O controle democrático das Forças Armadas
Membros das Forças Armadas em operação na favela da Rocinha, no Rio |
O Senado federal discute o Projeto de Lei 44/2016, já aprovado na Câmara
dos Deputados, que retiraria da Justiça comum o julgamento do crime de
homicídio praticado por militar das Forças Armadas contra civil. Esta
proposta atinge diretamente a relação entre os poderes civil e militar
no Brasil.
Essa relação tem se aprimorado desde a redemocratização, não só com a
consolidação de uma cultura militar profissional com estrita observância
da legalidade, mas, também, através de importantes alterações na
legislação.
A criação do Ministério da Defesa encabeçado por um Ministro civil e a
reorganização da Justiça Militar e sua competência, foram medidas
importantes para garantir o regime democrático.
Neste quadro, o homicídio, quando praticado por militar em serviço
contra civil, recebeu especial atenção. Enquanto os demais crimes contra
civis têm seu julgamento cometido ao Juiz Presidente da Auditoria
Militar (magistrado civil que preside o Conselho de Justiça formado por
quatro oficiais); o crime doloso contra a vida foi remetido ao Júri,
órgão da Justiça civil.
A frequente utilização das Forças Armadas no contexto da segurança
pública, através da decretação da Garantia da Lei e da Ordem (GLO),
porém, tem gerado reparos à jurisdição civil, alegando-se a necessidade
de maior “proteção jurídica” aos militares das Forças Armadas.
Tal ideia, todavia, se baseia em um de dois preconceitos: ou o juízo
civil não seria capaz de julgar corretamente a conduta do militar das
Forças Armadas; ou o militar das Forças Armadas não seria capaz de atuar
dentro das regras normalmente estabelecidas para o uso da violência,
mesmo atuando como força policial.
O primeiro não se sustenta porque, atuando na GLO, as Forças Armadas
estão exercendo função de natureza civil (o uso do poder de polícia na
manutenção da ordem interna), sendo que os requisitos para a legítima
defesa são, rigorosamente, os mesmos no Código Penal e no Código Penal
militar.
Já o segundo, além de inadmissível, cria sobre as Forças Armadas uma
injusta suspeição. No longo caminho desde a Carta de 1988, as Forças
Armadas têm demonstrado irretocável respeito ao ordenamento jurídico, e,
sempre que chamadas a atuar na manutenção da ordem interna, têm, em
geral, agido de modo comedido e profissional.
É inegável que seu uso recorrente em funções cometidas às forças
policiais tem sido preocupante; e que provoca compreensível desconforto
aos militares – cuja missão primordial é a defesa contra o inimigo
externo. Porém, não é diminuindo o controle democrático, que legitima a
ação das Forças Armadas em sua relação com a sociedade, que se irá lhe
conceder maior “segurança jurídica”. Ao contrário: a falta de controle é
fator de incentivo às condutas inadequadas, e mesmo criminosas,
conforme a História demonstra.
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