sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Procurador que conduz a Operação Zelotes diz que:
— ‘sem apoio da PGR, Zelotes não alcançou potencial máximo’
— falta de profissionais impede aprofundamento das investigações



Procurador da República Frederico Paiva


Deflagrada em 26 de março de 2015, a Operação Zelotes não alcançou seu potencial máximo e, dos R$ 19 bilhões em julgamentos suspeitos de causar prejuízo aos cofres públicos mapeados, apenas R$ 5 bilhões foram investigados a fundo.
A afirmação é do procurador da República Frederico Paiva, responsável pela investigação sobre o esquema de corrupção no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e titular das 18 denúncias oferecidas pelo Ministério Público Federal (MPF) contra empresas, lobistas e ex-conselheiros.
Para Paiva, a Procuradoria-Geral da República (PGR), à época comandada por Rodrigo Janot, não deu o apoio necessário à investigação ao negar a nomeação de peritos para ajudar na apuração. A ausência dos profissionais, diz o procurador, inviabilizou a análise de todas as 2,6 milhões de transações bancárias, 682 mil e-mails e 1.850 horas de interceptações telefônicas angariadas na fase de investigação que se encerrou em 2017.
Paiva disse não “entender” os critérios da PGR ao escolher quais operações terão mais apoio e apontou que a investigação continua no Supremo Tribunal Federal (STF) com processos que apuram a compra de medidas provisórias — flanco aberto pela Zelotes que agora se uniu às apurações da Lava Jato.

“O Carf ainda é uma caixa-preta” — Sem apoio às investigações e condenações rápidas, o MPF só conseguiu fechar um acordo de colaboração premiada.
“Os processos andam devagar, ninguém está preso, penas aplicadas não foram altas. Isso não despertou muito medo. A pessoa tem que ter a sensação de que pode ser punida.”
A Zelotes, segundo Frederico Paiva, também pouco avançou na apuração sobre venda de medidas provisórias — um enorme filão.
“Pela primeira vez descobriu-se que medidas provisórias eram vitaminas e modificadas a partir de contratos de fachada com escritórios de consultoria e de advocacia. Tivemos dificuldade porque não podemos investigar parlamentares, nem nunca investigamos, e por isso remetemos alguns inquéritos ao STF.”
Sem apoio institucional da PGR e da PF, tornou-se impossível investigar crimes sofisticados, em que a propina era disfarçada de honorários advocatícios e muitas vezes paga em espécie.
“É fato que se ela tivesse tido mais apoio teria ido mais longe. O Carf ainda é uma caixa-preta.”

10ª não é 13ª — O procurador Frederico Paiva fala também da falta de estrutura da 10ª Vara Federal em Brasília.
Segundo Paiva, Vallisney de Souza Oliveira, titular da 10ª Vara Federal em Brasília, tem sobre a mesa 15 operações importantes e ainda precisa lidar com casos de rotina.
“Com muito esforço, tem procurado dar andamento às ações penais, mas ainda não na celeridade de que nos gostaríamos. Aqui não é Curitiba, só temos uma ação julgada e outras 15 em andamento.”

Faltou apoio — O procurador Frederico Paiva também criticou mudanças promovidas pelo então diretor geral da Polícia Federal Leandro Daiello.
“Quando nós requisitamos dois peritos para a Procuradoria-Geral da República para poder viabilizar a análise dos dados bancários que foram quebrados. Este pedido foi negado. Sob a alegação de falta de peritos, disseram que não haveria como ajudar a Zelotes.”
Com a análise comprometida, a Zelotes não alcançou seu potencial máximo de aprofundamento das investigações.
Paiva diz que a retirada do delegado Marlon Cajado por Leandro Daiello representou um baque ainda maior.
“A Polícia Federal tirou o delegado Marlon Cajado, delegado muito atuante na investigação em parceria com o MPF. Ele foi tirado da Zelotes em maio do ano passado, isso nos deixou a pé. Tivemos que lidar com um volume imenso e, infelizmente, não conseguimos analisar tudo. Isso foi um baque.”
Estamos falando de crimes envolvendo grandes industriais, banqueiros e financistas do país.


