra laudo da Polícia Federal. No mesmo período, a
SGR repassou R$ 2,5 milhões à N&P Consultoria, que pertenceu a
Nardes e continuava nas mãos de seu sobrinho, Carlos Juliano. No
entanto, um email mostra que pagamentos desta época ainda eram
destinados ao ministro, aponta a Procuradoria.
USO DE DINHEIRO VIVO PARA DIFICULTAR RASTREAMENTO — De acordo
com o Ministério Público, a SGR recebia as quantias da RBS em sua conta
bancária. Depois, sacava-as e as dividia entre conselheiros do Carf e
outros participantes do esquema. Usava dinheiro vivo, para dificultar o
rastreamento do crime. Era lavagem de capitais: “(feito) com o escopo de
dissimular a origem ilícita dos proveitos pecuniários, numa típica
operação de branqueamento de capitais”.
Os procuradores afirmam que uma “vultosa parte” foi ocultada e não foi
possível fazer o rastreamento completo dos pagamentos de propina.
Segundo o MPF, os investigados usavam mensagens cifradas para ocultar os
interlocutores. Nardes era tratado como “Tio”, e seu sobrinho Carlos
Juliano, “Ju”.
As investigações levadas a termo conduzem ao raciocínio (...) de que as
pessoas encobertas pelos codinomes “Tio” e “Ju” correspondem a João
Augusto Ribeiro Nardes (Tio) e Carlos Juliano Ribeiro Nardes (Ju), seu
sobrinho.
DENÚNCIA DO MPF — Em fevereiro de 2012, quando Nardes não era
mais sócio da N&P, uma funcionária do escritório de José Ricardo
envia um email para ele informando o controle de pagamentos para o
“Tio”. Nardes deveria receber R$ 1,6 milhão; “Ju”, R$ 906 mil.
O email destaca em amarelo que R$ 500 mil haviam sido “retirados” em 12 e
16 de janeiro de 2012, sendo R$ 400 mil destinados a Nardes. “As provas
evidenciam que na reunião realizada em 16 de janeiro, supramencionada,
houve pagamento de R$ 500 mil reais, conforme destacado em fundo amarelo
no email acima”, conclui a Procuradoria.
“VALORES CONDIZEM COM DESCONTOS DOS CHEQUES” — Ainda para
comprovar os pagamentos, os investigadores passam a relacionar as datas
da movimentação bancária da SGR com descontos de cheques em espécie, uma
planilha de pagamentos interna da empresa e o email com o controle de
pagamentos ao ministro e a seu sobrinho. “Os valores descritos nos
emails, em sua maioria, condizem com os descontos de cheques registrados
na conta corrente da SGR Consultoria”, concluem os procuradores na
denúncia.
E é, “nesse contexto de diversos saques nas contas das SGR Consultoria e
posteriores pagamentos destinados a integrantes da N&P
Consultoria”, que o Ministério Público destaca: “João Augusto Nardes
também estabeleceu conexão com José Ricardo”. Há registros de email que
mostram que o ministro do TCU efetuou ligações telefônicas para a SGR
Consultoria, em 26 e 28 de março de 2012.
Nota do Grupo RBS sobre a nova denúncia do MPF decorrente da Operação Zelotes:
“A RBS jamais celebrou qualquer tipo de contrato nem manteve qualquer vínculo profissional de espécie alguma com a empresa N&P Planalto Soluções e Negócios, pessoas a ela vinculadas ou com o ministro do TCU Augusto Nardes. Observa ainda que o deputado Afonso Motta deixou a empresa em 2009 para concorrer a uma carreira política. Em respeito ao público e seus colaboradores, a RBS afirma que mantém todos os impostos em dia e que agiu e age com absoluta lisura em todos os seus procedimentos tributários. Além disso, a RBS reitera sua permanente disposição para colaborar na elucidação de qualquer questionamento pelas autoridades legais.”