ENTREVISTA — Guilherme Boulos, candidato a presidente da República pelo PSOL
Boulos critica o PT e preserva Lula — evita julgar ética de Lula
“É lamentável que se insista em retomar alianças que o Brasil todo já viu onde deu.”
“Propriedade ociosa, sem função social, será desapropriada para a reforma agrária no país.”
“Nosso governo não vai dar a primeira arma para o jovem. Vai dar o primeiro emprego, para que ele não tenha a primeira arma.”
Guilherme Boulos, candidato a presidente pelo PSOL |
Pela segunda vez em Alagoas em cerca de três meses, o candidato a
presidente da República pelo PSOL, Guilherme Boulos, defendeu na
sexta-feira (24.ago.2018) o fim dos privilégios do Judiciário e dos
super-ricos do Brasil; condenou a aliança entre o PT de Lula e o MDB do
presidente Michel Temer. Mas reservou para Lula o privilégio de não ser
atingido pela Lei da Ficha Limpa e poder participar das eleições, mesmo
tendo sido condenado como corrupto e lavador de dinheiro, na segunda
instância do Judiciário.
Em uma entrevista, durante sua agenda de campanha em Maceió (AL),
Guilherme Boulos expôs suas propostas, mas também lamentou a aliança do
PT com o senador e candidato à reeleição Renan Calheiros (MDB), em
Alagoas. “Eu não estaria no mesmo palanque que Renan Calheiros”, disse o
candidato do PSOL.
Mas evitou ampliar seu julgamento ético e a defesa do fim dos
privilégios, ao ser questionado sobre a postura do aliado de Renan,
Lula, na relação do ex-presidente petista com empreiteiras que o levaram
a ser denunciado e condenado por corrupção. “Eu não sou juiz da moral
alheia. Nem fiscal de ética de ninguém”, respondeu.
Leia a entrevista completa:
Esta é a segunda vez que o senhor vem a Alagoas,
desde a sua pré-campanha. Porque o Estado se tornou importante para sua
campanha?
Olha, Alagoas é uma expressão das desigualdades do Brasil. Aqui temos
o índice desemprego crescente, um dos maiores do país. Os índices de
violência altíssimos, Alagoas está no quarto lugar mapa de homicídio, no
atlas da violência no país. E a nossa candidatura é uma candidatura que
tem lado, que representa aqueles que sofrem com a desigualdade no
Brasil. E que apresenta soluções para a questão do emprego, da segurança
pública, que não são as mesmas de sempre, que hoje penalizam os mais
pobres. Há 14 milhões de desempregados no Brasil e o governo aplicando
uma política recessiva. Só tá ganhando banqueiro. São 17 bilhões de
lucro dos bancos no último trimestre. Vamos criar o programa Levanta
Brasil, que vai gerar 6 milhões de empregos nos próximos dois anos. Se
você pegar o tema da segurança pública, a solução que eles têm
apresentado é mais tiro, porrada e bomba, mais repressão. Vamos
implementar o programa 123 Vive, baseado em prevenção e inteligência.
Por todas essas razões, tenho vindo para Alagoas e para o Nordeste
brasileiro prioritariamente, porque é uma região que expressa as
desigualdades do país.
A revista Time afirma que a liderança de Bolsonaro é
resultado do “desespero” do eleitor brasileiro com a falta de opções de
voto, resultado do “atoleiro” da classe política alcançada pela Operação
Lava Jato. O eleitor tem razão para se desesperar?
Eu acho que desespero não é a palavra correta. É desilusão. Eu tenho andado pelo país. Passei por 22 estados nos últimos quatro meses. E o que eu tenho visto é as pessoas descrentes deste sistema político, dessa forma de fazer política. E nisso as pessoas têm razão. Esse sistema político é o do toma lá, dá cá; é o do balcão de negócios; é o da politicagem. É o que permite um partido igual ao PMDB, que nunca ganhou uma eleição presidencial e está em todos os governos. É o de troca de cargo em ministério por voto no Congresso, é o de troca de financiamento de campanha eleitoral por benefícios para grandes empresas. As pessoas olham isso e tem um abismo, mesmo, entre Brasília e o Brasil. Entre o que se faz em Brasília e o que se vive no Brasil de verdade. Então, essa desilusão com o sistema político tem toda razão de ser.
