sexta-feira, 29 de junho de 2018



O brasileiro perdeu a devoção pelo voto



A mais nova pesquisa do Ibope informa que 41% dos eleitores estão sem candidato a presidência. Esse bloco divide-se entre os 33% que planejam desperdiçar o voto (brancos ou nulos) e os 8% que não têm ideia do que fazer com ele (não sabem ou não responderam). Os dados revelam que, a apenas quatro meses da eleição, a disputa pela poltrona de presidente da República está aberta.

Os otimistas dirão que não há motivo para pessimismo, pois o grande número de desorientados constitui uma oportunidade fantástica para o surgimento de alguma orientação. Mas a grande verdade é a seguinte: há na praça pelo menos 20 presidenciáveis se oferecendo para assumir “o volante”. Mas nenhum deles oferece “um itinerário” capaz de seduzir o pedaço do eleitorado que não enxerga “um rumo”.

A lógica indica que a lista de presidenciáveis vai murchar — até por uma questão de sobrevivência. A depuração é um imperativo político-monetário. O acesso dos partidos às verbas públicas do Fundo Partidário e à vitrine da propaganda no rádio e na TV é definido pelo tamanho das bancadas na Câmara. E as legendas, privadas das contribuições empresariais, vão priorizar a eleição para o Legislativo. A maioria não cogita esbanjar a verba do fundo eleitoral na campanha de presidenciáveis sem viabilidade eleitoral.

O cenário será outro em 6 de agosto, quando termina o prazo para a realização das convenções partidárias. Os franco-atiradores e os neófitos da campanha presidencial serão lançados ao mar. Em 15 de agosto, expira o prazo para o registro das candidaturas no TSE. Até lá, o mercado das urnas se baseará mais em expectativas do que em fatos. E a expectativa, até o momento, é de uma eleição marcada pela falência do sistema político. Uma disputa em que mais de 40% do eleitorado não consegue enxergar uma porta de saída na antessala da eleição.

Na sucessão de 2014, pesquisa do Ibope computava apenas 8% de votos brancos e nulos na altura do mês de junho. Quer dizer: aumentou sensivelmente a taxa de indefinição. Eis a verdade insofismável: o grande protagonista de 2018 é o caldeirão em que se misturam os eleitores raivosos e desalentados. Os candidatos terão de rebolar para conquistar essa gente. 

A redemocratização brasileira é uma conquista relativamente recente. Alguns, com a barba branca, votaram pela primeira vez em 1989, já na bica de completar 28 anos. Gostariam de ter votado antes, mas a ditadura militar não deixou. Ainda se lembram da solenidade que envolvia o ritual do voto. O eleitor era movido pela suposição de que sua preocupação era útil. Isso acabou.

No momento, o eleitor se vê numa encruzilhada. Entre opções lamentáveis e impensáveis, ele prefere o exílio do voto inválido. Em três décadas de redemocratização, a devoção ao voto virou ceticismo, converteu-se em nojo e já vai se consolidando como um transtorno. Nunca foi tão fácil como agora, a apenas quatro meses da eleição, compreender a tese de Churchill — aquela segundo a qual a democracia é a pior forma de governo salvo todas as demais. 
Quase metade do eleitorado cogita jogar o voto pela janela. Trata-se de um direito. Viva a democracia!







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