> Leia a seguir a entrevista-denúncia do procurador Frederico Paiva


Qual o balanço da operação nesses três anos?
É muito positivo, apesar da falta de apoio. Principalmente no ano passado, no momento crucial da Zelotes. Quando nós requisitamos dois peritos para a Procuradoria-Geral da República para poder viabilizar a análise dos dados bancários que foram quebrados. Este pedido foi negado. Sob a alegação de falta de peritos, disseram que não haveria como ajudar a Zelotes. Isso complicou demais a nossa vida, a análise ficou bem comprometida e a Zelotes não alcançou seu potencial máximo de aprofundamento das investigações. Alguns casos ficaram pelo caminho. Mas, mesmo com pouca estrutura – eu tive apoio do dr. Hebert (Mesquita, que atuou em alguns casos da operação) durante um ano, foi essencial, mas foi pouco –, o balanço é muito positivo.

Por que acha que faltou apoio?
Não consigo entender os critérios. A Zelotes envolvia o Carf, um órgão com importância fundamental na economia brasileira, lá são julgados cerca de R$ 500 bilhões em créditos tributários, e a gente veio mostrando resultados, oferecendo denúncias, conseguimos condenação, mas outras operações tiveram muito mais apoio. Eu não entendo os critérios da PGR.

Não foi possível analisar todo material coletado?
Não. A Polícia Federal tirou o delegado Marlon Cajado, delegado muito atuante na investigação em parceria com o MPF. Ele foi tirado da Zelotes em maio do ano passado, isso nos deixou a pé. Tivemos que lidar com um volume imenso e, infelizmente, não conseguimos analisar tudo. Isso foi um baque, mas vida que segue.

No Judiciário, a operação enfrentou problemas?
Tivemos um problema muito grande no início, havia uma resistência enorme. Mas isso foi contornado a partir da assunção do dr. Vallisney (de Souza Oliveira, titular da 10.ª Vara Federal em Brasília) que tem se esforçado para dar celeridade ao caso. Mas o dr. Vallisney é titular de uma vara com 15 operações em andamento, então com muito esforço tem procurado dar andamento às ações penais, mas ainda não na celeridade de que nos gostaríamos. Aqui não é Curitiba, só temos uma ação julgada e outras 15 em andamento.

A Zelotes investigava Carf e depois passou a apurar suspeita de venda de medidas provisórias. Isso complicou a investigação?
Foi uma frente a mais, mas não poderíamos deixar de apurar, eram fatos graves. Pela primeira vez descobriu-se que medidas provisórias eram vitaminas e modificadas a partir de contratos de fachada com escritórios de consultoria e de advocacia. Todo um filão foi aberto. Tivemos dificuldade porque não podemos investigar parlamentares, nem nunca investigamos, e por isso remetemos alguns inquéritos ao STF. Mas, sem dúvida, com a pouca estrutura que eu tinha o resultado foi que atrasou algumas investigações. Mas foi por falta de estrutura, não por ter enveredado na apuração das MPs.

Ao contrário de outras grandes operações, a Zelotes só teve uma delação. Por quê?
Só uma delação. Os processos andam devagar, ninguém está preso, penas aplicadas não foram altas. Isso não despertou muito medo. É, principalmente, pelo fato de os processos estarem andando devagar. A pessoa tem que ter a sensação de que pode ser punida. Como a Zelotes caminha a passos muitos lentos ainda não chegou essa sensação. Mas isso não é problema, nós temos oferecido denúncias com base em outras provas, provas robustas.

O senhor chegou a citar prejuízo de R$ 19 bilhões. Todo esse montante foi apurado?
A gente conseguiu reunir provas e oferecer denúncias em relação a julgamentos envolvendo R$ 5 bilhões. Outros julgamentos que no início tínhamos como suspeitos, nós não avançamos no sentido de elementos suficientes para anulá-los. Não necessariamente porque eles não foram manipulados, mas porque, com o passar do tempo, a possibilidade de obtenção de provas se reduz. A gente fez o máximo possível.

Por que não se investigou a totalidade do prejuízo?
São crimes sofisticados, em que eram feitos pagamentos em dinheiro vivo. Fica mais difícil angariar provas, mas é fato que se ela tivesse tido mais apoio teria ido mais longe. O Carf ainda é uma caixa-preta.




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