A indignação com o sistema político tem toda razão de ser. A nossa candidatura é resultado dessa indignação. Eu também estou indignado, como a maioria do povo brasileiro, com a forma como se faz política no Brasil. Essa aliança entre o PSOL, o PCB e os movimentos sociais expressa essa indignação. E, por isso, a gente apresenta um novo jeito de fazer, que é governar junto com as pessoas. É fazer plebiscitos, referendos, chamar o povo para o centro da decisão, para as pessoas decidirem as grandes questões nacionais. O Brasil é muito maior do que a Praça dos Três Poderes. Nossa primeira medida será apresentar um plebiscito para que o povo possa decidir se quer manter ou revogar os atos tomados pelo governo do Temer, reforma trabalhista, congelamento de investimentos em saúde e educação. O povo no centro da decisão vai permitir à gente, pela primeira vez em 30 anos, botar o PMDB na oposição.
Eu acho que desespero não é a palavra correta. É desilusão. Eu tenho andado pelo país. Passei por 22 estados nos últimos quatro meses. E o que eu tenho visto é as pessoas descrentes deste sistema político, dessa forma de fazer política. E nisso as pessoas têm razão. Esse sistema político é o do toma lá, dá cá; é o do balcão de negócios; é o da politicagem. É o que permite um partido igual ao PMDB, que nunca ganhou uma eleição presidencial e está em todos os governos. É o de troca de cargo em ministério por voto no Congresso, é o de troca de financiamento de campanha eleitoral por benefícios para grandes empresas. As pessoas olham isso e tem um abismo, mesmo, entre Brasília e o Brasil. Entre o que se faz em Brasília e o que se vive no Brasil de verdade. Então, essa desilusão com o sistema político tem toda razão de ser.
A indignação com o sistema político tem toda razão de ser. A nossa candidatura é resultado dessa indignação. Eu também estou indignado, como a maioria do povo brasileiro, com a forma como se faz política no Brasil. Essa aliança entre o PSOL, o PCB e os movimentos sociais expressa essa indignação. E, por isso, a gente apresenta um novo jeito de fazer, que é governar junto com as pessoas. É fazer plebiscitos, referendos, chamar o povo para o centro da decisão, para as pessoas decidirem as grandes questões nacionais. O Brasil é muito maior do que a Praça dos Três Poderes. Nossa primeira medida será apresentar um plebiscito para que o povo possa decidir se quer manter ou revogar os atos tomados pelo governo do Temer, reforma trabalhista, congelamento de investimentos em saúde e educação. O povo no centro da decisão vai permitir à gente, pela primeira vez em 30 anos, botar o PMDB na oposição.
Investimentos sociais são possíveis de serem retomados no mesmo patamar do governo Lula, em quanto tempo, diante da atual crise?
É possível retomar investimento público no Brasil de imediato. O programa levanta Brasil prevê isso. Nós vamos investir, já em 2019, R$ 180 bilhões em infraestrutura social. O que quer dizer isso? Não vamos priorizar a construção de pontes, viadutos. Vamos priorizar a construção de creche, de escola, hospital, de moradia popular e obra de saneamento básico. Com isso, vamos atender duas necessidades do povo de uma só vez. Vai gerar emprego e renda, emprego formal, com carteira assinada. E, ao mesmo tempo, você vai dar dignidade para as pessoas. Porque vai permitir acesso a direitos, a serviços públicos de qualidade. Quando você constrói um hospital, você gera emprego para quem constrói, gera emprego para quem vai trabalhar e ao mesmo tempo melhora o atendimento à saúde de uma região inteira. Esse é o caminho. O Levanta Brasil vai permitir isso. E tem dinheiro. Esses que dizem que não dá para fazer é porque pensam na lógica dos velhos privilégios. A gente tem coragem para enfrentar esses privilégios.
