MEMÓRIAS SELETIVAS: José Dirceu lança livro de memórias
Condenado e preso por comandar ou se beneficiar da roubalheira do
mensalão e do petrolão, o ex-ministro José Dirceu, que foi braço direito
do ex-presidente Lula, diz que culpa não é dos ladrões e sim de quem os
denunciou, investigou e condenou. No epílogo do seu livro
autobiográfico “Zé Dirceu Memórias - Volume 1” ele responsabiliza tudo o
que não é petista pela crise brasileira: Polícia Federal, Ministério
Público, Justiça e Mídia. E vê o PT como “vítima”.
Em seu livro, Dirceu acusa o atual governo de comprar parlamentares,
“seus votos e presença, tudo à luz do dia, com o beneplácito da mídia”.
Dirceu atribuiu o impeachment de Dilma a “aparelho policial-judicial, instrumento e cúmplice do golpe”.
No livro, Dirceu chama o aliado PSB de “sublegenda tucana” e ataca Psol e
PSTU. Mas trata o PT quase como um amontoado de santos.
Esse livro de memórias de José Dirceu mostra como as ambições do petista
não cabiam em Brasília. No fim de 2003, ele resolveu articular uma
parceria militar entre os países da América do Sul para se contraporem
aos EUA. No dia seguinte, foi desautorizado por Lula: “Não sabia que
tinha lhe nomeado ministro da Defesa e das Relações Exteriores”.
Durante o lançamento do primeiro volume de suas memórias (Zé Dirceu
Memórias - Volume 1) em Brasília, José Dirceu defendeu a revisão da Lei
da Ficha Limpa, afirmando que apenas o eleitor deveria ter o poder de
decidir em quem votar e classificou o impedimento judicial de Lula
disputar as eleições como uma “infâmia”.
“A eleição apenas começou, temos ainda um deserto para atravessar. Eu acredito que Lula vence a eleição no primeiro turno, ele tem grandes chances, e no segundo turno todas as pesquisas indicam que venceria. Por isso que o impedimento dele se torna uma ignomínia e uma infâmia. Num momento vamos ter que reavaliar essa questão da Ficha Limpa no Brasil. Cabe ao eleitor decidir se um cidadão deve ou não ser eleito, não pode caber à Justiça", afirmou Dirceu.
O livro “Zé Dirceu Memórias - Volume 1” foi escrito pelo ex-ministro
durante o tempo em que esteve preso, condenado em processo da Lava Jato.
No lançamento do livro em Brasília, Dirceu voltou a reafirmar sua inocência: “Eu fui condenado pelo que eu não fiz”.
Com 554 páginas, o livro traz o relato de Dirceu de sua trajetória
política, do tempo de militância estudantil e resistência à ditadura
militar de 1964 até os governos do PT. O ex-ministro pretende lançar um
segundo volume de memórias.
Quem quiser saber o que foi o PT no poder deve esperar o próximo volume
As memórias de José Dirceu que estão chegando às livrarias pararam em
2006, depois de sua saída da Casa Civil de Lula e da cassação do seu
mandato. É um depoimento banal, mais preocupado com a discussão das
facções petistas do que com o governo que pretendeu comandar.
Aos 72 anos, cumpriu a promessa de que só falaria do seu tempo de
militante da ALN e do Molipo quando completasse 80 anos. Poderia ter
detalhado seu momento de esplendor, como chefe da Casa Civil de Lula
entre 2003 e 2005. Sua memória ficou burocrática, cansativa.
Dirceu anunciou que publicará o próximo volume no ano que vem. Tomara
que elabore uma curta frase deixada quase a esmo: “Lula e o petismo são a
mesma coisa e não o mesmo destino”.
Dirceu fala em nome do petismo que ajudou a levar Lula ao poder. Aqui e
ali o ex-ministro conta ursadas de seu chefe, mas quando ele se juntou
ao companheiro, sabia que era um urso que comia os donos. Foi comido. Ao
contrário de Antonio Palocci, seu rival no governo e companheiro de
cárcere, não mordeu o urso. Deixou seu silêncio no ar.
O comissário arrependeu-se de poucas coisas, sempre pontuais. Às
vésperas da eleição de outubro, um trecho de seu livro enuncia uma
questão que é capaz de assombrar quem gostaria de votar em Lula ou no
seu poste:
“Aqueles que no nosso campo aceitam discutir a partir da cruzada
anticorrupção, mas exigem Lula como alternativa para o PT e a esquerda
em 2018, são hipócritas e se rebaixam, ao usar as armas do inimigo para
um ajuste de contas interno ‘histórico’ contra os que conciliaram com a
burguesia e sua ideologia”.
É uma formulação confusa. Pode-se dizer que há uma cruzada, mas não se pode negar a corrupção.
Dirceu açoita seus adversários dentro do partido, mas, na essência,
segue a linha geral de denunciar as denúncias. Ao tempo do escândalo do
mensalão, o comissário sonhava com o povo na rua defendendo-o e ao
governo. Agora explica as manifestações contra Dilma e sua deposição
como consequência da desmobilização da militância, entregando as
avenidas ao conservadorismo.
Dirceu e Lula acreditavam que as ruas seriam tomadas pelos seus
defensores. Enganaram-se. O urso percebeu o engano e hoje, blindado pela
cadeia, espera uma vitória eleitoral, atropelando o que seria a
“cruzada anticorrupção”.
O militante sonhador dos anos 1960, organizador do PT e capitão do time
no primeiro governo de Lula continua capturado pela brilhante conclusão
de sua biografia, escrita pelo repórter Otávio Cabral: “José Dirceu de
Oliveira e Silva jamais chegou a lugar nenhum”.
Percebe-se isso quando ele se refere com malícia e crueldade a Fernando
Gabeira, um dos sequestradores do embaixador americano em 1969. Graças a
essa aventura Dirceu foi libertado e viveu em Cuba. Gabeira deixou o
PT, condenando o poder imperial de Dirceu e dele mereceu um
semiepitáfio:
“Acabou sua carreira política de forma apagada, fugindo de supostas
irregularidades praticadas em seu mandato. Anos mais tarde,
engajar-se-ia entusiasticamente nas conspirações golpistas.”
Gabeira deixou a política, voltou ao jornalismo e rala com sucesso
percorrendo o Brasil para mostrar a vida de seu povo. Dirceu foi
condenado a 11 anos de prisão e está em liberdade por decisão judicial.
No século passado o livro “O que é isso, companheiro”, com as memórias
lúdicas de Gabeira foram a apologia de um sonho. José Dirceu trouxe as
memórias do pesadelo.
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