Vamos fazer uma reforma tributária para que super-ricos comecem a pagar imposto no Brasil. Vamos começar a taxar grandes fortunas, tributar lucros e dividendos, taxar grandes heranças. Com essas medidas, teremos condições de arrecadar entre R$ 100 bilhões e R$ 120 bilhões ao ano. Vamos enfrentar o bolsa empresário, que é a farra das desonerações fiscais, grandes empresas que não pagam impostos porque conseguiram lobby lá no Congresso Nacional com parlamentares que tiveram suas campanhas financiadas por elas. Vamos enfrentar o bolsa banqueiro, que é a rolagem absurda dos juros da dívida pública a uma taxa fora dos padrões nacionais. Tudo isso vai dar uma margem de manobra importante. Mexer em privilégio para fazer um programa de investimentos.
É possível retomar investimento público no Brasil de imediato. O programa levanta Brasil prevê isso. Nós vamos investir, já em 2019, R$ 180 bilhões em infraestrutura social. O que quer dizer isso? Não vamos priorizar a construção de pontes, viadutos. Vamos priorizar a construção de creche, de escola, hospital, de moradia popular e obra de saneamento básico. Com isso, vamos atender duas necessidades do povo de uma só vez. Vai gerar emprego e renda, emprego formal, com carteira assinada. E, ao mesmo tempo, você vai dar dignidade para as pessoas. Porque vai permitir acesso a direitos, a serviços públicos de qualidade. Quando você constrói um hospital, você gera emprego para quem constrói, gera emprego para quem vai trabalhar e ao mesmo tempo melhora o atendimento à saúde de uma região inteira. Esse é o caminho. O Levanta Brasil vai permitir isso. E tem dinheiro. Esses que dizem que não dá para fazer é porque pensam na lógica dos velhos privilégios. A gente tem coragem para enfrentar esses privilégios.
Vamos fazer uma reforma tributária para que super-ricos comecem a pagar imposto no Brasil. Vamos começar a taxar grandes fortunas, tributar lucros e dividendos, taxar grandes heranças. Com essas medidas, teremos condições de arrecadar entre R$ 100 bilhões e R$ 120 bilhões ao ano. Vamos enfrentar o bolsa empresário, que é a farra das desonerações fiscais, grandes empresas que não pagam impostos porque conseguiram lobby lá no Congresso Nacional com parlamentares que tiveram suas campanhas financiadas por elas. Vamos enfrentar o bolsa banqueiro, que é a rolagem absurda dos juros da dívida pública a uma taxa fora dos padrões nacionais. Tudo isso vai dar uma margem de manobra importante. Mexer em privilégio para fazer um programa de investimentos.
Ainda com relação a programas sociais, o senhor
aponta erros ou sugere melhoria em programas de distribuição de renda
como o Bolsa Família? Pretende mantê-lo ou melhorá-lo em seu governo? De
que forma?
Vamos manter o Bolsa Família, ampliar o Bolsa Família e dobrar o
valor do Bolsa Família. O Bolsa Família hoje custa R$ 30 bilhões ao
Estado Brasileiro e atende 12 milhões de de famílias. O bolsa empresário
custa R$ 283 bilhões ao Estado Brasileiro e não tem tido contrapartida
em emprego. Está muito claro onde é que o investimento mais vale a pena.
Não é em desonerações para grandes empresas. É sim nos programas
sociais. Porque o Bolsa Família, além de fazer a diferença entre uma
família comer ou não comer, o que não é pouca coisa, também injeta
recurso na própria economia e ajuda a gerar emprego. Quando as pessoas
compram mais, você aquece cadeias econômicas. Então, nós vamos ampliar o
Bolsa Família e, para fazer isso, vamos mexer no bolsa empresário e no
bolsa banqueiro.
As contrapartidas do Bolsa Família ficam fora de foco
da fiscalização necessária, por exemplo, na frequência escolar e
vacinação?
As contrapartidas devem ser algo real. Não podem ser burocracias para
criar condições de exclusão de famílias como o Temer tem feito agora. O
Temer excluiu milhares de famílias do Bolsa Família, do benefício de
prestação continuada, com o pretexto de uma fiscalização de critérios. A
vacinação tem que ser um critério? Bem. Agora, tem que se dar condições
para a vacinação. Tem que se orientar as famílias em relação a isso.
Não pode ser pegadinha para poder cortar o Bolsa Família. Estamos muito
mais preocupados em garantir a sobrevivência das famílias, do que
dificultar o acesso ao programa social.
Voltando a Alagoas, qual a sua perspectiva do
resultado desta eleição para o PSOL em Alagoas, que tem Basile
Christopoulos disputando contra Collor e Renan Filho e mais dois
candidatos?
Basile é o único candidato que não representa as oligarquias.
Lamentavelmente, alguns setores, o próprio Partido dos Trabalhadores, se
aliou aqui ao Renan Filho; se aliou ao PMDB do Temer. Estamos juntos
com o Basile nessa caminhada aqui em Alagoas, porque o Basile representa
este nosso projeto de mudança para o Brasil. É a única candidatura de
esquerda aqui em Alagoas. E pretendemos eleger também parlamentares.
Está aqui comigo o Gustavo Pessoa, que é candidato a deputado estadual,
representando uma chapa comprometida com a mudança.
Lula lidera pesquisas em Alagoas e a aliança do PT
com os Calheiros foi mantida, depois de o senador Renan ser alvo de
repúdio do partido, por votar pelo impeachment de Dilma, dois anos
depois de fazer campanha junto com Michel Temer, em Maceió, pela
reeleição da ex-presidente. Como o senhor analisa esta postura do PT, do
senador Renan e do pragmatismo que permeia a política como um todo?
Olha, a gente não faz aliança fisiológica. A gente faz aliança em
torno de princípios. Eu não estaria no mesmo palanque que Renan
Calheiros. Eu não estaria no mesmo palanque que Eunício Oliveira. Eu não
estaria no mesmo palanque de quem ajudou a botar o Temer lá e apoiou
várias das medidas do Temer contra o povo brasileiro. No nosso ponto de
vista, é lamentável que não se aprenda com as lições do golpe e que se
insista em retomar alianças que o Brasil todo já viu onde deu.
O senhor é solidário a Lula, que foi condenado por
corrupção e lavagem de dinheiro. Não considera que Lula ao menos
pisoteou a ética defendida pelo PT na sua relação, considerada criminosa
pelo Judiciário, com empreiteiras que mantinham contratos com o
governo?
Veja. Para se condenar e prender alguém, no Estado de Direito,
precisa ter prova. Não basta ter convicção. É preciso ter prova. Não
apareceu uma única prova material contra o Lula. Foram apenas delações,
fuxicos. Não apareceu uma única prova. Ao contrário, em relação ao
Temer, tem prova dele no porão do Palácio gravado, comprando o silêncio
do Eduardo Cunha; do braço direito dele carregando mala de dinheiro na
calçada. E ele tá governando o Brasil. Em relação a Aécio, tem prova,
dele cobrando R$ 2 milhões ao Joesley Batista, dizendo até que ia matar o
primo, para que não delatasse. E ele tá fazendo lei no Senado Federal e
é candidato a deputado. Dois pesos e duas medidas. A nossa defesa em
relação ao Lula é uma defesa da democracia. Quando o Judiciário escolhe
quem condenar, quem poupar, e se partidariza, a democracia está em sério
risco. O Lula tem o direito de ser candidato e nós defendemos a
liberdade do Lula, porque foi uma condenação política e sem provas.
O senhor vê ética nessa relação do Lula com as empreiteiras? Ele foi ético?
Olha, o nosso posicionamento … Vou dizer aqui da minha campanha, do
PSOL, dessa aliança que construímos. A gente não aceita um real de
empreiteira. A gente não aceita um real de banqueiro, nem de grande
empresário. Achamos que essa forma de fazer política com financiamento
privado de campanha compromete os projetos. Eu não sou juiz da moral
alheia. Nem fiscal de ética de ninguém. Agora, nosso caminho é esse. O
caminho que a gente trilha, o caminho de coerência que o PSOL sempre
teve, da sua bancada no Congresso Nacional. E o caminho dos movimentos
sociais que constroem essa aliança é o caminho de autonomia política.
O senhor é contra privilégios na sociedade brasileira
e já demonstrou isso em várias declarações. Mas defender a candidatura
de Lula não é garantir o privilégio para o petista descumprir a Lei da
Ficha Limpa, tendo ele sido condenado pelo poder judiciário e processado
por instituições com liberdade de atuação garantidas pela Constituição?
Veja. Repito aqui. Não se pode, segundo a Constituição e a lei, se
condenar ninguém sem provas. Se há uma condenação sem provas, é
plenamente possível e necessário que toda sociedade brasileira se
coloque em relação a isso. É um direito nosso. O Judiciário não é Deus.
Juiz não tá acima da lei. Aliás, falando em privilégios, privilégio é
quem se coloca como arauto da moralidade como quem julga a corrupção
receber auxílio-moradia, tendo casa. Privilégio é um juiz que é pego
vendendo sentença ter como punição aposentadoria com salário integral.
Vamos enfrentar os privilégios do Judiciário. A gente é contra qualquer
tipo de privilégio. E não admite nenhum tipo de privilégio. Agora, o
Judiciário julgar de maneira partidarizada é algo que precisa ser
condenado em qualquer democracia. E está sendo amplamente condenado,
aliás, em termos internacionais. A ONU se posicionou. Um conselho da ONU
se posicionou; prêmio Nobel da Paz Adolfo Esquivel se posicionou e
nenhum de nós está defendendo privilégios. Ao contrário.
O Canal do Sertão de Alagoas é promessa antiga de
mitigar a seca no Estado. A obra vive atolada em denúncias de corrupção,
enquanto a transposição passa por uma sequência de falhas, em outros
estados. Como solucionar a relação do nordestino com a estiagem?
Temos que construir uma política de convivência com a seca. Estive
conversando com o pessoal da articulação do Semiárido, que pensa isso há
muito tempo, que convive com essa realidade junto com as pessoas que
mais sofrem com ela. As políticas que defendemos, primeiro, é uma
retomada ousada e com muita força do programa de cisternas, que foi
paralisado pelo governo de Michel Temer. Quando a água não chega, isso
abre espaço para a velha indústria da seca, para os coronéis locais que
trocam voto por água, por caminhão pipa. Para vencer essa realidade de
uma vez por todas, vamos precisar fazer uma distribuição integral de
cisternas e que ela chegue a todas as famílias do Semiárido. Fora isso, o
debate de transposição do São Francisco, ou de obras hídricas, tem que
ser redefinido para atender a população que mais precisa, e não para a
irrigação do agronegócio. A nossa prioridade em relação a obras no
Semiárido é levar água para todas as famílias. E, ao mesmo tempo
permitir a agricultura familiar, tanto de subsistência como de
comercialização dessas famílias. O agronegócio não é a nossa prioridade.
Falando nessa questão rural, as invasões de
propriedades privadas continuarão sendo incentivadas como estratégia
para garantir a reforma agrária, em seu eventual governo?
As ocupações de imóveis, de latifúndios improdutivos, que estão em
situação ilegal, de acordo com a Constituição Brasileira, que prevê o
cumprimento da função social da terra. E a terra que não a cumpre está
ilegal. Ela é resultado de um problema social dramático, de no Brasil
ter tanta gente sem terra e tanta terra sem gente. E é resultado do
sistemático descumprimento da lei, no sentido de favorecer os grandes
proprietários que não pagam ITR, que conseguem todo tipo de refis lá no
Congresso Nacional e que ficam com propriedades sem função social, sem
que sejam desapropriados. No nosso governo, vamos fazer essa lei ser
cumprida. Propriedade ociosa, sem função social, será desapropriada para
a reforma agrária no país. Vamos fazer um programa amplo para garantir
que quem quer trabalhar no campo tenha oportunidade de fazer isso. O
Brasil é um país continental com uma diversidade incrível e potencial
agrícola incrível. E isso não pode ficar apenas nas mãos de 1% dos
proprietários que têm mais de 40% das terras.
Dentro dessa sistemática de ocupação da terra, às
vezes se sobressaem alguns equívocos e situações que vão de encontro ao
propósito da reforma agrária. Por exemplo, uma reportagem a cerca de
oito anos aqui em Alagoas mostrou que um repórter com seu fotógrafo
foram a uma propriedade em Murici e compraram um lote de terra da
reforma agrária (sete hectares a R$ 25 mil, na região onde vereadores e
até promotor foi acusado de comprar lotes) que tinha sido cedido a um
dono de posto de combustíveis do município. Essas situações inibem um
pouco esse modelo de reforma agrária instalado nos últimos anos aqui no
Brasil?
Você precisa saber separar o joio do trigo. Você pegar um caso que
houve erro, oportunismo ou malandragem, não te autoriza a dizer que
todos os casos de distribuição de terra e reforma agrária no Brasil
estão equivocados. Você não pode julgar a todos pela régua de um
oportunista. Oportunista tem em todo canto, tem no jornalismo, no poder
econômico, em Brasília. Aliás, não tenho a menor dúvida que tem mais
oportunista por metro quadrado no Congresso Nacional do que em
assentamentos de reforma agrária. Agora, cada caso tem que ser julgado e
as pessoas responsabilizadas. A terra é um direito e a reforma agrária é
uma política pública que tem que ser desenvolvida e no nosso governo
será. Vejo uma atenção muito grande dos setores da imprensa para pegar
casos como esse e uma atenção quase zero de pegar o aumento da violência
no campo, contra quem luta pela reforma agrária. Relatório da Comissão
Pastoral da Terra mostra que 2017 foi o ano em que mais pessoas foram
assassinadas no campo, na luta pela terra e pelo meio ambiente. É um
número recorde, desde 2001. Chacinas, massacres, jagunços, policiais
matando gente, massacrando, queimando as casas … Isso deveria merecer
uma atenção maior da imprensa brasileira.
A direita, principalmente ligada ao candidato
Bolsonaro, defende o armamento civil e o “atirar para depois perguntar”
em caso de invasões da propriedade privada. Como o senhor analisa esse
tipo de proposta difundida e que está se tornando tão popular no Brasil?
Nem tão popular. Uma pesquisa Datafolha da semana passada mostra que
mais de 60% da população brasileira rejeita o armamento. Agora, nossa
política, naturalmente, é pelo desarmamento da população. Não se resolve
violência com mais violência. Esse não é o caminho. Existe um problema
grave de violência urbana no Brasil. Existe um problema crônico de
segurança pública e aqui em Alagoas é uma expressão disso: o quarto
estado com maior índice de mortes violentas no País. Agora, não vai se
resolver isso com tiro, porrada e bomba, com a mesma política dos
últimos 30 anos, que foi investir só em repressão, armamento e
construção de presídio. Há 30 anos está se fazendo isso. Melhorou?
Alguém tá mais seguro? Evidente que não.
O caminho é investimento em prevenção e inteligência. Por isso
vamos fazer o programa 123 Vive, que vai focar nas 123 cidades que hoje
representam mais da metade dos homicídios no Brasil. Várias delas estão
aqui no Estado de Alagoas. Vamos fazer um investimento pesado na área
social para prevenção. Nosso governo vai construir escola, para não ter
que construir presídio. Nosso governo não vai dar a primeira arma para o
jovem. Vai dar o primeiro emprego, para que ele não tenha a primeira
arma. E vamos investir em inteligência, para combater o crime organizado
de verdade. O crime organizado não está no barraco de nenhuma favela;
está muito mais perto de Brasília ou do poder econômico, do que de
qualquer comunidade do Brasil. Tem que ter coragem para enfrentar esse
crime organizado, e nós temos. Não pode ter rabo preso, e nós não temos.
E isso vai permitir com que a gente faça esse enfrentamento ao tráfico
de armas e munições, por exemplo, que é um dos grandes responsáveis
pelas mortes violentas no Brasil. É um negócio bilionário. Vamos pegar
aí mexer no atacado, não no varejo. Porque a política de mais violência e
mais militarização só está servindo para matar a juventude negra nas
periferias. Vamos mudar o modelo de segurança pública no Brasil, com um
modelo desmilitarizado, como é na maior parte dos países do mundo. E
vamos fazer com que a arma não chegue onde ela está chegando hoje. Nas
mãos indevidas. A ideia não é armar mais a população. É retirar a arma
de quem hoje está armado.
Sobre saúde, a gente vê uma mudança na gestão com a
utilização de OSs (Organizações Sociais). Aqui temos exemplos de
melhorias de alguns serviços, a exemplo das UPAs administradas por OSs.
Quero saber do senhor sobre a contradição de repassar para a iniciativa
privada essa gestão da saúde, sem diminuir a qualidade do atendimento,
como é a maioria das unidades ainda conduzidas pelo serviço público.
Eu conheço muitos hospitais geridos por OS. Meus pais são médicos do
SUS há uns 40 anos. E desde muito cedo conheço hospitais do SUS. E a
experiência de OS foi gestada em São Paulo, no governo do PSDB. Para mim
é uma novidade você vir me dizer que aqui tem hospital de OS que atende
com excelência e qualidade. Porque isso não acontece em nenhum lugar do
País.
Na UPA. É um contraste com as demais unidades.
Então vamos visitar e ver esse case de sucesso. Porque está na
contramão do que acontece em todo o país. Em todo o país, tem servido
para repassar dinheiro público para a iniciativa privada e para ser
cabide de contratação de prefeito e vereador. Porque, como não precisa
de concurso público, o prefeito contrata OS e estabelece como
contrapartida botar a turma dele para trabalhar lá. Assim tem acontecido
no Brasil inteiro. O caminho não é privatizar e nem terceirizar para
OS. O caminho é a gestão direta do SUS. O problema do SUS, hoje, de ter
excesso de fila, falta de medicamento e de médico não é o modelo
público. O problema é que o dinheiro não tá chegando na ponta onde tem
que chegar. O problema é de financiamento, não é de gestão e modelo. Por
isso, vamos dobrar o investimento no SUS em quatro anos. E dobrando
esse investimento no SUS, vai nos permitir viabilizar o programa UBS
completa. Hoje, quando você chega numa unidade de saúde, vão te dar uma
dipirona e uma guia de encaminhamento para você fazer um exame dali a
cinco meses. Na UBS completa você vai fazer o exame ali, na hora, e vai
sair com o medicamento na mão. E se for algo de especialidade ou alta
complexidade, vai ter um prazo de no máximo um mês de espera para ter o
exame, o procedimento e todo o encaminhamento. Esse programa dá para
fazer, desde que tenha investimento de verdade.
Concurso público também, né?
Claro, com gestores públicos, na medida em que vai ser parte do
serviço público de saúde do SUS. Agora, esse investimento implica
revogar a emenda constitucional 95, do teto de gastos, o que nós vamos
fazer. Implica em mexer em privilégio, fazer com que super-rico comece a
pagar imposto. Implica em cortar auxílio moradia de juiz que tem casa;
em revogar, vetar o aumento do Judiciário, um aumento abusivo. Juiz que
tava ganhando R$ 33 mil achou pouco e aumento seu próprio salário para
R$ 40 mil reais (R$ 39,3 mil). Isso é uma esculhambação.
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